A botânica grega de Dioscórides, traduzida para diversas línguas no século XVI, utilizava diversas denominações para as famílias de plantas: raça, espécie, casta, variedade, estirpe, diferença, etc. Já antes de Lineu, Gaspard Bauhin (1560-1624) havia já estabelecido em 1623 a primeira nomenclatura binária compreendendo uma definição do tipo gênero/espécie. Mas quase todos os herboristas seiscentistas desprezavam as flores e os frutos, seus métodos classificatórios privilegiavam as folhas. Como afirmava, no século XIX, o grande historiador da botânica, Julius Von Sachs, "Ce qu'il y a de plus étonnant dans ces descriptions, de celles de Fuchs et de Bock à celles de Gaspard Bauhin, c'est la maniere dont les auteurs en question on négligé l'étude des fleurs et des fruits" .
Conrad Gesner (1515-65) e Andrea Cesalpino (1519-1603) foram as exceções, os únicos que consideraram a forma da flor e do fruto e o número dos grãos como elementos centrais. O último é uma das grandes figuras italianas do saber médico-botânico seiscentista. O de Plantis libri, dedicado a Francisco de Médici e publicado em Florença, em 1583, é o primeiro herbário com um método de classificação baseado nas formas das flores e dos frutos.
Cesalpino, apesar de ser um dos poucos que não aceitava que as plantas tivessem sexo, foi um precursor de Carl Lineu que revolucionou a botânica ao sexualizá-la completamente. Todo o seu sistema baseava-se no sistema reprodutivo das plantas. Desde a antiguidade admitia-se um parentesco natural entre as plantas, o sistema de Aristóteles e Teofrasto classificava as famílias vegetais como árvores, arbustos ou plantas. A questão da reprodução e da partição sexual provocava opiniões diferentes. Aristóteles, por exemplo, não admitia que as plantas tivessem sexo: "Chez tous les animaux qui possèdent la locomotion, certaines différences distinguent le mâle de la femelle (...) Chez les plantes, en revanche, ces forces diverses sont confondues; les végétaux mâles ne se distinguent point des végétaux femelles (...) Les bêtes qui ne marchent pas, et les animaux qui restent adhérents à l'endroit où ils ont pris naissance, ont une existence semblable à celle des plantes; elles ne sont ni mâles, ni femelles" . A teoria da sexualidade vegetal desenvolveu-se mais tarde, na época de Plínio, o qual descreve, como nos informa o livro de Von Sachs, "les relations des dattiers mâles et femelles, et désigne le pollen comme étant l'agent de la fécondation, et ajoute, en terminant, que toutes les personnes compétentes en matière d'histoire naturelle croient à l'existence de deux sexes, non seulement chez les arbres, mais encore chez les plantes" . O saber prático da Antiguidade já praticava, entretanto, independentemente das teorias sexuais, processos de polinização, como demonstram evidências iconográficas assírias em relação a certas palmeiras .
Na época da recuperação renascentista dos clássicos, quase todos os médicos-botânicos, entre os quais Fuchs, Mattioli, Gesner, Clusius e Bauhin admitiam a sexualidade das plantas, e apenas Cesalpino continuou aferrado aos princípios aristotélicos.
A busca de uma ordem do universo vegetal, de uma taxionomia das plantas, desenvolveu-se, a partir do século XVI, em torno de duas visões: uma que acreditava existir uma ordem natural das plantas, que deveria ser descoberta para que pudesse ser exposto o conjunto das famílias, na qual o elemento central que os botânicos utilizavam para se estabelecer o parentesco era o do formato das folhas. Outros acreditavam que deveria existir uma ordem meramente analítica, criada pelo taxionomista como forma de exposição, pois não existiria qualquer parentesco intrínseco dado que as que partilhavam de certa similitude num aspecto, por exemplo, forma da folha, diferiam no outro, por exemplo, número e disposição dos estames. No século XVIII estas diferentes visões do mundo vegetal se manifestaram na disputa entre o sistema estrutural de Lineu e a atividade de Buffon, que recusava-se à qualquer sistema, preferindo a descrição minuciosa de cada espécie.
