Transfusões de sangue potenciam um novo surto de Creutzfeld-Jacob
Hugo Bordeira
em Londres
Centenas de pessoas no Reino Unido poderão estar em risco de contrair a doença de Creutzfeld-Jakob, a variante humana da doença das vacas loucas, através de sangue contaminado ou em cirurgias realizadas com instrumentos infectados. Esta é pelo menos a convicção do cientista britânico John Collinge, um especialista da Unidade Prião do Medical Research Council de Londres, que analisou um grupo de 66 pessoas vítimas de transfusões de sangue infectado e chegou à conclusão de que pelo menos três faleceram de causas directamente relacionadas com a doença.
"O facto de três indivíduos deste grupo, que sabemos ter sido exposto através de sangue contaminado, terem desenvolvido a doença de Creutzfeld-Jakob sugere que a infecção pode ser transmitida de forma muito eficaz por esta via, pelo que o risco para os restantes indivíduos contaminados é bastante elevado", escreve o professor, num relatório publicado na revista científica The Lancet.
Esta facilidade de propagação através de sangue infectado torna a doença potencialmente mais perigosa do que se pensava. Na verdade, sendo um vírus originado na Encefalopatia Espongiforme Bovina (também conhecida como BSE ou "doença das vacas loucas"), os principais receios tinham que ver com a propagação através de carne contaminada. No entanto, este estudo sugere que o risco de contaminação é maior através da transfusão de sangue, uma vez que por esta via não existe a barreira da mutação do vírus que ocorre na transmissão entre espécies.
Do grupo de 66 pessoas que se sabe terem sido contaminadas através de transfusões de sangue, 39 morreram de causas não relacionadas (34 das quais nos cinco anos seguintes à infecção) e sabe-se que três faleceram devido a lesões provocadas por priões (proteínas transmitidas pela doença que se propagam e destroem as células cerebrais). Neste momento há 24 indivíduos portadores do vírus que podem vir a desenvolver a nova variante da doença de Creutzfeld-Jakob, que segundo os médicos tem um período de incubação relativamente longo - tipicamente vários anos - mas, uma vez activa, é geralmente fatal ao fim de um ou dois anos.
Nos três casos estudados pelo professor John Collinge, a doença desenvolveu-se em seis/sete anos, bastante mais depressa do que nos casos de transmissão por carne contaminada. O último paciente analisado, cuja identidade foi reservada por motivos de privacidade, contraiu o vírus numa transfusão de sangue com 23 anos e começou a ter sintomas ao fim de sete anos. Iniciou um tratamento experimental em 2004 nesta unidade de investigação médica e acabou por falecer um ano depois, já com 32.
Uma conclusão que levanta receios de uma segunda epidemia no Reino Unido e deixou em alerta o Serviço Nacional de Sangue britânico, que já reconheceu não ter testes de despistagem capazes de detectar o vírus. Até à data, a doença já provocou 160 vítimas mortais no país, a maioria das quais jovens que ingeriram carne contaminada.
http://dn.sapo.pt/2006/12/09/sociedade/transfusoes_sangue_potenciam_novo_su.html
2007-01-03
00:23:49
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