São modelos que captam aspectos de como os mercados estão organizados. Cada estrutura de mercado destaca aspectos essenciais da interação da oferta e da demanda, baseando-se em caracterÃsticas observadas em mercados existentes. Em todas as estruturas clássicas os agentes são maximizadores de lucro.
Estruturas Clássicas Básicas: Monopólio e Concorrência Perfeita
Monopólio
Caso extremo de estrutura clássica básica. Situação de um mercado em que não existe concorrência na oferta. O setor é constituÃdo de uma única firma, porque existe um único produtor que realiza toda a produção, ou seja, situação em que uma empresa domina sozinha a produção ou comércio de uma matéria-prima, produto ou serviço e que, por isso, pode estabelecer o preço à vontade. Nessa estrutura de mercado existe concorrência entre os consumidores. A firma produz um produto para o qual não existe substituto próximo. Há presença de barreiras à entrada de novas firmas, ou seja, é necessário manter os concorrentes em potencial afastados. Estes obstáculos podem ser administrados pelo monopolista através de:
a) Controle sobre o fornecimento da matéria prima;
b) Barreiras legais como registros de patentes;
c) Licenças e concessões governamentais e outros.
à importante ressaltar que, em muitas circunstâncias, é a estrutura mais apropriada para a produção de certos bens e serviços como nos monopólios governamentais (Correios, Cesan). A legislação da maioria dos paÃses proÃbe o monopólio, com exceção dos exercidos pelo Estado, geralmente em produtos e serviços estratégicos. O monopólio “puro” é uma construção teórica, porque, na prática, ele não existe.
Concorrência perfeita (competição pura)
Estrutura que tem por objetivo descrever o funcionamento equilibrado, ou ideal, servindo com base para o estudo de outras estruturas. Apesar de ser teórico, o estudo da concorrência perfeita é importante pelas inúmeras conseqüências derivadas de suas hipóteses, que condicionam o comportamento dos agentes econômicos em diferentes mercados. As hipóteses do modelo são:
a) Existência de grande número de compradores e de vendedores atuando isoladamente, que se comparado ao tamanho do mercado, nenhum deles conseguem influenciar no preço. Assim, os preços dos produtos são fixados uniformemente no mercado;
b) Os produtos são homogêneos, isto é, são substitutos perfeitos entre si; dessa forma não pode haver preços diferentes no mercado. Os compradores são indiferentes em relação as firmas (vendedores) no momento de adquirir o produto;
c) Transparência de mercado, ou seja, existe completa informação e conhecimento sobre o preço do produto. Assim, nenhum vendedor colocará seu produto no mercado por um preço inferior ao do concorrente; da mesma forma, os consumidores não estariam dispostos a pagar um preço superior ao vigente.
d) Livre mobilidade. A entrada e saÃda de firmas no mercado são totalmente livres, não havendo barreiras legais e econômicas. Isso permite que firmas menos eficientes saiam do mercado e que nele ingressem firmas mais eficientes.
.
Outras Estruturas Clássicas
Concorrência monopolista ou imperfeita (competição monopolista)
Embora apresente, como na concorrência perfeita, uma estrutura de mercado em que existe um número elevado de empresas, a concorrência imperfeita caracteriza-se pelo fato de que as empresas produzem produtos diferenciados, embora substitutos próximos. Por exemplo, diferentes marcas de sabonete, refrigerante, sabão em pó, etc. Trata-se, assim, de uma estrutura mais próxima da realidade que a concorrência perfeita.
A diferenciação de produtos pode dar-se por caracterÃsticas fÃsicas (composição quÃmica, potência etc.), pela embalagem, ou pelo esquema de promoção de vendas (propaganda, atendimento, brindes, etc.);
Nesta estrutura, cada empresa tem certo poder sobre a fixação de preços, no entanto a existência de substitutos próximos permite aos consumidores alternativas para fugirem de aumentos de preços.
Da mesma forma que na concorrência perfeita, prevalece a suposição de que não existem barreiras para a entrada de novas firmas no mercado.
Oligopólio
Estrutura de mercado caracterizada pela existência de um reduzido número de vendedores, produzindo produtos que são substitutos próximos entre si. Pode também ser caracterizado como sendo uma indústria em que há grande número de firmas, mas somente poucas dominam o mercado. Um exemplo é a indústria de bebidas. Para acontecer o oligopólio são necessários os seguintes elementos:
a) Existência de poucas firmas. Pode ter duas, três, doze ou mais firmas, dependendo da natureza do mercado. Entretanto o número deve ser pequeno, de tal forma que as firmas levem em consideração e rejam nas decisões quanto ao preço e produção da outras.
A noção fundamental subjacente ao oligopólio é a da interdependência econômica, ou seja, as decisões sobre o preço e a produção de equilÃbrio são interdependentes, porque a decisão de um vendedor influi no comportamento econômico dos outros vendedores.
b) Produto homogêneo ou diferenciado. Quando o oligopólio oferece produtos homogêneos (substitutos perfeitos entre si) ele é considerado Oligopólio “Puro” (indústria do cimento, aço etc). Caso contrário será considerado Oligopólio diferenciado (indústria automobilÃstica e de fumo).
As firmas oligopolistas concorrem com base na qualidade, design do produto, serviço ao cliente, propaganda etc.
c) Presença de barreira para entrada de novas firmas. à exercida com o controle de matérias-primas, registro de patentes etc..