Os herbários do século XVIII diferem dos pioneiros seiscentistas do ponto de vista da sistemática classificatória. Incluem também um número cada vez maior de espécies. Jean Bauhin, numa edição póstuma de 1651, relacionou 5.200 plantas. Tournefort, que desenvolveu um sistema classificatório baseado na forma das corolas das flores, chegou, em 1688, a compilar o número de 10.240, e J. Ray, em 1703 alcançou 18.000.
O Florilegium de Joseph Banks é um herbário, nunca publicado durante a vida de seu autor, que reúne o mais completo levantamento das plantas da Oceania, feito por esse grande naturalista inglês, colaborador de Lineu, durante suas viagens pelas ilhas dos mares do sul.
As ciências naturais modernas (botânica, zoologia, mineralogia) nascem quando a história natural se especializa e classifica cada um dos reinos da natureza, separando-os em ramos definidos como, por exemplo, ornitologia, cristalografia, malacologia ou nosografia. A vocação classificatória é uma espécie de fase necessária de toda ciência que antes de teorizar gênese e estrutura necessita compilar o conjunto de objetos com que irá trabalhar para definir o seu espaço disciplinar.
Lineu foi o pioneiro não só na sistemática de classificação botânica como em diversos desses domínios que se tornaram especializados a partir de sua época . Em seu primeiro livro, Systema naturae, de 1735, era a integralidade do "sistema da natureza" que ele se propunha a classificar em classes, ordens, gêneros e espécies. Os minerais eram divididos em pedras e fósseis, os animais em seis classes e mais o homem como a sétima, com Deus no topo do sistema. O critério para a divisão das classes animais eram as diferenças entre certos caracteres como os dentes, as mamas, os estômagos, etc. Os vegetais dividiam-se em 24 classes. Também em relação às doenças, Lineu incursionou na sua classificação, escrevendo o Genera morborum, em 1763, onde as ordena em 11 classes e 325 gêneros.
O seu método provém, contudo, principalmente da botânica, onde ele alcança o seu melhor resultado, com o critério do sistema classificatória a partir das diferenças no aparelho reprodutivo das plantas. Da botânica a classificação estende-se pelo resto do universo. "Les symptomes sont à l'égard des maladies, ce que les feuilles et les supports (fulcra) sont à l'égard des plantes", escreve Lineu, declarando que é preciso aplicar o método dos botanistas ao estudo das doenças que devem ser divididas em classes, gêneros e espécies .
A busca das diagnoses, ou seja, da determinação das características de uma espécie animal ou vegetal, também designou os quadros nosológicos, assim como as diferenças do reino mineral, dando nascimento à moderna cristalografia, onde a idéia do cristal como flor do mineral ofereceu o critério para a classificação das pedras.
Lineu chegou a calcular a existência de um número aproximado de 10 mil espécies vegetais em todo o mundo, número que dista muito das estimativas da botânica contemporânea que trabalha com um universo vegetal de cerca de 700 mil espécies.
A época das viagens marítimas de exploração do Pacífico, o final do século XVIII, foi a mesma em que a botânica alcançava o seu sistema mais acabado, através da classificação de acordo com os caracteres sexuais, principalmente o número e a disposição dos estames. Os novos conceitos da botânica lineana se misturaram de forma indelével na mentalidade da época com os debates sobre a sexualidade humana e sobre as últimas viagens para ilhas e mares remotos onde uma humanidade até então desconhecida revelava justamente a exuberância de costumes sexuais completamente diferentes dos europeus.
A primeira edição da Encyclopaedia Britannica, publicada em 1768, afirmava a respeito do sistema de classificação das plantas apresentado pelo naturalista sueco Carl Lineu em 1735, com o livro Systema naturae, que: "A obscenidade é a verdadeira base do sistema lineano" . A razão para que aquele que é considerado o pai da botânica moderna seja acusado de obsceno é o fato de que o sistema classificatório lineano organizou-se em torno do sistema reprodutivo das plantas, cujas partes da floração e da frutificação oferecem as características estruturais que permitem que elas sejam comparadas e classificadas.
