O primeiro passo na seqüência dos eventos que origina o fenômeno sensitivo-doloroso é a transformação dos estímulos ambientais em potenciais de ação que, das fibras nervosas periféricas, são transmitidas para o SNC. Os receptores nociceptivos são representados por terminações nervosas livres presentes nas fibras mielínicas finas A-delta e amielínicas C das estruturas superficiais e profundas do tegumento, parede das vísceras e dos vasos sangüíneos e nas fibras correspondentes III e IV do sistema músculo-esquelético. Os nociceptores relacionados com as fibras C respondem à estimulação mecânica, térmica e/ou química intensas e, os relacionados às fibras A-delta, à estimulação mecânica e/ou térmica intensas.
A atividade dos receptores nociceptivos é modulada pela ação de substâncias químicas, denominadas algogênicas, liberadas em elevada concentração no ambiente tecidual em decorrência de processos inflamatórios, traumáticos e/ou isquêmicos. São originadas de células lesadas, leucócitos, mastócitos, plaquetas e de moléculas livres presentes no interior dos vasos sangüíneos. Dentre as substâncias algogênicas, destacam-se: a acetilcolina, as prostaglandinas, a histamina, a serotonina, a bradicinina, o leucotrieno, a substância P, a tromboxana, o fator de ativação plaquetário, os radicais ácidos e os íons potássio.
As vias nervosas primárias têm o corpo celular localizado nos gânglios sensitivos, de onde as fibras emergentes dividem-se em proximais e distais. As proximais agrupam-se em radículas e penetram na medula espinhal pelas raízes posteriores e anteriores. Cerca de um terço das raízes anteriores é sensitiva e predominantemente dolorosa. Em ponto situado aproximadamente um milímetro antes da penetração das radículas na medula espinhal, a bainha de mielina, produzida pela oligodendroglia, junta-se à bainha de mielina produzida pelas células de Schwann. No ponto de penetração das raízes nervosas na medula espinhal, ou no tronco encefálico, as fibras nociceptivas destacam-se das aferentes mais calibrosas, concentram-se no feixe ventrolateral das radículas, dividem-se em ramos ascendentes e descendentes e entram na constituição do trato de Lissauer. Deste, as fibras projetam-se nas unidades celulares do corno posterior da substância cinzenta da medula espinhal (CPME).
A substância cinzenta da medula espinhal é dividida em 10 lâminas de acordo com a morfologia da célula, bioquímica das unidades celulares, atividade celular frente a estímulos de diferentes naturezas, ou em função das fibras de projeção supra-segmentares que originam. O CPME corresponde às 6 primeiras lâminas, no sentido póstero-anterior. O CPME não é apenas uma estação de coleta de informações transmitidas pelos aferentes primários. Contém interneurônios que interferem no processamento das informações sensitivas, inibindo ou facilitando a transmissão dos potenciais veiculados pelos aferentes primários para os sistemas de projeção supra-segmentares. Além das aferências oriundas dos nervos periféricos, as células do CPME recebem projeções originadas no córtex cerebral, nas estruturas subcorticais e no tronco encefálico, que participam do mecanismo de modulação segmentar da atividade sensitiva. Os aferentes primários do grupo C projetam-se nas porções profundas da lâmina I e superficiais da lâmina II. Os aferentes A-beta e A-delta penetram na porção medial do CPME, alcançam as lâminas IV, V VI e IX. As células das porções profundas da lâmina II e da lâmina III (substância gelatinosa) recebem fibras A-beta e A-delta que veiculam informações mecânicas de baixo limiar. Estas estruturas estão envolvidas no mecanismo de modulação da dor na medula espinhal. As projeções dos aferentes nociceptivos viscerais e musculares somam-se aos tegumentares na lâmina V e vizinhanças. Nestas estruturas é que, por mecanismo de facilitação, somação e convergência de estímulos, o fenômeno de dor referida visceral e músculo-esquelética se processam.