O modelo duopólio é caracterizado por apenas duas empresas produtoras ou vendedoras no mercado.
Monopsônio
Estrutura de mercado caracterizada pela existência de muitos vendedores e um único comprador que domina o mercado. à um a estrutura que pode prevalecer especialmente no mercado de trabalho. à o caso, por exemplo, da empresa que se instala em uma determinada cidade do interior e, por ser única, torna-se demandante exclusiva da mão-de-obra local. Portanto, ou os trabalhadores empregam-se no monopsônio, ou precisam trabalhar em outra localidade.
Oligopsônio
Estrutura de mercado caracterizada pela existência de poucos compradores, que dominam o mercado, para muitos vendedores. Exemplo: O setor automobilÃstico comprando das inúmeras firmas de autopeças.
Monopólio bilateral
Nessa estrutura defrontam-se um monopolista e um monopsonista. Tipicamente, o monopolista deseja vender uma certa quantidade de produto por um preço, e o monopsonista pretende obter a mesma quantidade por um preço diferente daquele oferecido pelo monopolista.
Como ambas as posições são conflitantes, somente a negociação recÃproca permite a definição do preço.
.
Modelos marginalistas de oligopólio
Cartel perfeito
Cartel: Estrutura caracterizada por uma organização formal ou informal de poucos vendedores dentro de determinado setor, que determina a polÃtica de preços para todas as empresas que o compõem.
O cartel perfeito nada mais é do que oligopolistas, reconhecendo a interdependência que têm entre si, procuram se unir e maximizar o lucro do cartel. A solução a que se chega é a de monopólio puro. De maneira geral, os cartéis são instáveis. Considerando que em geral operam com uma certa capacidade ociosa, o incentivo para que individualmente os membros tentem burlar os demais é grande.
Cartel imperfeito
à uma coalizão imperfeita, onde as empresas de um setor oligopolista decidem tacitamente (isto é, não é necessário um acordo formal) estabelecer o mesmo preço, aceitando a liderança de uma empresa da indústria. A lÃder (empresa que fixa o preço) pode tanto ser a firma de custo mais baixo, como também a maior firma do mercado. A firma lÃder fixa o preço e é seguida pelas demais. Todas maximizam o lucro reconhecendo a interdependência que têm entre si. Na hipótese da firma lÃder será a de custo mais baixo, entra em consideração a regulamentação antimonopólio (ela é obrigada a descartar a possibilidade de práticas predatórias de preço que levem seu concorrente à bancarrota
2007-03-25 01:04:58
·
answer #2
·
answered by josi.lenemuniz 1
·
0⤊
0⤋
Introdução
As organizações da sociedade civil (OSCs) são organizações paradoxais, controversas e enigmas recorrentes nas agendas de pesquisa. Elos importantes de conexões da sociedade civil, estado e mercado, as OSCs ocupam espaços intersticiais, ao mesmo tempo em que ganham identidade e se tornam peças estratégicas no jogo dos chamados poderes espacialmente localizados.
Definida pela autonegação e relativa exclusão do estado e do mercado (não-governamentais, não-lucrativas), as OSCs advogam autonomia, bem como a identificação com a ética do bem comum e o uso do espaço público como contexto de referência. Sua legitimidade deriva das ações que empreendem e do impacto que elas têm na sociedade civil em que se originam e que, de forma especial, espelham.
Têm o poder da auto-organização, da transformação de suas estruturas e estratégias e da regulação de seu próprio destino. Para isso, devem construir reputação e ganhar legitimidade. As de maior visibilidade na sociedade são valorizadas pela imagem construÃda e pelo perfil de seus gestores, além das dimensões substantivas de suas ações e da repercussão delas.
Foram delegadas funções de Estado e formas de representação social a essas instituições e elas foram elevadas à liderança, substituindo, em muitos casos, a representação direta dos movimentos sociais. São também interlocutoras importantes no campo das polÃticas públicas e das ações de desenvolvimento socioterritorial, daà a relevância deste artigo que contribui para a melhor compreensão dos poderes localizados no espaço e no tempo e para as formas de gestão social orientadas ao desenvolvimento territorial.
O universo das OSCs comporta muitos tipos de organizações e interorganizações, sendo muito diverso e fragmentado, de acordo com os resultados do mapeamento de 1.859 organizações da sociedade civil realizado em municÃpios baianos (capital e interior). Feito isso, considerou-se importante analisar, com maior profundidade, conjuntos organizativos delimitados e os perfis de liderança das organizações do conjunto — no caso gestores sociais. Um deles, objeto de estudo deste artigo, é representado por organizações de grande visibilidade, que têm reputação e gestores socialmente reconhecidos.
As organizações de caráter associativo, não-governamentais, não-lucrativos, conquistaram espaço entre sociedade e mercado, entre governo e sociedade e entre diferentes enclaves sociais.
São exemplares as intervenções e a gestão de OSG em projetos de escala local, regional e nacional financiados por recursos de fontes nacionais e internacionais. Os conjuntos integrados de projetos conformam-se em redes de socioeconomia solidária; nos chamados arranjos produtivos locais (especialmente em territórios de baixa densidade empresarial); em programas de desenvolvimento sustentável, geração de emprego e renda, de gênero e outros (Fischer, 2004).