A exuberância estética do aparato reprodutor vegetal - ou seja, das flores - já tinha sido notada e destacada desde os autores antigos que, como escreve François Dagognet, observaram que os vegetais se dedicam a "orgies germinatives, à des debauches reproductrices, comme le remarquait déjà Bacon, après Aristote, et comme l'ont noté tous les poètes ou philosophes du végétal, tel Bernardin de Saint-Pierre ou Michelet: 'Dans les plantes, la racine, qui en est comme la tête, est régulièrement placée en bas, tandis que les organes de la reproduction occupent la partie supérieure'" .
Em 1789, Erasmus Darwin, avô de Charles Darwin, publicou um livro chamado The Loves of the Plants, que, na forma de um poema erótico-botânico, tornou-se uma das principais obras de divulgação popular do sistema de Lineu através de analogias da vida sexual das plantas com a dos humanos. Sua tradução ao francês ocorreu em 1799.
O sistema classificatório lineano, divulgado por Erasmus Darwin, dividia as plantas entre aquelas cuja reprodução sexual se fazia "aos olhos de todos" e aquelas que escondiam seu intercurso sexual. As primeiras, chamadas fanerógamas, são todas as que possuem flores, e as segundas, ditas criptógamas, incluem desde os fungos e algas até samambaias e coníferas. A analogia entre os amores vegetais e os humanos foi tão caraterístico da botânica setecentista, que ela suscitou uma intensa reação conservadora. Lineu descrevia flores hermafroditas (pistilo e estame na mesma flor), como "esposos que dormem na mesma cama", e as plantas que possuem flores masculinas e flores femininas, como "esposos que dormem em camas separadas". Como, segundo Pio Font Quer "en la mayoría de las plantas ambos os sexos se hallan acoplados en cada flor o, por lo menos, en un mismo pie" , a maioria do mundo vegetal preferiu compartilhar o mesmo leito. Além disso, o problema moral maior é que as flores possuem diversas variantes em relação ao número e a disposição dos estames e dos pistilos, justamente o que organizava a regra classificatória lineana. O número dos estames era considerado como o número dos machos, estames inférteis eram chamados de eunucos, os pistilos femininos podiam ser "adúlteros", "poliândricos", e assim por diante, o que fornecia um amplo material metafórico para as mais fantasiosas situações sexuais.
O reino vegetal, de acordo ao sistema proposto por Lineu em 1735, dividia-se em 24 classes, de acordo ao número de estames. A primeira divisão separava as plantas cujas núpcias eram celebradas diante de todos (flores visíveis) daquelas cujas núpcias eram celebradas secretamente (sem flores visíveis), que compunham no seu conjunto a classe da cryptogamia .
No primeiro caso, o das fanerógamas, uma segunda divisão operava a classificação entre as plantas em que machos e fêmeas compartem do mesmo leito (todas as flores são hermafroditas; com estames e pistilos na mesma flor) e as plantas em que machos e fêmeas dormem em camas separadas (as flores são masculinas ou femininas na mesma espécie).
Entre as plantas em que os esposos dormem separados, Lineu inclui três classes: monoecia (machos vivendo com as fêmeas na mesma casa mas em quartos separados; flores masculinas e femininas na mesma planta); dioecia (machos e fêmeas vivendo em casas separadas; flores masculinas e femininas em diferentes plantas); e polygamia (machos vivendo com viúvas e noivas em quartos diferentes; flores hermafroditas juntamente com flores masculinas e femininas na mesma espécie).
Prosseguindo em ramificações a sua classificação, Lineu, divide as plantas em que há um único leito nupcial entre aquelas em que os machos (estames) são cognatos (estames ligados um ao outro ou ao pistilo) e as que não são (estames separados). No caso dos machos com afinidades derivam quatro classes: monadelphia (dois machos de uma única base); diadelphia (machos originados de uma base dupla como de uma mãe dupla); polyadelphia (machos originados de mais de duas mães); syngenesia (união de machos através de seus genitais); e gynandria (machos unidos com fêmeas).
