A questão do terrorismo e suas raízes históricas
As palavras “terrorismo” e “terrorista” vem sendo fartamente utilizadas pelos meios de comunicação de massa, depois das ações ocorridas no dia 11 de setembro. Pretendemos com este artigo, discorrer um pouco sobre esse conceito de “terror” e seus desdobramentos e implicações na atualidade do mundo.
Pode-se classificar, grosso modo, em quatro tipos as ações que se dizem “terroristas” e diversos são os exemplos com o passar da história: o terror religioso e fundamentalista (no caso de muçulmanos, cristãos e judeus extremistas que muitas vezes fazem de seu corpo uma arma de guerra); os do tipo mercenário (aqueles que se movem por dinheiro). Pessoas que abraçam essas concepções até editam uma revista em plano mundial denominada Soldiers of Fortune e agiram muito em território africano nas décadas de 1960 e 1970 do século passado. Um terceiro tipo seriam os nacionalistas (como o exército Republicano Irlandês – IRA na Irlanda e a ETA, no país Basco) e por fim os ideológicos sejam eles de esquerda ou de direita (o caso das milícias americanas das quais era membro Timothy McVeigh, na ação em Oklahoma)[1].
A palavra passa a ser mais largamente empregada na história a partir de 1793, na França de Robespierre. Até o inventor da guilhotina, um cidadão francês de sobrenome Guilhotan, teve sua cabeça ceifada por esse instrumento no período que se denominou chamar de “terror”. O caso que repercutiu muito no final do século XIX foi o assassinato do Czar da Rússia Alexandre II, em 1891, por uma organização revolucionária da qual o irmão de Wladimir Lênin participava, que se autodenominava de “Vontade do Povo”. Os livros de história geral dão como certo que o início e o estopim da I Guerra Mundial foi o assassinato do Arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa, perpetrado pelo estudante Gavrilo Prinzip, integrante do grupo que se intitulava “Mão Negra”, de origem sérvia.
O mito do terrorismo islâmico
Os impérios na história também sempre se esforçaram para criar certos mitos, difundir certas idéias e conceitos e mesmo dar certas dimensões para fatos e episódios que nem sempre correspondem à realidade. Isso sem falar na distorção de informações, que são feitas cotidianamente pela grande imprensa. São muitos os casos. Lembremos do incêndio no Reichstag – prédio do parlamento alemão – ao qual o governo de Hitler divulgou como tendo sido praticado por um comunista. Um camarada do Partido Comunista Alemão chegou a ser preso e torturado no sentido de que admitisse esse ato criminoso, que, muito mais tarde, ficou provado que tal incêndio criminoso fora feito por agentes do Partido Nazista.
Vejamos o caso do Plano Colômbia. O discurso americano vai no sentido de que é preciso combater com toda a força e veemência o narcotráfico nesse país. Além dos EUA serem os maiores consumidores de drogas do mundo, tem dentro da sua própria estrutura policial e legal, a corrupção instalada de forma que membros do alto escalão burocráticos podem estar comandando estas mesmas operações de tráfico que supostamente se combate. No entanto, os objetivos de tal Plano são outros. O reforço de armamentos e assessores militares americanos é na verdade para aniquilar a guerrilha colombiana – que recentemente unificou-se, as FARC e o ELN – que luta contra o governo de Álvaro Uribe.
O cidadão saudita chamado Osama Bin Laden já foi considerado pelos queridinhos da mídia ocidental como sendo um “guerreiro da liberdade”. Era assim que ele era chamado, quando decidiu lutar contra o exército soviético – o Vermelho – na guerra pela ocupação do Afeganistão pela antiga URSS a partir de 1979, guerra essa que durou quase dez anos (a que alguns autores chamam de o Vietnã soviético). Nessa época, os guerrilheiros islâmicos de Osama receberam armas, milhões de dólares e até mesmo treinamento por parte das agências de inteligência dos EUA.