Assim, adota-se, como pressuposto, que performance organizacional e liderança estão intimamente relacionadas. Na intenção de melhor compreender os fenômenos do poder e da gestão do desenvolvimento social, perguntase: como são estas organizações e qual é o perfil de seus lÃderes? Como são as trajetórias de sucesso e de que se derivam? Talentos especiais, vivências significativas, aprendizados formais, senso de oportunidade, habilidades de gestão tradicionais caracterizam estes perfis de liderança? Que traços têm estes lÃderes como gestores sociais do desenvolvimento? Como se articulam com a sociedade e o Estado? Como projetam a organização no futuro?
Na tentativa de responder a tais questões objetivou-se compreender a relação existente entre a performance de organizações da sociedade civil e o perfil de seus lÃderes.
Foi realizado um estudo quantitativo e qualitativo com uma amostra intencional de 12 organizações situadas em Salvador, consideradas de reputação, e cujos focos de atuação fossem distintos entre si. A fim de aprofundar a visão da dinâmica das organizações sociais e as várias etapas da trajetória dos lÃderes, a primeira etapa foi ampliada, com duas entrevistas por meio da técnica da história oral (Alberti, 1986) com dois gestores fundadores das respectivas organizações em que trabalham: o Grupo de Apoio e Prevenção à Aids da Bahia e a Casa Via Magia. Algumas questões especÃficas nortearam o estudo qualitativo. Como a história de vida do seu principal gestor contribuiu para a organização ser o que é hoje? Como a sua história de vida se confunde com a história da organização? O que levou a ser um gestor social e, mais especificamente, a fundar a organização? O que se vislumbra para o futuro da organização?
As entrevistas, transcritas integralmente, foram analisadas por meio de suas narrativas, buscando o sentido expresso do discurso dos lÃderes. O conteúdo de cada um desses textos foi analisado na perspectiva de entender como a projeção da organização é justificada pelo perfil dos seus lÃderes-fundadores. Assim, por meio de um recorte temporal, buscou-se compreender a história de vida dos lÃderes sociais e sua relação com a progressão do seu espaço territorial, e, por meio de um recorte espacial, entender os fatos, os momentos, as rupturas na vida desses lÃderes que contribuÃram para explicar essa progressão.
O material transcrito foi organizado a partir de "códigos de processo" (Bodgan et al., 1994:225), comumente usados na ordenação das histórias de vida, que reúne frases que facilitam a categorização das seqüências de acontecimentos, mudanças ao longo do tempo ou passagens de um tipo ou gênero de estatuto para outro. Os códigos de processo apontam para perÃodos de tempo, estádios, fases, passagens, passos, carreiras e cronologia dos lÃderes entrevistados.
Este artigo estrutura-se de forma a refletir, inicialmente, sobre as organizações da sociedade civil como campo de práticas de gestão, para, a seguir, discutir a gestão social como processo de poder contingenciado pelas dimensões de espaço e tempo. Depois, é apresentada a história de vida dos dois gestores. As organizações agem no espaço local, legitimando-se pela capacidade de se articular em várias escalas de poder, pela consecução de metas de impacto na sociedade e, especialmente, pela capacidade de gestão de seus lÃderes, como veremos a seguir.
2. Organizações da sociedade civil como campo de práticas de gestão
As várias formas e estruturas organizacionais e interorganizacionais da sociedade civil têm seduzido pesquisadores no campo das ciências sociais em geral e dos estudos organizacionais em particular (Teodósio, 2001; Alves, 2002; Carvalho-Ferreira, 2004; Gohn, 1997; Meister, 1992; Sorj, 2004; Fischer e Melo, 2003; Fernandes, 1994; França Filho e Laville, 2004; Carvalho, 2000), entre muitas outras fontes.
A expressão ONG teve origem nas Nações Unidas, quando foi necessário distinguir as organizações representativas de governos das que, por mérito, deveriam ter assento na assembléia da entidade. A designação "terceiro setor" surgiu nos Estados Unidos, englobando todo o tipo de organizações sem fins lucrativos, o que é contestado por Fischer e Falconer (1998), dada a heterogeneidade do conjunto.
A expressão "não-governamental" remete a outros significados, que podem ser justificados pelas trajetórias das práticas e dos valores e ideologias caracterÃsticos.
Herbert de Souza (Santana, 1992) aponta o perÃodo entre os anos 1960 e 1980 o marco do surgimento das organizações não-governamentais brasileiras, nascidas em função da luta polÃtica da sociedade civil contra o regime autoritário da ditadura militar, que se implantou em 1964. Nesse contexto, atuavam muito próximo da clandestinidade, ligadas a movimentos sociais de base, igrejas, movimentos sindicais e populares. Tinham uma ênfase claramente de oposição em relação ao governo, expressa na terminologia "não-governamental" (ONG), a que se agrega a expressão "não-lucrativa".
No processo de surgimento das organizações não-governamentais, também teve papel fundamental a influência de organismos internacionais. Medina (1997) observa que em 1950-60 organismos internacionais começaram a fomentar um processo de desenvolvimento comunitário em paÃses do Terceiro Mundo, pressupondo nÃveis maiores de participação da comunidade. Os organismos internacionais legitimaram as organizações não-governamentais, pregaram a necessidade de apoio polÃtico e popular e o fortalecimento da administração local para concretização do plano de desenvolvimento.