No caso dos machos sem afinidades, não cognatos, derivam duas subdivisões: uma em que há igualdade (machos não subordinados um ao outro; estames do mesmo tamanho), e outra em que há subordinação (dois estames são sempre mais curtos do que os outros). No interior da primeira subdivisão encontram-se os casos da monandria (um marido em um casamento; um estame numa flor hermafrodita); diandria (dois maridos no mesmo casamento; dois estames numa flor hermafrodita); triandria (três maridos no mesmo casamento; três estames numa flor hermafrodita); tetrandria-decandria (de quatro a dez estames/maridos); dodecandria (doze maridos no mesmo casamento; doze estames numa flor hermafrodita); icosandria (mais de vinte machos, estames ligados ao interior do cálix); polyandria (vinte machos ou mais no mesmo leito com uma fêmea; até mil estames na mesma flor com o pistilo).
Na subdivisão das plantas com subordinação entre os machos não cognatos do caso em que há leito compartido num matrimônio floral público, Lineu apresenta duas classes: didynamia (quatro machos/estames, sendo dois maiores e dois menores); e tetradynamia (seis machos, sendo quatro maiores).
Estas 24 classe, cujo critério de constituição é relativo ao número, forma ou estrutura do sexo masculino nas plantas, dividiam-se em seguida em ordens, de acordo às características sexuais femininas das plantas, ou seja, o número de estilos ou pistilos nas flores. A denominação das ordens segue linearmente de monogynia (com um pistilo), digynia, etc. até polygynia. As ordens dividiam-se em gêneros, e estes em espécies.
A botânica, na visão de Alan Bewell, influenciou a emergência de uma "política sexual" na época iluminista, no final dos setecentos. Pela primeira vez, em comparação com as plantas, a vida sexual humana adquiria a feição de uma instituição social. A botânica permitia que se falasse sobre um assunto até então relegado para fora da vida pública: o sexo. E foram as mulheres justamente as que mais se dedicaram a esse tipo de atividade florescente nas sociedades burguesas do final do século XVIII, a herborização.
O potencial erótico da descrição botânica tornou-se a fonte inspiradora de um gênero em expansão: a paródia científica pornográfica. E como a exploração botânica se ligava a idéia das expedições em terras longínquas, como as viagens contemporâneas dessa época aos mares do Sul, estabeleceu-se uma visão popular de um estreito laço entre a botânica de Lineu, a sexualidade humana e o estudo de outras culturas. Das diferentes alteridades com que os europeus se defrontaram, a que se inscreveu mais fundo no panorama cultural do final dos setecentos foi uma imagem idílica e edênica do Tahiti, onde a sexualidade desabrochava exuberante e sem coações, como o pólem das flores na primavera .
Michel Foucault, em As Palavras e as Coisas, traçou o panorama da mudança que caracterizou a passagem da epistémê medieval, baseada na noção da "semelhança", para a epistémê clássica, da ordem e da diferença.
Na epistémê clássica, época do racionalismo, a linguagem, o sistema dos signos, torna-se autônoma em relação às coisas que pretende representar. De parte integrante do universo das coisas, com as quais se integrava e se imiscuía, tendo sobre elas um poder mágico, a linguagem se descola dos objetos, instituindo-se como um sistema autônomo de representação das coisas.
É portanto como uma Ordem, de sistemas classificatórios, que se estabelecerá a base das ciências modernas, em oposição à noção anterior de Interpretação, que via nas coisas sinais ocultos a serem desvendados pelo princípio da Semelhança, que as relacionaria entre si infinitamente, como um jogo de reflexos numa sala de espelhos. São "a gramática geral, a história natural e a análise das riquezas (...) ciências da ordem no domínio das palavras, dos seres e das necessidades", que explicam o mundo, que deixa de ser um livro cifrado com interpretações simbólicas, e torna-se um objeto de mensuração, classificação e ordenamento.