No entanto, Osama sempre foi o Osama que todos conhecem: um fundamentalista islâmico, tão radical em seus pensamentos e propósitos, quantos os cristãos protestantes, a nova direita americana, que professam fé de orientação também fundamentalista. O maior expoente desse fundamentalismo cristão é ninguém menos do que o próprio George Walker Bush. O discurso da luta “do bem contra o mal” e na linha de “ou se está com os EUA ou se esta contra”, divide o mundo entre os países e povos que apóiam as propostas do governo americano e os que não apóiam. E isso cria um clima de cizânia, que acaba envolvendo a grande mídia, que toma partido dos poderosos e de Bush, e as restrições das liberdades civis crescem substancialmente.
De uns tempos para cá, Osama foi classificado como o maior terrorista da terra e o “bandido”, por assim dizer, mais procurado do mundo. Os episódios da queda das torres gêmeos em 11 de setembro de 2001 chocaram o mundo. Logo em seguida, em 7 de outubro, menos de um mês depois, o Afeganistão estava sendo invadido e bombardeado covardemente pelo maior exército do mundo. Gastaram mais de 50 bilhões de dólares para destruir um país e massacrar um povo que produz, por 12 meses seguidos, um PIB de apenas 3 bilhões de dólares!!! Seguramente um dos mais pobres da terra. Também menos de dois anos depois desse famigerado e injustificável atentado em Nova York, o Iraque seria invadido e duramente bombardeado, já tendo nesses dois anos de ocupação anglo-americana, sido mortos mais de 30 mil membros da resistência e fala-se em mais de 200 mil cidadãos desse país árabe.
Foi mesmo a Al Qaeda que atacou as Torres gêmeas em 2001?
Longe de mim ser adepto do que se chama de teoria conspirativa da história. Ao contrário. Sou adepto do materialismo dialético e histórico, ou seja, as coisas e os fenômenos sociais e políticos da humanidade podem ser explicados pelas leis gerais que regem as sociedades e pelo desenvolvimento das forças produtivas e transformação dos modos de produção.
No entanto é forte a tal teoria da conspiração. Vejamos o caso do assassinato de Kennedy em 1962 nos EUA. Quantos e quantos livros já não foram escritos, dizendo que isso foi mesmo uma conspiração dentro do Estado americano, onde seria preciso incrementar a guerra no sudoeste asiático e desenvolver a indústria armamentista. Ou seja, uma espécie de golpe do complexo industrial-militar norte-americano. Há até um filme sobre o assunto, do diretor Oliver Stone que passou no Brasil com o título A pergunta que não quer calar.
Bem, a questão que se coloca é a seguinte: teria sido mesmo o grupo Al Qaeda o responsável pelos ataques às Torres Gêmeas? O governo americano sabia com antecedência das operações? Se sabia, por que não agiu a tempo? Haviam interesses por detrás dos ataques? A quem interessava mais um atentado dessa magnitude?
Não é preciso dizer que até meados de setembro de 2001, Bush amargava ainda oito meses de um início de gestão extremamente polêmica, medíocre, especialmente pelo fato do mesmo ter sido nomeado pela corte suprema e não eleito pelo povo americano. A fraude fora comprovada de todas as formas, no estado governado pelo seu irmão, Jeb Bush, na Flórida, mas a Suprema Corte, por 5 votos a 4, decidiu pela nomeação de Bush. Nunca é demais lembrar o voto do juiz John Paul Stevens, conservador como todos, mas que disse “embora talvez jamais venhamos a saber ao certo a identidade do vencedor da eleição presidencial deste ano [2000], a identidade do perdedor esta perfeitamente clara. É a confiança do povo no juiz como guardião imparcial do estado de direito”. A popularidade do presidente americano era das mais baixas em toda a história do país. No dia seguinte da queda das torres, com o discurso bélico, militarista, Bush vai a quase 80% de aprovação. Calaram-se os democratas que lhe faziam oposição e praticamente desapareceu qualquer voz dissonante na grande imprensa. Intelectuais de renome foram criticados e mesmo perseguidos e as liberdades civis foram restringidas.
