INTRODUÇÃO
►A paralisia facial periférica é a neuropatia craniana aguda mais comum. Seus sintomas freqüentemente são muito chamativos e assustadores para o paciente, em contraste com o curso clínico favorável.
►Existem duas formas: idiopática e sintomática. Entre as formas idiopáticas, a paralisia de Bell é a mais freqüente e corresponde à lesão de natureza incerta, provavelmente viral, no trajeto proximal do nervo facial próximo à saída do forame estilomastóide. O prognóstico é bom na maioria dos casos. Mais de 50% dos pacientes se recuperam por completo em poucas semanas. Quase 40% têm recuperação quase completa, com mínimas seqüelas e apenas 5 a 10% apresentam resultado ruim, com seqüelas graves.
►A forma sintomática, causada por trauma, tumores comprimindo o nervo facial e outras doenças é incomum.
►A exploração eletrofisiológica nos permite avaliar o estado funcional do nervo, a natureza da lesão, sua intensidade e prognóstico. Revisaremos as técnicas utilizadas para a avaliação neurofisiológica do nervo facial.
ANATOMIA
►O nervo facial tem um trajeto complexo e tortuoso, fato que o torna vulnerável à lesões. Podemos dividir seu trajeto em intracraniano e extracraniano.
►O nervo facial é um nervo misto, com fibras motoras, sensoriais e autonômicas. As fibras motoras originam-se do núcleo motor do nervo facial no tegmento da ponte. Suas fibras contornam o núcleo do nervo abducente (colículo facial) e dirigem-se para o ângulo cerebelo-pontino saindo do tronco cerebral pelo sulco bulbo-pontino.
►As fibras parassimpáticas originam-se do núcleo salivatório superior e as fibras sensoriais para a gustação dos 2/3 anteriores da língua terminam no núcleo do trato solitário.
►Ao penetrar no meato acústico interno, o nervo facial tem um trajeto tortuoso no interior da porção petrosa do osso temporal. O trajeto intrapetroso divide-se em três partes: labiríntico, timpânico e mastóideo.
►O nervo facial sai do crânio pelo forame estilomastóide para inervar mais de 20 músculos da face. Dentro da glândula parótida o nervo facial divide-se em 5 ramos: temporal, zigomático, bucal, mandibular e cervical.
►As fibras parassimpáticas unem-se com as fibras motoras para formar o nervo intermédio. Este, através do nervo petroso maior se dirige ao gânglio pterigopalatino para inervar as glândulas lacrimais e da mucosa nasal e através do nervo corda do tímpano se dirige ao gânglio submandibular para inervar as glândulas submandibulares e sublinguais.
►As fibras sensoriais são de dois tipos: cutaneomucosas e gustativas. As primeiras são responsáveis pela sensibilidade somática da face externa da membrana timpânica, do conduto auditivo externo e da região posterior do pavilhão auricular. As segundas são responsáveis pela gustação dos 2/3 anteriores da língua.
ETIOLOGIA
►Na paralisia facial periférica, a localização intrapetrosa é a habitual, onde se incluem causas idiopáticas, otite média, infecções virais (herpes simples e herpes zoster) e tumores do ângulo cerebelo-pontino.
►As causas centrais de paralisia facial podem ser diferenciadas das periféricas por meios semiológicos. Abaixo resumimos as principais causas de paralisia do nervo facial:
Perinatais
Uso de fórceps
Distrofia miotônica
Síndrome de Mobius
Traumatismo
Fraturas da base do crânio
Lesões penetrantes do ouvido médio
Barotrauma
Neurológicas centrais
lesões do opérculo (vasculares, tumorais, infecciosas)
lesões da capsula interna e tronco cerebral
Infecciosas
otite média ou externa
mastoidite
virus hérpes simples
vírus varicela zoster
parotidite
lepra
tuberculose
HIV
difteria
tétano
doença de Lyme
Inflamatórias
sarcoidose
amiloidose
vasculites
poliradiculoneuropatia inflamatória desmielinizante aguda (Guillain-Barré e crônica (CIDP).