Os signos tornam-se autônomos em relação às coisas e as representam. A noção chave da representação surge nesse momento quando os signos não são mais a marca de uma verdade secreta das coisas a espera de ser decifrada. Com a epistémê clássica os signos tornam-se a relação entre significantes e significados. As representações não são mais a expressão em palavras das qualidades naturais das coisas das quais os signos seriam como uma marca cujo som e escrita corresponderiam à própria natureza das coisas. Os signos deixam de ser qualidades naturais das coisas.
Como ciência classificatória, o exemplo modelar de sua aplicação se encontra em Lineu, que estabeleceu os ramos classificatórios das plantas. Na outra extremidade está a gênese, como ciência da constituição histórica dos ordenamentos.
Esta visão de Foucault, da modernidade como a autonomização dos signos, parece-me indispensável para compreendermos o nascimento de um sistema classificatório sexual das plantas. Os nomes das coisas, no caso das plantas, deixando de originar-se das tradições vernaculares, passam a ser atribuidos artificialmente num esforço consciente. Por essa razão Lineu é chamado panegiricamente, entre outros títulos, de "Segundo Adão", pois teria, como o antepassado primevo da humanidade, apontado para as plantas e lhes designado um novo nome.
O nascimento do sistema classificatório se acompanha de uma nomenclatura latina binária, onde o primeiro termo define o gênero substantivamente, e o segundo adjetiva a sua espécie. Embora mantenha denominações "poéticas", como Theobroma cacao (alimento dos deuses) por exemplo, a ênfase de Lineu é na descrição precisa de alguma característica física da planta. A representação na ambição descritiva totalizante define o léxico e a sintaxe do mundo natural, como se os seus signos não tivessem mais a relação mágica da assinatura do vegetal que define sua utilidade para o mundo dos homens que antes se lhes atribuia como marca decifrável.
Mas se o despojo da nomenclatura garantia a Lineu a precisão - ao invés de uma frase inteira, apenas um adjetivo junto ao termo genérico - subtraindo o elemento poético e literário da descrições naturalistas anteriores, como a de Buffon, e expressava a autonomia dos signos, que não mais cifravam as semelhanças intrínsecas, mas na limpidez técnica de um substantivo adjetivado em latim garantiam a criação de um idioma singular, o latim botânico, que ordenava as nomenclaturas como um sistema; por outro lado, a exposição científica e popular desse sistema empregava de forma obsessiva a metáfora sexual, antropomorfizando e moralizando o mundo vegetal.
A importância ideológica da difusão popular das idéias de Lineu ultrapassava o âmbito científico e moral para alcançar o político. A ciência mais representativa da Revolução Francesa foi a botânica. Enquanto a física e a química apareciam com uma reputação aristocrática, o culto à natureza encetado pelas Sociedades Lineanas que se difundiram pela Europa, inspiravam a idéia de uma educação naturalista, baseada nas leis naturais em oposição ao dogma religioso.
O austero e conservador Lineu, que recebera o título de nobreza e atendia diretamente a família real, filho e irmão de pastores protestantes, tornou-se o inspirador da "religião da natureza" que o jacobinismo quis implantar na França como alternativa ao cristianismo.
Os símbolos da Revolução revestiram-se de alusões vegetais. Os novos nomes dos meses, foram tomados do ciclo das estações, idéia que, segundo Pascal Duris, teria sido proposta, em 1756, pelo próprio Lineu num Calendarium florae, presente em uma de suas "amenidades acadêmicas" , e o plantio de uma árvore da liberdade tornou-se, numa adoção de uma prática semelhante da América do Norte, o ritual mais significativo da Revolução. Em 10 de agosto de 1793, a religião da natureza foi oficialmente proclamada, sob a inspiração das idéias de Rousseau, cujas cinzas serão levadas para o Panthéon em 12 de outubro de 1794.
