Aos cinco meses, Juliana não faz idéia da fama do pai. Jesus Vidaña estava desaparecido quando Juliana nasceu. Mas, agora, vai se tornar personagem de livro e filme de Hollywood. O americano Joe Kissack fechou um contrato de exclusividade para contar a história de Jesus Vidaña, Lúcio Bezerra e Salvador Ordoñez, os três pescadores mexicanos resgatados depois de nove meses perdidos no Oceano Pacífico. O barco deles tinha oito metros de comprimento, sem cabine.
No dia 28 de outubro de 2005, eles saíram de San Blas, no México, para pescar tubarões. A gasolina do barco acabou e eles ficaram à deriva. Foram salvos por uma tripulação chinesa, já próximos da Austrália.
“Nós saímos bem cedo, às 6h da manhã", conta Salvador.
No Porto de San Blas, o assunto é sempre o mesmo: os pescadores se reúnem com os amigos, agora famosos, para ouvir detalhes da aventura.
Quando Vidaña, Bezerra e Ordoñez não apareceram depois de 24 horas, os pescadores de San Blas saíram em busca dos amigos. Mas eles já deviam estar longe da costa do México. Os meses foram passando e ninguém mais acreditava que eles voltariam um dia. Quer dizer, ninguém não: quase ninguém. Dona Francisca Perez abraça os três como se fosse avó de todos. Ela rezava dia e noite.
Dona Francisca diz que nunca perdeu a fé: “Eu fechava os olhos e via meu neto Lúcio e os companheiros dele vivos, nas ondas.” Ela esperou 285 dias até receber a notícia. “A vizinha veio me dizer: ‘Seu neto está vivo!’”
“Minhas primas gritavam! Como é bom ser querido por tantas pessoas”, comenta Bezerra. Foi preciso muita vontade de viver para não se entregar. Fé, experiência no mar e bom humor ajudaram. Bezerra e Ordoñez são mais calados e tímidos. Vidaña está sempre rindo. Ele animava os dias e as noites em alto-mar, fazendo de conta que tinha um violão.
“Nós jogávamos xadrez. Líamos a Bíblia", conta Ordoñez. Eles contavam piadas, riam uns dos outros. Vidaña descobriu que Ordoñez é um excelente cozinheiro. “Pelo menos ele sabe todos os ingredientes dos pratos. E descrevia como fazer”, conta Vidaña. Mas será que isso não dava ainda mais fome? “A mim, não. Me acalmava. E nós combinávamos que íamos comer juntos, em terra firme”, recorda Vidaña.
Nos nove meses à deriva, eles passaram por vários barcos. “Um deles chegou bem perto. Eles nos viram. Debruçaram na murada do navio, mas não pararam”, conta Vidaña. Na proa do barco, a pequena parte coberta servia de abrigo. Com fios que tiraram do motor do barco, eles pescavam peixes, tubarões e comiam a carne crua, que tinha um gosto de amônia muito forte.
O capitão do barco e o ajudante dele não conseguiam comer.
Nos primeiros 15 dias, não choveu. Mas Lúcio conta que eles conseguiram pegar uma tartaruga. Fizeram um corte em uma pata, depois na outra, para pegar o sangue. “Bebemos na hora, ainda quente”, recorda.
“Eram três ou quatro litros”, diz Ordoñez. Alimentava e matava a sede. “Foram mais de cem tartarugas", calcula Bezerra. “Ao todo, 108 tartarugas”, confirma Ordoñez. A falta de água levou os três ao desespero. “Eu bebi a minha urina”, recorda Vidaña. Os companheiros dele também.
Hoje, riem das dificuldades que passaram. E garantem que a experiência transformou todos eles.
“É preciso continuar ganhando a vida, mas com um pouco mais de responsabilidade. Dá mais vontade de viver e de continuar conversando com Deus, como fazíamos todo dia e toda noite. Foi o que aprendemos nesta travessia: que Deus existe e estava conosco”, conclui Vidaña.
2006-10-30
01:23:58
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Rô
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