Metabólicas
diabetes
hipertireoidismo
gravidez
porfiria aguda
hipovitaminose A
Neoplásicas
tumores de parótida
colesteatoma
neurinoma de nervo facial
neurinoma de acústico
leucemia
tumor do glômus da jugular
meningioma
sarcoma
teratoma
Tóxicas
talidomida (síndrome de Mobius)
etilenoglicol
álcool
arsênico
monóxido de carbono
Iatrogênicas
anestesia com bloqueio mandibular
cirurgia de parótida e mastóide
soro antitetânico
vacina antirabica
Idiopática
paralisia de Bell
BASES NEUROFISIOLÓGICAS
► Os três tipos fisiopatológicos de lesão são: neuropraxia, axonotmese e neurotmese.
►A neuropraxia caracteriza-se pela perda de continuidade da transmissão do impulso nervoso sem causa orgânica aparente. Geralmente associada com desmielinizacão segmentar. Seu prognóstico é excelente e a recuperação completa ocorre em poucas semanas.
►A axonotmese consiste em perda de axônios de intensidade variável. O nervo facial possui uma estrutura anatômica peculiar que o diferencia da maioria dos outros nervos do organismo, ou seja, sua estrutura monofascicular. Isto obriga, em caso de ruptura do endoneuro (axonotmese), uma regeneração sem um trajeto definido. Isto dá origem às chamadas sincinesias ou espasmos hemifaciais, onde vários músculos da hemiface se contraem sincronicamente durante os movimentos voluntários. Isto pode ser bastante limitante para o paciente.
►A neurotmese consiste na transecção total do nervo, bastante infreqüente no nervo facial, ocorrendo principalmente em lesões traumáticas severas ou durante cirurgias da face ou menos freqüentemente otológicas e intracranianas. Está associada com pobre prognóstico e tem indicação de anastomose cirúrgica.
►O nervo facial também está envolvido numa série de mecanismos reflexos, entre eles o mais importante é o reflexo do piscamento (córneo-palpebral). Nele ocorre o piscamento reflexo bilateral mediante o estimulo das fibras do nervo trigêmio na córnea de um dos olhos. A via aferente é o ramo oftálmico do nervo trigêmio e a via eferente é o nervo facial.
►Em neurofisiologia clínica se utiliza da estimulação do ramo supra-orbitário do nervo oftálmico (V1) para a obtenção do reflexo do piscamento (Blink Reflex). O impulso elétrico chega ao núcleo principal do trigêmio ipsilateral no tronco encefálico, de onde partem dois circuitos: O primeiro trafega pelo nervo facial e provoca uma resposta motora facial ipsilateral que evoca uma resposta eletrofisiológica chamada de R1. O segundo cruza a linha média atingindo a formação reticular do bulbo e fazendo conexão com o núcleo do facial contralateral, desencadeia a contração facial bilateral evocando uma resposta eletrofisiológica conhecida como R2. Portanto, a resposta R1 é ipsilateral e a R2 é bilateral.
AVALIAÇÃO ELETROFISIOLÓGICA
►A avaliação eletrofisiológica do nervo facial consiste na realização do estudo da condução nervosa, da eletromiografia de agulha e no estudo do reflexo do piscamento.
►A condução nervosa do nervo facial pode ser obtida estimulando-se o nervo anteriormente ao lobo da orelha e registrando a resposta nos músculos faciais correspondentes.
►O estímulo deve ser supramáximo, ou seja, o suficiente para evocar uma resposta (potencial de ação motor) com amplitude máxima. Valorizamos a amplitude e as diferenças de latência entre os dois lados.
►A ausência de resposta indica lesão grave com provável neurotmese e pobre prognóstico. A diminuição da amplitude comparada com o lado normal indica perda axonal (axonotmese) e o prognóstico depende da quantidade de fibras que foram lesadas.
►Amplitudes no lado afetado menores que 10% das amplitudes do lado normal indicam lesão severa e resultam em seqüelas moderadas a graves. Perdas de amplitude entre 10 a 30% indicam lesão moderada e algum tipo de seqüela pode ser esperada. Amplitudes maiores que 30% indicam boa recuperação, apesar da presença de alguma lesão axonal.
