A desertificação é um problema que complica a vida de milhares de agricultores, principalmente no sertão nordestino. No programa passado o Globo Rural mostrou o drama dos sertanejos que estão perdendo as suas terras, em Gilbués, no Piauí.
Um projeto em Pernambuco ajuda os produtores a prevenir o problema. A principal preocupação é evitar a devastação da caatinga.
Entre dezembro e abril, quando a chuva não falta, a caatinga fica cheia de vida: tem folhas verdes, pássaros, insetos e muita flor. Mas em certos lugares, mesmo nessa época do ano, o cenário é de aridez.
As manchas de degradação se espalham pela paisagem. O município de Santa Cruz, oeste de Pernambuco, é a mesma região de Ouricuri, Parnamirim e Cabrobó, uma das áreas mais castigadas pela desertificação no Brasil.
Em cada região o problema tem uma cara diferente. Enquanto no sul do Piauí a desertificação está ligada a erosão de áreas imensas, com milhares de hectares de valas, buracos e terra fofa, em Pernambuco predominam as clareiras na vegetação. São áreas menores e mais pedregosas. Na origem do problema está o corte descontrolado da caatinga.
A vegetação dá lugar ao pasto, às lavouras, de todo tamanho. Pedreiras também são comuns pela região.
Esta é uma área típica de extração de pedras desta região de Pernambuco. Dezoito anos atrás, o local era totalmente coberto por vegetação. Com o tempo a pedreira foi derrubando a caatinga, abrindo espaço, cavando o terreno. Hoje, o que se vê é uma cratera imensa.
O dono do buraco é, também, agricultor. Seu João de Souza não largou a roça, mas hoje vive principalmente da pedreira. É um negócio informal. "Eu não sabia que precisava de autorização para trabalhar na pedreira. A gente está trabalhando na pedreira para arrumar o pão mais fácil, para ver se facilita mais", disse.
Vender pedra é um recurso comum entre os pequenos produtores da região. Outra atividade que agride a vegetação é o corte de lenha. Em casa, os sertanejos cozinham com madeira da caatinga. E muita gente faz carvão pra vender. A lenha queima em valas cobertas com terra.
"Quando faz uma carreira meia grande, que dá 15 ou 20 sacas, às acaba tirando um saco ou dois e vende. Dá para comprar um açúcar ou um arroz", contou o agricultor Charles de Souza.
A caatinga também alimenta os fornos de padarias, olaria e até mineradoras. E tem uma atividade campeã da devastação da caatinga: a fabricação de gesso. O oeste pernambucano abriga o maior pólo gesseiro do Brasil, que envolve mais de 500 empresas de todo tamanho. A matéria-prima extraída do solo, a gipsita, é triturada e depois desidratada nos fornos a lenha.
O dono de uma fábrica em Araripina, Aureliano Rodrigues, disse que só usa madeira com origem legal. Mas isso está longe de ser regra na região.
"Eu acredito que já está começando a ficar até inviável para os próprios empresários. À medida que vai se devastando, vai se distanciando. Então, daqui a pouco estou tirando lenha a 300 ou 400 quilômetros. Se a gente não pensar nisso agora, futuramente o problema vai ser muito maior", avaliou Rodrigues.
Segundo o Ibama, grande parte da lenha que abastece as gesseiras é comprada de maneira ilegal de pequenos produtores. São sertanejos pobres que dependem disso pra sobreviver.
"A área de desmatamento provocada por este pólo gesseiro por ano gira em torno de dez mil hectares e em torno de 20% a 25%, variando de ano a ano, tem origem legal", esclareceu José Alencar, chefe regional do Ibama.
O desmatamento pela região é tão intenso que já virou tema de estudo da Embrapa. O trabalho, baseado em imagens de satélite, revela que 70% da área de caatinga já sofreu algum tipo de degradação.
E qual a relação do desmatamento com a desertificação pelo lugar? O engenheiro florestal Iedo Bezerra Sá, da Embrapa Semi-Árido, é especialista no assunto. Em uma pesquisa, ele avaliou a situação da caatinga em 26 municípios da região.
"Retirando a cobertura vegetal acontecem vários problemas. Os solos ficam totalmente expostos à degradação. Os solos passam a ser erodidos. Com isso, perdem condição física, fertilidade natural e capacidade de retenção de água, ou seja, é um transtorno imediato", explicou o doutor Iedo.
O doutor Iedo lembra que essas áreas em processo de desertificação não vão ficar parecidas com aquele deserto clássico de areia, como o Saara, na áfrica. Mesmo assim, elas se tornam imprestáveis pro agricultor.
Em uma encosta ao lado da casa, seu Adonia e dona Maria de Souza já cultivaram muito milho, feijão e mandioca. Hoje, só se vê cascalho e destruição.
"No passado aqui era caatinga. Eu mesmo derrubei. Botei fogo", contou seu Adonia.
O mesmo cenário se repete entre os vizinhos. Os agricultores derrubam a caatinga e, sem orientação, não tomam os cuidados básicos de conservação do solo. Resultado: sem querer e sem saber o sertanejo alimenta o problema.
"Nunca ouvi falar em desertificação", disse seu Adonia.
E será possível evitar histórias como esta? No Brasil, existem poucos trabalhos sobre o assunto. Falta pesquisa, falta assistência técnica e falta dinheiro.
Em 2004, o governo federal lançou o Programa Nacional de Combate a Desertificação. Elaborado com apoio de cientistas, ministérios, ONGs e das próprias comunidades afetadas, o programa sugere estratégias de ação.
A idéia central é: só dá para cuidar do meio-ambiente cuidando, também, das pessoas.
"A convenção das Nações Unidas define: combater a desertificação implica em combater a pobreza. Em todo o mundo são nas regiões áridas, semi-áridas e secas que estão os maiores contingentes de pobres. Então, não tem como tratar dessas questões da pobreza dissociadas das questões ambientais", explicou José Roberto Lima, coordenador técnico do Ministério do Meio Ambiente.
Este olhar social e ambiental é uma referência para os novos projetos de combate à desertificação dentro e fora do governo.
No Brasil, um trabalho pioneiro nasceu em Pernambuco, na comunidade de Antonica, no município de Santa Cruz.
Em uma das reuniões, os sertanejos discutiram medidas práticas para melhorar a qualidade de vida das famílias. O trabalho do governo do Estado envolve agricultores, técnicos, pesquisadores e prefeituras, como explicou a coordenadora Alexandrina Sobreira de Moura.
"A pobreza não pode esperar que determinadas áreas sejam preservadas se elas precisam daquela área para sobrevivência. O projeto de combate à desertificação permite combater a pobreza porque você passa a ter uma renda familiar mais alta e sobretudo não degrada o meio ambiente", disse Alexandrina.
O trabalho já envolve 550 famílias, espalhadas por 11 municípios do sertão pernambucano.
Um abraço
2006-10-23 05:53:30
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answer #1
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answered by Tin 7
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