Além de contextualizar o papel dos organismos internacionais, Medina (1997) analisou o perfil das organizações não-governamentais ao longo do tempo na América Latina. Gohn (1997) também fez uma análise nesse sentido, voltada para a realidade brasileira, e coloca que, nos anos 1990, as ONGs ganharam importância por serem potenciais parceiras do poder polÃtico, em decorrência de sua estruturação. Essa relação de parceria passou a ser estimulada, uma vez que o discurso neoliberal pressupõe a retirada do Estado de uma série de atividades e a primazia do mercado. Ainda segundo Gohn (1997), nessa mesma época, houve uma reconfiguração do modelo de financiamento à s ONGs, do assistencialismo à auto-sustentabilidade. Observa-se um fortalecimento das estruturas nacionais com a criação da Abong (Associação Brasileira de ONGs) e da CMP (Central de Movimentos Populares), bem como o desenvolvimento de movimentos internacionais no Brasil, a exemplo da ONG ambientalista Greenpeace.
O foco de ação das ONGs e dos movimentos sociais também sofreu mudanças: da luta por transporte, saúde, educação e moradia para a luta pela sobrevivência fÃsica (alimentos e terra); luta por moral e ética polÃtica; por direito à pluralidade (movimentos de gênero, raça e idade); por uma participação na polÃtica direta institucionalizada; perspectiva de parceria, não de oposição ao governo; e polÃticas formuladas para segmentos sociais. Gohn acrescenta que, apesar de apregoarem autonomia e independência em relação ao Estado, os fundos polÃticos permanecem como os grandes financiadores de suas demandas.
A atuação da sociedade civil organizada tomou um rumo diferente, voltado agora não mais para a luta contra o autoritarismo do Estado, como ocorria nos anos 1960-80, mas para a democratização da sociedade (Randolph, 1990, citado por Santana, 1992).
O foco de análise foi se ampliando e reflete a evolução das formas de ação coletiva conforme constatado nos estudos referidos, desenvolvidos na década de 1990 e inÃcio desta. Por exemplo, os movimentos sociais que operavam em Salvador no inÃcio dos anos 1990 eram de caráter vicinal, como a Associação dos Favelados, que tinha como escala de ação a cidade.
Registra-se, então, uma crise de representação e uma substituição gradativa dessas associações por organizações de caráter mais independente, que assumiram um papel mediador entre interesses da sociedade, governos e agências nacionais e internacionais. O contexto dos anos 1990 colocou em evidência as organizações da sociedade civil, provavelmente em decorrência das suas próprias conquistas e do fortalecimento da perspectiva de parceria entre as esferas do Estado, mercado e sociedade civil organizadas, sendo-lhes delegada a tarefa de construir "novas transversalidades entre espaços institucionais fragmentados" (Meister, 1992).
As organizações não-governamentais afirmam-se na esteira de polÃticas sociais sugeridas pela Constituição de 1988. Na Bahia, as organizações não-governamentais tornaram-se protagonistas da cena social, assumindo funções na execução de programas e projetos de polÃticas públicas, de agentes financiadores nacionais e internacionais e como expressão e afirmação da etnicidade, como foi o caso dos grupos afro-culturais em Salvador. Tais grupos atraÃram a atenção dos pesquisadores e se projetaram internacionalmente como organizações associativas e produtores da cultura com inserção em mercados internacionais, na década de 1990.
O Grupo Cultural Olodum foi estudado por Fischer e Dantas (1993) e por Dantas (1994), iniciando uma série de estudos sobre organizações da mesma natureza como o Ylê Aiyê, os Apaches do Tororó, as Organizações Brown, os Filhos de Gandhi (Ferraz, 2001). Esses trabalhos se apóiam no viés interpretativo de Siqueira (1993) que reconstrói especialmente os estudos sobre redes sociais.
Como se reitera, os poderes locais estão entrelaçados em estratégias orientadas tanto por competição e conflito de interesses, quanto por princÃpios e práticas solidárias, formas de gestão verificáveis em organizações complexas.
O reconhecimento da hibridização dessas organizações representativas de interesses contribuiu para a intensificação dos estudos sobre organizações complexas orientadas ao desenvolvimento socioterritorial.
Captando necessidades sociais intangÃveis, dando espaço de palavra a novos atores, experimentando novas práticas e tecnologias sociais, criando comunidades de interesses e de aprendizagem coletiva, as organizações associativas da sociedade civil têm escalas variadas — da unitária à rede de movimentos, da escala microlocal à escala global, de estruturas das mais simples à s mais complexas.
Como organizações de tipo ideal que procuram valorizar o seu papel, as ONGs estão sob controles sociais frouxos, sem instâncias de regulação definidas a priori, comparativamente às organizações governamentais e empresariais.
Contradições e ambigüidade cercam as ONGs. CrÃticas são feitas ao seu papel marginal à s estruturas de mercado, nelas intervindo como competidoras ao gerarem produtos e serviços ou à s funções que exercem na gestão de polÃticas públicas, no momento em que há uma recentralização dos poderes de Estado no âmbito federal.
Institucionalizadas, as ONGs têm autonomia relativa, mas controle social precário. Não sendo lucrativas, devem ser sustentáveis e hoje se constituem em espaços de trabalho disputados por acadêmicos e gestores sociais.