Jean-Jacques Rousseau, que havia se dedicado ao herborismo, correspondeu-se com Lineu no fim de sua vida e ambos, coincidentemente, morreram no mesmo ano de 1778. Em 1771, Rousseau escrevia uma carta com as seguintes palavras para Lineu: "Recevez avec bonté, Monsieur, l'hommage d'un très-ignare, mais très-zélé disciple de vos disciples, qui doit en grande partie à la méditation de vos écrits la tranquillité dont il joui (...) Adieu, Monsieur, continuez d'ouvrir & d'interpréter aux hommes le livre de la nature; pour moi content d'en déchiffrer quelques mots à votre suite dans le feuillet du règne végétal, je vous lis, je vous étudie, je vous médite, je vous honore & vous aime de tout mon coeur" .
Como expõe Pascal Duris, "la plantation des arbres de la Liberté, la nomenclature du calendrier républicain, ou l'organisation de l'enseignement témoignent que ce discours botanico-philosophique pénétré du culte rousseauiste de la nature est perçu favorablement par les dirigents politiques" . Lineu encarnava nesse momento, não apenas o "espírito utilitarista, metódico e racionalista da Revolução", como escreve Duris, ou o culto às leis da natureza, como também as empreitadas pioneiras da colonização científica do mundo, quando o esquadrinhamento dos recursos naturais do planeta tornou-se uma tarefa desbravadora de viajantes como Cook, Banks e muitos outros.
A influência da obra de Lineu, de seu sistema classificatório e das suas repercussões morais no Brasil é uma questão ainda indeterminada. Não tenho conhecimento da existência de nenhum livro do próprio Lineu nas bibliotecas do período colonial. A vinda de livros para o Brasil embora fosse submetida aos duros controles da censura, que tinha especial atenção sobre autores de países protestantes, como era o caso do naturalista sueco, não impediu a chegada de muitas das obras mais revolucionárias do século XVIII, como é o caso de Diderot, D'Alambert, Voltaire e outros, conforme se pode verificar nos inventários de bibliotecas coloniais brasileiras.
Os trabalhos de análise destas bibliotecas coloniais indicaram a presença destas obras do enciclopedismo, assim como de algumas de história natural, como é o caso da História Natural do Brasil, presente na biblioteca do bispo de Mariana, que com 400 títulos se constituía, como escreve Luís Carlos Villalta, em uma das maiores da colônia .
Mas a obra mais próxima de Lineu presente numa destas bibliotecas brasileiras foi o livro Voyages autour du monde, de Joseph Banks, encontrado na biblioteca do cônego Luís Vieira da Silva, pois o grande explorador inglês fizera parte das viagens do capitão Cook aos mares do sul e, estando no Rio de Janeiro, em 1768, dedicou-se a explorar a flora e fauna locais juntamente com Solander, um dos discípulos de Lineu, que enviava seus agentes pelo mundo para coletarem espécimens .
O grande auge dos estudos sobre a natureza do Brasil somente se deu no século XIX, quando após a revogação, em 1808, da proibição aos visitantes estrangeiros no país, ocorreu uma onda de "viagens filosóficas" de naturalistas europeus para o Brasil .
O tema da influência científica e cultural do sistema de Lineu no Brasil do século XVIII permanece, portanto, como um tema aberto para uma investigação mais acurada. A passagem pelo Rio de Janeiro de um discípulo do mestre sueco comprova que chegaram à Uppsala, na Suécia, amostras diretas de nossa flora, a qual Lineu dedicou-se a denominar com homenagens a sábios europeus, como é o caso do pau-Brasil, cujo nome do gênero foi chamado Caesalpina, em honra de Andrea Cesalpino. Se não podemos aquilatar a difusão dos livros de Lineu no Brasil podemos, ao certo, afirmar que a colônia portuguesa influiu na compilação e classificação das espécies empreendida por Lineu e seus colaboradores.
valeu........
2006-11-23 15:53:30
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answer #3
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answered by M.M 7
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