Há uma série de elementos que deixam todo mundo estarrecidos, um conjunto de ocorrências, de erros da administração Bush que são ou imperdoáveis e passíveis de impeachment, ou de extrema conivência. O livro do vigoroso e combativo escritor “dissidente” americano, Gore Vidal, intitulado Sonhando a Guerra[2] trata desse assunto. Vidal é autor de 22 romances e mais de 200 ensaios, e é hoje, ao lado de Noam Chomsky, o maior crítico do Estado americano. O impressionante são os novos fatos e depoimentos que estão vindo à tona que fazem com que fiquemos, no mínimo, balançados na bendita teoria conspirativa da história. Listo alguns dos principais argumentos do autor:
Como foi possível que num país, com a tecnologia militar e aérea dos EUA, que quatro aviões fossem simultaneamente seqüestrados no dia 11 de setembro de 2001, exatamente às 7h45 e até o ataque à segunda torre em Nova York e ao Pentágono, em Washington, às 9h20 da mesma manhã, nenhum avião, nenhum caça de defesa do sistema aéreo alçasse vôo de interceptação? Isso esta completamente fora dos padrões de segurança do NORAD – North American Aerospace Defense Command (Comando Aeroespacial de defesa Aérea dos EUA). Detectado um seqüestro, a ordem de alçar vôo não é do presidente e isso ocorre em menos de 15 minutos (apenas a ordem de abater jatos no ar depende do presidente);
Porque a CIA e o FBI não seguiram alertas recebidos dos setores de inteligência de pelo menos três países: Rússia, Egito e Israel? Um informe de julho de 2001 – dois meses antes – da própria CIA, diz que “baseados numa análise de todas as fontes cobrindo os últimos cinco meses, acreditamos que Osama Bin Laden irá desferir um significativo ataque terrorista contra os interesses americanos nas próximas semanas”!;
Porque o governo americano recusou a proposta do Sudão e até do Paquistão de prender Osama e posteriormente deportá-lo para os EUA, se ele era, desde então, o “terrorista” mais procurado do mundo?
Porque Bush, que visitava no momento da explosão da primeira torre uma escola primária na Flórida ouvindo alunos lerem para ele (afinal, alguém tem que ler para Bush, pois este não consegue, segundo Michael Moore) e mesmo sendo avisado por sua assessoria do primeiro choque ele não interrompeu imediatamente a sua visita? Moore, em seu excelente documentário no cinema, Fahrenheit, 11/9, mostra essas imagens do assessor presidencial informando Bush em seu ouvido e a reação do presidente é, lendo um livro sobre a história de uma cabra (e de cabeça para baixo), demora pelo menos sete longos minutos para tomar uma atitude. Enquanto isso o vôo 77 da American Airlines da uma completa meia volta nos céus de Ohio e ruma para Washington para explodir o Pentágono, que até hoje não se sabe o número de mortos e feridos (segredos de Estado?).
Analistas e estudiosos do assunto e membros da alta cúpula militar americana chegam à conclusão de que o contra-ataque aos aviões seqüestrados não só não fora dado, como, ao contrário, a ordem dada teria sido a de ficar parado, estacionado no solo. E ainda por cima divulgaram que os pilotos islâmicos que assumiram o controle das quatro aeronaves fizeram cursos de pilotagens em escolas que ensinam a pilotar pequenos Cesnas. Incrível. Uma das aeronaves efetuou manobras tão radicais em forma de grande e fechada curva aérea, que, a que colidiu com o Pentágono, atingiu o edifício em vôo tão rasante e preciso que até a fiação elétrica próxima do prédio fora afetada. Estas e outras perguntas e dúvidas ainda continuarão sem respostas por um longo tempo.
Terroristas ou guerrilheiros?