Mais de uma dezena de neuropéptides neurotransmissores foram identificados nos gânglios das raízes sensitivas e nos aferentes primários, incluindo-se entre eles a substância P, a substância K, octapeptídeo-colecisto-quinina, somatostatina, peptídeo relacionado com a calcitonina, peptídeo vasoativo intestinal, dinorfina, encefalinas, fator de liberação de corticotrofina, arginina-vasopressina, oxitocina, peptídeo liberador de gastrina, bombesina, angiotensina II e galanina, entre outros. Há evidências de que aminoácidos, como o ácido glutâmico e o aspártico, a serotonina, a dopamina, a tirosina e a adenosina apresentem, também, atividade neurotransmissora nos aferentes primários. A existência de múltiplos neurotransmissores pode estar relacionada com a codificação do estímulo nociceptivo periférico. O peptídeo vasoativo intestinal parece estar envolvido no mecanismo de aferência nociceptiva visceral. O ácido-glutâmico e o ácido-aspártico estão envolvidos com a veiculação da informação nociceptiva aguda e, a substância P, com a veiculação da dor crônica.
Os receptores das unidades neuronais do CPME, aonde se ligam os neurotransmissores dos aferentes primários, são de várias categorias. Destacam-se, entre eles, os envolvidos no mecanismo de ação dos aminoácidos (ácido glutâmico) e das taquiquininas (substância P). Os receptores AMPA (ativados pelo ácido 2-amino-3-hidroxi-5-metil-4-isoxasole-propiônico) e os cainatos são adicionados imediatamente após a liberação de aminoácidos excitatórios (incluindo o ácido glutâmico) e estão envolvidos no mecanismo de localização têmporo-espacial e na quantificação da dor. Em conjunto, são denominados receptores não-NMDA. Os receptores NMDA (ativados pelo N-metil-D-aspartato) são ativados por neurotransmissores excitatórios (ácido-glutâmico) e modulados por neuropéptides (por exemplo, a substância P) e atuam centenas de milissegundos após a chegada do estímulo. Os receptores de neuroquininas ativados por taquiquininas atuam segundos após a liberação destes neurotransmissores. Os receptores NMDA e os de neuroquininas estão relacionados com o mecanismo de sensibilização dos neurônios do CPME, com a geração da dor crônica e com a modulação da nocicepção. Muitos neurônios sensitivos do CPME (neurônio de grande espectro sensitivo) são ativados por estímulos mecânico e térmico discriminativos e por estímulos nociceptivos. A estimulação nociceptiva aumenta a excitabilidade dos neurônios do CPME, incluindo os que originamos tratos ascendentes espinotalâmicos e espinorreticulares. A sensibilização dos neurônios do CPME e a ativação das sinapses NMDA inativas é uma das causas de hiperalgesia secundária (dor à estimulação mecânica em pontos distantes daqueles que sofreu lesão) e da alodínia (dor gerada por estimulação não-nociceptiva). A persistência do estímulo doloroso que torna os neurônios do CPME sensibilizados é devida à modificação dos sistemas de segundos-mensageiros, a fosforilação dos receptores e dos canais iônicos e à alteração da expressão genética celular. Disto resulta a ocorrência da interpretação de os estímulos não-nociceptivos serem dolorosos, muitas vezes veiculados por vias aferentes mecânicas discriminativas (A-beta) que ativam os neurônios de grande espectro, do CPME, sensibilizados. A remoção do agente nociceptivo (por exemplo, doença inflamatória) resulta em desaparecimento da hiperalgesia e da alodínia, em horas ou dias. A estimulação nociceptiva prolongada pode resultar em persistência do fenômeno doloroso, mesmo após a remoção do agente causador, em decorrência da estruturação dos mecanismos de sensibilização dos neurônios do CPME. Este seria um dos mecanismos da ocorrência da dor crônica. Admite-se que o emprego de antagonistas de receptores NMDA pode bloquear o fenômeno de sensibilização e da cronificação da síndrome álgica.
A transmissão das informações nociceptivas da medula espinhal para as estruturas encefálicas é realizada mediante sistemas neuronais que compõem o trato espinotalâmico, espinorreticular, espinomesencefálico, espinocervical, pó sináptico do funículo posterior e intracornual.
2007-03-29 08:20:09
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answer #1
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answered by L U K E 7
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