Nos últimos dias, como se estivesse a desenterrar cadáveres, o povo do Acre está atônito com o comportamento de um ex-deputado federal. Se ele tivesse continuado a fazer a sua política sudeste-sulista, nós não íamos saber. Mas, por vontade das elites paulistas, ele virou candidato a presidente da república.
Então, o deputado Nilson Mourão começou a vasculhar os anais da Câmara Federal. Em menos de uma semana de pesquisa, já descobriu coisas que assustam qualquer acreano. O candidato a presidente, Geraldo (não seria Gerald) Alckmin, quando deputado federal, vivia de bronca com o Acre.
Na verdade não era bronca ou birra, era discriminação. Como deputado votou contra as Áreas de Livre Comércio da fronteira do Acre. Alckmin deixava claro: ‘se tiver que ter incentivos, que seja para São Paulo. No máximo, Minas, Paraná, Rio Grande do Sul. Acre não!”
Com o seu nariz empinado, comum nos aristocratas de lá, Alckmin não aceita que as regiões pobres saiam da sua condição de consumidores pobres. ‘Comércio forte no Acre, para que’? Indústria no Acre, por que’? Na cabeça de gente como Alckmin, a vida econômica do país não pode sair da avenida paulista. É que lá estão os barões que financiam a sua campanha.
Eles não podem nem sonhar em ver o outro lado do Brasil se erguendo. Idéias como a Transoceânica, que dará vida e robustez à economia do norte, são taxadas de populistas. Até o FPE que vem para o norte, nordeste, eles consideram dádiva do sul-sudeste rico e esbanjador. Se eles pudessem, comiam e faziam a sua higiene com guardanapos verdes, para pensar que estavam se limpando com notas de cem dólares.
‘Garantir o alimento de uma família pobre, através do Bolsa Família, é desperdício, gera déficit público. É um absurdo colocar luz numa aldeia indígena, que não produz excedentes para exportar, muito menos num lar de um agricultor pobre. Se for para exportar soja ou algodão, luz não vai faltar’. É assim que pensa a turma endinheirada do Alckmin.
Os neurônios da elite paulista trazem a carga genética e antiética dos senhores de engenho, dos cafezais em dor, das senzalas de lucro absoluto e fome generalizada. Eles nos querem como uma senzala, a agradecer ao patrão do sul-sudeste pelas migalhas do FPE.
E a gente não pode nem gritar, nem votar e nem espernear. Só temos que agradecer. Por isso, Alckmin votou a favor da redução da bancada do Acre, do norte e do nordeste. Eles querem fazer no Brasil, o que Bush faz no Iraque: os xiitas, que estão em regiões petrolíferas, ficam com o poder e os sunitas, das terras áridas, ficam como eleitores.
‘Que o Acre fique com três deputados federais. Tem menos voto do que a favela da Rocinha. Já é demais um arremedo de estado, como o Acre, ter três senadores, igual a São Paulo’. É assim que pensa o candidato da Opus Dei.
Acontece, senhor Alckmin, que nós temos brios. Nós somos o povo que pegou em armas para fazer do Acre um pedaço heróico do Brasil. Nós sabemos cantar o nosso hino. Nós valorizamos cada pedaço da nossa história. Quanto a vocês, só sabem de cor o hino do quatro de julho. Se comportam como prostitutas frente às políticas imperiais de Washington. Usam de valentia contra um país pobre como a Bolívia e se agacham frente às vontades mortais de Wall Street.
Sei que vocês não vão nos ouvir. Mas, pelo menos, peçam aos seus representantes, aqui no Acre, para se comportarem como acreanos. Que não envergonhem a nossa bandeira, que não se ajoelhem perante aqueles que nos interditam, nos humilham e nos tratam como eleitores de segunda categoria. Que, pelo menos, votem como acreanos.
Sei que nós não vamos decidir a eleição no Brasil. Mas, vamos dizer, no voto, que não nos curvamos à pilhéria do rico sul-sudeste. Se vocês são contra o nosso comércio, que fiquem com os votos dos comerciantes e dos comerciários do sul-sudeste. Se querem reduzir a representação dos políticos do Acre, não exijam que os políticos daqui, que os representam, cometam tamanha incoerência.
Os políticos acreanos precisam do voto daqui. Vocês não precisam. Então, não exijam deles essa indiscrição. Como eles vão explicar aos seus eleitores acreanos que estão pedindo votos para quem discrimina o Acre e nos quer esquecidos e discriminados num canto do Brasil?
Que bronca é essa, governador Alckmin? Qual o seu problema com o Acre? Que mal fizemos? Será que é porque falamos kaxinawá no lugar do inglês? Será que vocês vão discriminar até a nossa cachaça, ayahuasca, a caiçuma, no lugar do vosso whisky escocês? Sei que vocês preferem a estátua da liberdade à imagem de Aparecida. Vocês não vivem o Brasil e as suas diferenças. Vocês se embebedam nos cassinos da Califórnia e passam a ressaca no Brasil.
Que bronca é essa, governador? Só porque não somos paulistas?
2006-10-21
06:46:30
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Anonymous