A mídia trata indistintamente como terroristas todos os que lutam em defesa dos interesses de um povo, na luta pela emancipação de um país, como é o caso dos palestinos e dos iraquianos. O jornalista Marcelo Beraba, ex-ombudsman da Folha de São Paulo tratou desse assunto em uma de suas colunas e de forma indignada, fez duras críticas ao seu próprio jornal[3].
Os debates surgiram a partir de diversas cartas aos leitores, publicada na página três desse grande jornal paulista. Leio diariamente a Folha e o Estadão e sempre que posso, também leio o Jornal do Brasil e o jornal O Globo, que são os quatro grandes jornais do país e pertencem a grandes famílias que controlam a maior parte dos meios de comunicação de massa (são elas, respectivamente: famílias Frias de Oliveira, Mesquita, Nascimento e Brito e Marinho). Não acho que essas famílias, que integram as classes dominantes de nosso país, defendam os interesses da maioria oprimida e explorada de nossa sociedade e menos ainda dos que lutam por liberdades e pela emancipação de seus povos da opressão imperialista americana e sionista. Assim, todas as reportagens que esses grandes hebdomadários fazem publicar, vem todas elas carregadas de uma ideologia daqueles que costumam contar a história como vencedores, a visão dos que dominam e querem manter e continuar a dominação.
O episódio que descreve o jornalista Beraba, retrata o fuzilamento sumário pelo exército israelense, de quatro jovens palestinos, onde a Folha os chama, indistintamente, de “terroristas” (sic). Uma barbaridade! Porque um jornal sério, ainda que burguês, precisaria fazer essa afirmação? Que investigação a Folha fez contra esses jovens, assassinados brutalmente pelo exército israelense, para colocar essa pecha negativa nesses jovens mortos? Nenhuma. Para a Folha, seguramente, todos os que lutam por liberdades, contra a opressão, são terroristas.
O próprio ombudsman, que a Folha paga para, semanalmente, tecer críticas sob o ponto de vista dos seus leitores, ficou indignado com a atitude desse jornalão. Pediu esclarecimentos internos, que não o convenceram. Ligou para editores de internacional dos outros grandes jornais, que acabaram dando uma verdadeira lição à Folha, ao dizerem, de forma clara, que dificilmente usam essa terminologia para uma das partes em conflito, até porque ela tem uma carga ideológica negativa, que depõe contra quem leva esse nome e isso acabaria por favorecer uma das partes no conflito, no caso específico, os israelenses.
Um dos leitores, Nassib Rabeh, que indagou o jornal, de forma direta e correta, provavelmente de origem palestino ou árabe, levanta a questão desta forma: “se a Folha acha que todos os lutadores e membros da resistência palestina são terroristas, deve dizer isso de forma clara aos seus leitores”. O que na verdade a Folha faz é usar essa terminologia que vem direto das agências internacionais e que o jornal apenas reproduz em seu noticiário diário. Bom, os outros jornais nacionais, que também recebem esses despachos de agências, não reproduzem esse termo equivocado. O uso desse termo absurdo para chamar palestinos e iraquianos que lutam pela emancipação de seus povos e seus países, acaba comprometendo seriamente a chamada “imparcialidade” da imprensa, que, sabemos, nunca existiu. Isso além de distorcer as reportagens, carregam-nas com uma carga ideológica que desequilibram a sua cobertura. Os jornais tão burgueses como a Folha, como O Globo e o Estadão, preferem adotar termos como “radicais” e “extremistas”, mas mesmos esses, taxam esses lutadores do povo de forma equivocada. Porque seriam “extremistas” os que, de armas em punho, lutam pela expulsão dos que ocupam o seu país? Acho desapropriada essa terminologia, ainda que seja melhor do que a de “terrorista”.