►Se a condução nervosa for normal após 8 a 10 dias (período em que inicia a degeneração walleriana), podemos considerar neuropraxia como o provável mecanismo e o prognóstico será excelente.
►Portanto, para fins prognósticos, é importante que o estudo neurofisiológico seja realizado após a segunda semana do início dos sintomas.
►Uma outra forma de avaliar o prognóstico é através do teste de excitabilidade do nervo facial. Nesse teste controverso, avalia-se a intensidade mínima de estímulo para desencadear uma contração do nervo facial, comparando sempre os dois lados. Em condições normais, a diferença de intensidade de estímulo não pode ser maior que 2 mA entre os dois lados. Diferenças maiores que 10 mA estão associadas a mau prognóstico.
►A EMG de agulha dos músculos faciais (frontal, orbicular do olho, orbicular da boca) completa o diagnóstico. Em combinação com a condução nervosa, permite diferenciar os mecanismos de lesão e indicar um prognóstico.
►Os primeiros sinais de desnervação ocorrem após duas semanas do início dos sintomas através do surgimento das ondas agudas positivas e fibrilações. Estão presentes nos casos de lesão axonal importante (axonotmese e neurotmese) e indicam prognóstico mais reservado. Deve-se ressaltar que nos casos de neuropraxia pura, não se registra potenciais de desnervação.
►Na avaliação dos potenciais de unidade motora com o músculo em movimento devemos prestar atenção na amplitude, duração e no recrutamento das unidades motoras. O recrutamento estará diminuído já nas fases iniciais da lesão, tanto na neuropraxia como na axonotmese. Já a amplitude e a duração dos PUM’s apenas aumentam na fase crônica das lesões axonais, após dois a três meses de lesão.
Resumindo
►Nos primeiros 14 dias após o início dos sintomas, o estudo eletrofisiológico não permite a diferenciação entre os mecanismos de lesão.
►Na condução nervosa, devemos esperar pelo menos 10 dias para que a degeneração walleriana possa ocorrer e assim possamos diferenciar entre neuropraxia (desmielinização segmentar) e axonotmese (perda axonal).
►Na neuropraxia as amplitudes dos potenciais de ação motores dos nervos faciais estarão preservadas. O prognóstico é excelente.
►Na axonotmese, a amplitude do potencial motor estará diminuída. O prognóstico depende o grau de diminuição da amplitude.
►Na EMG de agulha, pelo menos 14 dias devem ser aguardados para o surgimentos dos primeiros potenciais de desnervação (ondas agudas positivas e fibrilações). Quando presentes indicam degeneração axonal e estão associados à pior prognóstico. Quando ausentes na fase aguda (entre 15 e 60 dias), sugerem neuropraxia e melhor prognóstico.
►Nas lesões axonais crônicas com reinervação eficiente, observamos a presença de potenciais de unidade motora de alta amplitude e longa duração. Isso ocorre após dois a três meses da lesão.
►Finalmente, o reflexo do piscamento pode ser usado para a avaliação dos pacientes com paralisia facial.
►Nas lesões puras do nervo facial as resposta R1 e R2 ipsilaterais estarão ausentes e a resposta R2 contralateral estará preservada. Não é um bom parâmetro para definir o prognóstico.
►Para a avaliação prognostica recomendamos realizar o estudo eletrofisiológico do nervo facial no começo da terceira semana após o início dos sintomas e repetir em 3 meses e após um ano. Nenhuma recuperação pode ser esperada após 2 a 3 anos da lesão.
BIBLIOGRAFIA
PARDAL-FERNANDEZ, J.M.; GARCÍA-ALVAREZ, G.; JEREZ-GARCÍA, P.; MARCO-GINER, J.; ALMODÓVAR-ALVAREZ, C. Parálisis facial periférica. Utilidad de la neurofisiología clínica. Rev. Neurol. 2003; 36: 991-96.
OH, SJ Clinical Electromyography: Nerve Conduction Studies. 3th ed. LWW.
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2007-02-14 12:47:31
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