Talvez a dimensão mais contraditória e fascinante das OSCs seja o seu caráter de experimento social e organizacional, como incubadoras de práticas e matriz de novos desenhos institucionais.
Ao serem parte da sociedade que interpelam e combatem, são "marginais comprometidos", reificando o papel que ocupam nos vácuos institucionais, nas margens e nos interstÃcios interorganizacionais.
Organização que se afirma pela negação — não-governamental, não-empresarial —, as ONGs são tão mais contraditórias quanto mais se integram a outras organizações constituindo interorganizações.
3. Gestão social: lÃderes no espaço e no tempo
De acordo com Fischer (2002): "A gestão é um ato relacional que se estabelece entre pessoas, em espaços e tempos relativamente delimitados, objetivando realizações e expressando interesses de indivÃduos, grupos e coletividade".
A gestão adjetivada como social orienta-se para a mudança e pela mudança, seja de microunidades organizacionais, seja de organizações com alto grau de hibridização, como são as interorganizações atuantes em espaços territoriais micro ou macroescalares.
Múltiplas formas de poder são exercidas em diferentes escalas, na construção paradoxal e controvertida de utopias traduzidas em programas, projetos e ações de desenvolvimento que ocorrem em espaços territoriais e virtuais.
A espacialização do poder e a valorização da chamada esfera local têm articulado e fragmentado interesses de acadêmicos e não-acadêmicos, pois as questões de poder revelam-se no concreto, no cotidiano, na trama mais ou menos complexa das relações sociais. O poder é sempre assimétrico e pleno de tensões entre os que o exercem e os que o disputam. Se tem um caráter relacional recÃproco, sugere também desequilÃbrio e um jogo de forças com momentos de convergência e de antagonismo, de pactos e rupturas. Supõe liberdade e possibilidades de ação e zonas de incerteza que possibilitam recuos e proximidades.
Há alternância e multipolaridade nas relações de poder, especialmente do que já se denominou, singularmente, poder local. A transversalidade ou a complexidade das relações entre dominantes e dominados, com tensões, avanços e recuos permanentes, com ganhos e perdas reais e simbólicas que podem ser avaliados diferentemente conforme a perspectiva, faz com que se reconheça a crescente pluralidade do poder espacialmente localizado. Tratamos, então, dos poderes locais, analisados pelas teorias de ação coletiva, que aqui interessa na acepção de ação mobilizadora (Clark, 2000), de estratégia em processo (Martinet e Thiethart, 2001) caracterizada como tentativa de desenhar o futuro.
Friedberg (1997) diz que o estudo da dimensão organizacional da ação coletiva leva a considerar a estruturação de todo o contexto de ação como uma solução (ou respostas) especÃfica que atores autônomos, agindo dentro das restrições próprias de uma racionalidade limitada, encontram formas de "confirmação conflitual" e geram "interdependência estratégica". Nesse caso, os contextos de referência são determinantes.
Contextos de referência estão delimitados por duas dimensões da vida humana: o espaço e o tempo. Portanto, o desenho de utopias em cenários futuros feito por atores sociais que detêm o poder está circunstanciado pelo tempo e pelo espaço. Ao desenhar utopias, as pessoas constroem organizações.
As estratégias e estruturas organizacionais são contingenciadas pelas variáveis espaço-temporais, e as "organizações e as pessoas que as lideram, também.
Administração e liderança são tratadas ora como construtos distintos, ora como áreas de interseção (Bryman, 1991; Lapierre, 1989).
Ao tratarmos de gestão social, articulamos liderança e management, eficácia, eficiência e efetividade social. Estamos tratando de mediações sociais realizadas por indivÃduos (gestores) e suas organizações.
O campo de gestão social, ou de gestão do desenvolvimento social, é um reflexo das práticas e do conhecimento construÃdo por múltiplas disciplinas, delineando-se uma proposta multiparadigmática, de natureza interdisciplinar. Como as ações mobilizadoras partem de múltiplas origens e têm muitas direções, as dimensões praxiológica e epistemológica estão entrelaçadas. Aprende-se com as práticas, e o conhecimento se organiza para iluminar a prática.
A gestão do desenvolvimento é uma forma de gestão social, a transição entre modelos do século passado e novas formas, comprometidas com utopias de desenvolvimento local, que os tempos de crise fazem emergir.
O que caracteriza esse gestor, basicamente, além da capacidade de mediação, é a visão que precede qualquer ato de gestão. Vários autores falam da visão do lÃder. Da literatura pop management aos estudos mais consistentes sobre o indivÃduo enquanto lÃder, a capacidade de ver, retrospectiva e prospectivamente, definem o presente organizacional.
March e e colaboradores (2003:155) recordam o mito de D. Quixote e colocam:
Como fornecer a aparição de visões capazes de transformar o curso das coisas? Para que a visão possa se realizar, deve-se encorajar a ação. As grandes ações vêm menos de existência de problemas que do sentimento de que se é capaz de mudar as coisas.
Eugène Enriquez (1984:30) relaciona visibilidade de organização com a identificação de um caminho livre e novo, ainda não saturado.
Uma organização influente é aquela capaz de encontrar um caminho inédito... A definição do caminho depende do grupo que se quer influenciar (o governo, outros grupos, a cidade), o domÃnio sobre o qual se quer exercer influência (a fome, o modo de vida) e as formas de institucionalização que podem se tornar referência.
O saber-ver, essencial no design (Ferrara, 2002), é competência básica do gestor social.
As organizações sociais são focadas no desenho; estão sempre redefinindo significados e formas; de saber-ver, saber-fazer e saber-relacionar-se por meio de um projeto estratégico compartilhado: a organização.
Nesse contexto, a fim de compreender melhor a relação entre-perfil dos lÃderes e a performance da organização, apresenta-se a seguir análise da história oral de dois gestores sociais, cujas organizações possuem um alto nÃvel de articulação interorganizacional, inclusive em nÃvel internacional.
4. Perfis visÃveis da gestão social: o Gapa-BA e o Via Magia como OSCs exemplares
Apresentamos aqui dados biográficos dos dois gestores e analisamos, por meio de técnicas de história oral, as trajetórias de ambos contextualizadas no espaço e no tempo. As visões que têm de si, dos outros, do mundo e da organização são mapeadas e discutidas.
Trajetórias dos gestores sociais
A trajetória de Harley Henriques do Nascimento
Nascido em 1968 na cidade de Campina Grande, ParaÃba, Harley Henriques do Nascimento é o caçula de quatro irmãos. Quando tinha um ano de idade, sua famÃlia decide ir morar na cidade de Feira de Santana, interior da Bahia, local onde teve uma forte formação religiosa, chegando a fazer parte do Movimento Eclesiástico de Base e a ter uma participação representativa no grupo de jovens religiosos da cidade. Seu pai, comerciante, trabalhava viajando pelas cidades do interior do estado. Principal provedor da casa, responsável por manter o padrão da famÃlia de classe média a alta, sua figura foi muito marcante no sentido autoritário, rÃgido, austero, centralizador do poder e disciplinador até o momento em que, precocemente, veio a falecer (aos 40 anos de idade). A partir daÃ, sua mãe, antes apenas "cuidadora" dos filhos e dona-de-casa, se torna a principal provedora do lar, assumindo a ausência deixada pela morte do marido e mostrando-se um exemplo de coragem, força, determinação e inspiração para os filhos. Aos 15 anos de idade, Harley resolve "romper o cordão umbilical" e ir morar em Campina Grande, onde nasceu, para fazer o terceiro ano cientÃfico. Passa a residir com os avós maternos, mas sente a sua liberdade tolhida dentro do ambiente familiar e decide morar sozinho e se responsabilizar por seu sustento. A entrada para um grupo de teatro de grande projeção da ParaÃba foi importante para a construção de vÃnculos de amizade muito fortes na época, pessoas com as quais chegou a dividir apartamento e despesas. Aà também acontece o despertar para os sÃmbolos e a identificação com a cultura nordestina junto à necessidade de conquistar a sua completa independência financeira. Aprovado em dois vestibulares, um em Campina Grande e outro em Salvador, Harley opta pelo último, no intuito de resgatar o contato com sua famÃlia. No ingresso no universo acadêmico, surge a presença do movimento estudantil, do qual fez parte como ativista, e o convÃvio com estudantes de outras áreas como ciências sociais da UFBA (São Lázaro). Já nos primeiros anos como aluno do curso de administração de empresas, Harley vence a concorrência por uma bolsa de estudos concedida pelo Pólo PetroquÃmico de Camaçari, por meio do Instituto de Fomento Social do Pólo (Cofic) para estudantes de universidades particulares, o que garantiu a sua permanência em Salvador. Em 1988, com a sua iniciação sexual e a insatisfação com algumas limitações de muitos movimentos quanto à s questões relacionadas ao indivÃduo, Harley descobre o tema HIV/Aids, quando acontece a então chamada "mudança radical e revolucionária" na trajetória de sua vida. Diante da epidemia da doença na década de 1980, ele funda o Grupo de Apoio e Prevenção à Aids da Bahia (primeiro Gapa do Nordeste) e lhe confere dedicação exclusiva. A organização é concebida com o objetivo de assumir a Aids como um tema de desenvolvimento, não-emergencial e assume como missão: "educar o mundo a viver com a Aids". Trabalhar na influência de polÃticas públicas, oferecer assistência à s pessoas infectadas/afetadas pelo vÃrus e oferecer educação para a prevenção foram os três pilares de sustentação iniciais da organização.
Em 1989, Harley abandona a faculdade no sétimo semestre e com o apoio da Oxfam — UK, o Gapa-BA inaugura a sua primeira sede. Ele vive uma experiência no presÃdio do Carandiru (SP) onde vivencia a realidade de soropositivos e é incumbido de repassar essa experiência como consultor do Ministério da Saúde para os presÃdios das principais capitais do Nordeste. Aà acontecem as primeiras dificuldades de gestão da organização. No ano de 1992, o Gapa-BA fecha parcerias com seis agências internacionais, momento em que a instituição dá um salto muito grande, porém identifica a necessidade de planejar-se e precaver-se dos riscos de depender exclusivamente de financiamentos internacionais. Em 1994, Harley parte para um estágio na Inglaterra e nos Estados Unidos, onde se apropria do conhecimento sobre sustentabilidade, mobilização e captação de recursos locais, estratégia de fortalecimento institucional definida para o Gapa-BA quando do seu retorno para o Brasil. Assim, o Gapa-BA demarca o seu momento de profissionalização e de projeção inicial. O Gapa-BA termina o ano com 14 parceiros internacionais financiadores e por meio das parcerias com a imprensa e com agências de publicidade, ele encontra espaço na mÃdia para passar a sua mensagem, com a veiculação de campanhas. No inÃcio da década de 1990 o Gapa estabelece a formação de redes e a sua participação em fóruns de representação como o Fórum Nacional de Direitos Humanos, o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente, os Conselhos Estadual e Municipal de Saúde, o Comitê Nacional de Aids e o Comitê Nacional de Vacinas. A partir desse momento, o Gapa-BA fica conhecido nacional e internacionalmente e passa a atuar como consultor no tema de mobilização e captação de recursos. Aqui, identidades pessoal e organizacional se confundem e isso passa a incomodar Harley. A visão de futuro dele para a organização é estar presente, como "ponto de apoio" e de referência técnica para ONGs que trabalham no campo temático de HIV/Aids em paÃses de lÃngua portuguesa da Ãfrica.
A trajetória de Ruy Cezar
Ruy Cezar nasceu em 1957 em Tesouras (antigo distrito de Ipiaú), atual municÃpio de Ibirataia, na Bahia. Foi um tÃpico garoto do interior, com famÃlia grande (sete filhos) e bem estruturada e que viveu com uma certa estabilidade; ele era o terceiro filho mais velho. Ao longo da sua infância, percebe-se que o mesmo possuÃa a angústia de quem gostaria de alçar vôos mais altos. A criatividade, a curiosidade e a introspecção sempre foram suas caracterÃsticas durante esse perÃodo. Por conta dessa postura tinha uma certa dificuldade de se relacionar com as outras crianças; não gostava de competir com os outros, mas sim de construir outras realidades, de fantasiar. Com o tempo, houve a mudança para a cidade de Ipiaú e logo depois o ingresso na escola agrÃcola Emarc (Escola Média de Agricultura da Região Cacaueira) no municÃpio de Uruçuca (BA), onde a adolescência chegou. Com ela, veio a entrada no mundo masculino por meio do esporte (basquetebol). Além disso, vieram as primeiras experiências no teatro e na produção de textos que lhe deram a possibilidade de criar os primeiros vÃnculos de amizades; nesse percurso também teve contato com obras e construções que representavam o inconformismo naquela época. Ruy Cezar também viveu o sentimento de querer mudar a realidade que acometia a sua famÃlia quando adolescente: uma crise econômica que obrigou seus pais a mandarem os filhos mais velhos estudarem fora; Ruy era um deles. Depois da experiência na escola rural, onde aprendeu um ofÃcio, Ruy Cezar alcança relativa estabilidade, podendo ajudar a famÃlia, mas, para surpresa dos pais, resolveu tentar a vida em Salvador, fazendo vestibular para comunicação na UFBA em 1977. A partir daÃ, houve um processo brusco de mudança de vida para ele, que rapidamente entrou no movimento estudantil e pelo seu carisma tornou-se presidente do DCE da UFBA e logo depois lÃder estudantil responsável pela reconstrução da UNE em 1979. Teve oportunidade de viajar pelo paÃs e pelo mundo, conhecendo culturas e muitos brasileiros exilados no perÃodo da ditadura militar. Participou de todos os processos e ações de luta contra a ditadura militar, muitas vezes liderando-as. à bom frisar que desde a participação em um grupo de teatro na adolescência, o militante estudantil Ruy nunca mais largou o teatro. As muitas experiências no movimento estudantil fizeram com que Ruy Cezar tivesse outra angústia: tanto a ditadura militar, quanto a esquerda no Brasil e no mundo tolhiam a individualidade e a dimensão comportamental. Com essa conclusão, Ruy tomou a decisão de sair da polÃtica e mergulhar no universo que diz respeito à expressão da individualidade e do entendimento de si mesmo e do outro, por meio da educação e cultura. Mais uma vez, Ruy contraria seus pais, que pensavam que teriam um filho polÃtico, e a esquerda brasileira, que já contava com um novo lÃder. Por conta disso, Ruy Cezar muda-se com sua esposa, Rose Reyas, para São Paulo em 1982 e como resposta a esse questionamento cria, junto com Rose e mais alguns colaboradores, o grupo de teatro Via Magia. O interesse não era só o teatro, mas a educação também. Por isso, dois anos depois (1984), houve o interesse de retornar para Salvador e iniciar um projeto próprio na área de educação. O Instituto Casa Via Magia congregava educação e teatro e veio para ser um espaço de construção e difusão de idéias e práticas baseadas no construtivismo. O projeto foi recebido com estranhamento pela sociedade soteropolitana, mas logo ganhou espaço, por ser alternativo e de interesse de vários pais da classe média que fizeram parte do movimento estudantil. Por conta disso, a escolha estratégica da organização foi se lançar para fora da Bahia e do Brasil, intercambiando experiências com artistas e grupos de outros paÃses já no final da década de 1980. Em 1991, criou-se a Rede Latino-Americana de Arte e Cultura e a partir daà houve o processo de internacionalização da instituição que, trabalhando em redes, tornou-se mais reconhecida no exterior do que no Brasil, especialmente na Bahia. Além da opção de trabalhar em redes, a Via Magia trouxe como prática a busca pela inovação em todos os seus projetos, ganhando uma reputação internacional na área de cultura. A instituição foi a coordenadora executiva do primeiro Fórum Cultural Mundial em São Paulo (2004), sob a liderança de Ruy Cezar. Atualmente, a organização e o lÃder pretendem se voltar mais para o local (Federação, Salvador-BA), por considerar que houve um distanciamento entre a própria Via Magia e o seu local. Além disso, a perspectiva de futuro é sistematizar todas as informações e experiências da instituição, para repassar a outras organizações, tornando-se uma referência no Brasil e no mundo.
História oral de dois lÃderes baianos
Os quadros 1 e 2 buscam sintetizar a trajetória dos dois gestores sociais no tempo e no espaço, para posterior análise.
Como se constata, os dois gestores são de origem interiorana, tendo vivido significativas experiências na infância, junto ao núcleo familiar, e na adolescência, como militantes do movimento estudantil. Acompanhando a progressão do tempo, deslocam-se da escala local (municipal) para a nacional e internacional. Evidencia-se a relação estreita entre a construção organizacional e a ampliação do espaço de ação. Quanto maior a visibilidade, mais ganho de escala nacional e internacional.
A figura expressiva e forte das mães diante do papel mais diluÃdo da figura paterna são convergentes nas duas trajetórias. A auto-referência como crianças criativas, determinadas e contestadoras também, bem como a valorização das origens. A visão do mundo como "socialmente injusto", bem como dos outros como conservadores, com exceção dos jovens, que seriam agentes potenciais de transformação, pode explicar a origem de suas organizações, orientadas fortemente à transformação social. As referências de ambos coincidem quanto a lÃderes criativos, transgressores e revolucionários. O lÃder do Gapa-BA cita organizações como referência, além de pessoas. Não por acaso, tem formação em administração. O lÃder do Via Magia cita pessoas e referências intelectuais na polÃtica, teatro e educação, com formação em comunicação.
Depois de construÃda a organização (saber-fazer), os lÃderes do Gapa-BA e Via Magia expressam o desejo de ser referenciais para o Brasil e para o mundo. Almejam ganhar mais visibilidade e ampliar o raio de ação da organização, tornando-a nó de conexões locais, nacionais e internacionais. Consideram a organização "um lugar especial no mundo" e desejam ganhar mais território sem perder a ancoragem local. Expressam, também, um desejo de perpetuar sua trajetória por meio de ações, pessoas e produtos socialmente relevantes.
5. Considerações finais
Após a análise das organizações e da trajetória de seus gestores, reiteram-se pressupostos sobre a gestão social do desenvolvimento expressos nas considerações que fizemos.
Primeira consideração: a gestão social do desenvolvimento é um processo de mediação transformadora, que demanda competências construÃdas ao longo da trajetória de vida dos gestores. Os espaços em que viveram na infância e adolescência (a casa, o entorno, a cidade) são contextos de referência estruturantes das organizações que construirão no futuro.
Segunda consideração: as organizações da sociedade civil podem ser agentes de transformação determinantes em seus contextos de referência quando geridas por lÃderes com visão de si, dos outros e do mundo em que vivem, de modo a desenhar organizações com sentido estratégico. O desenho estratégico de organizações sociais deve considerar a articulação de múltiplas escalas de poder individual e societal; a construção progressiva e obstinada de organizações que evoluem para articulações interorganizacionais de complexidade crescente; a provisão e o gerenciamento de recursos; a prestação de contas à sociedade e a avaliação e recriação da própria estratégia processual.
Terceira consideração: a gestão das organizações associativas, frágeis enquanto instituições que vivem em interstÃcios, depende da gestão do simbólico, do valorativo, do culto da imagem e das representações. Assim, a organização e seu lÃderes se confundem em muitos momentos, sendo a organização um espelho narcÃsico. A trajetória dos gestores bem-sucedidos em seus papéis de liderança envolve engenho, arte e um desejo intenso de irradiação e perpetuação do poder da organização pelos seus produtos e pelos seus impactos.
Quarta consideração: a gestão de organizações associativas para ser legÃtima deve ser eficiente e, para tanto, deve se legitimar, criando cÃrculos virtuosos na lógica social que orienta a ação.
Quinta consideração: as influências determinantes na trajetória dos gestores parentais ou comunitárias são embebidas em contextos de referência valorativos e ricos em significado. A estas, agregam-se outras referências culturais ao longo da vida que definirão rumos conforme sua natureza (artÃsticas, polÃticas e filosófica).
Finalmente, conclui-se que uma boa performance organizacional está diretamente imbricada com a gestão. Ser gestor em organizações sociais requer condições especiais de liderança, relativamente às exigências de organizações empresariais e governamentais, mais delimitadas como modelos burocráticos.
A gestão social do desenvolvimento é tarefa compartilhada entre esferas da sociedade vistas como totalidade. Neste artigo, focalizamos uma das formas organizacionais — as organizações da sociedade civil — e a trajetória de vida de dois gestores, na tentativa de contribuir para a construção de perfis para a gestão social. O que tais perfis sugerem, no discurso dos gestores, pode ser bem mais significativo do que podemos ver.
Abraços
@
2007-03-24 10:11:14
·
answer #6
·
answered by Anonymous
·
0⤊
2⤋