O dirigente comunista do PCdoB, Rogério Lustosa, falecido em 1992, que foi secretário nacional de comunicação e propaganda do Comitê Central do Partido, tratou dessa temática em artigo publicado na revista Princípios de 1984. E o fez com maestria, abordando o tema de como a mídia criminaliza e distorce os fatos e os acontecimentos, para manipular a opinião pública e colocá-la contrário a uma determinada causa de um povo. Assim, desde há muito, os guerrilheiros palestinos são chamados de extremistas, terroristas. É como tratam no Brasil nossos livros de história os que lutaram pela independência do Brasil, vistos como “rebeldes”, “arruaceiros”, “revoltosos” (sic), nunca como insurgentes, patriotas, lutadores do povo. São os dois lados de uma luta que é de classes e uma dessas classes, a que domina política e economicamente a sociedade, impõe os seus pontos de vista à nação e ao povo, manipulando amplas massas e suas consciências.
A chefia de redação da Folha, Susana Singer, à época desse incidente, tentou justificar de forma absurda a linguagem adotada pelo jornalão paulista, dizendo o absurdo de que o jornal considera “terrorista” todos aqueles grupos armados que atacam civis indistintamente. Bem, se é assim, o jornal deveria ser coerente e chamar sempre o exército de Israel de “exército terrorista de Israel”, pois essa gente nada mais faz do que atacar civis inocentes, destruir e demolir casas de palestinos, matar crianças, velhos e mulheres de forma indistinta e amplamente condenados por grupos de direitos humanos e pela própria Organização das Nações Unidas.
Fanatismo
Como nos diz o professor Mohamed Habib, da Unicamp, há que se diferenciar, ainda assim, o chamado “fanatismo agressor e o defensor”, ou seja, entre aqueles que perpetram barbaridades contra os povos e os que simplesmente lutam para se defender dessas agressões[4]. Tempos atrás, o professor Jaime Pinsky, historiador da Unicamp, em entrevista para o Jornal da Unicamp, menciona a questão do crescimento do “fanatismo” religioso no Oriente Médio, associando a isso um possível “retrocesso” nessa região. Acusa os muçulmanos de serem fanáticos. A excelente resposta que o professor Habib lhe dá, merece de nossa parte, alguns comentários adicionais, ao qual sintetizamos:
Cresce nos EUA a direita fundamentalista cristã. Alguns usam a sigla wasp para designá-la (na sigla em inglês seria white anglo saxon protestant, brancos protestantes e de origem anglo-saxônica). São radicais, como atesta Armstrong. Incendeiam até clínicas onde são realizados abortos legais nos EUA. Thimoty Mac Veight, aquele que explodiu a sede do FBI em Oklahoma e matou quase 200 pessoas, era fundamentalista cristão, de extrema direita. Vejam o que prega o escritor norte americano Morgan Strong, quando elogia o reverendo Jerry Falwell: "Quando nos lançarmos à Guerra no Iraque, assim o faremos para invocar o Messias. É nisso que crêem os cristãos da direita. A batalha final para eliminar todos os não-crentes, não-cristãos, mais exatamente cristãos não-evangélicos, ocorrerá muito breve no Armagedon em Israel. Assim nos conta a Bíblia. O reverendo Jerry Falwell crê piamente e inequivocamente que devemos ir à guerra contra o Iraque a fim de desencadear os eventos cataclísmicos que assegurarão a segunda vinda de Jesus Cristo. A guerra contra o Iraque conduzirá ao fim do mundo que conhecemos. Deus reinará e Jerry Falwell sentar-se-á à sua direita" (sic);
A agressão ao Iraque pelos EUA, além de matar dezenas de milhares de civis e militares iraquianos desde março de 2003, quando da invasão americana, também praticamente varreu do mapa monumentos históricos da antiga Babilônia, patrimônio cultural da humanidade. Mas ninguém disso que isso era um fanatismo;
Quando certos setores da imprensa e da própria intelectualidade declaram que o Islã e até o profeta Maomé era um mal ou que personificava o próprio mal, não seria isso um sintoma de forte fanatismo?
Setores da direita cristã americana chegam a afirmar que o que Israel vem fazendo contra os palestinos e suas terras, na verdade nada mais seria do que a “recuperação de terras bíblicas históricas dos hebreus” (sic). Tal fundamentação deveria ser para que a tal “profecia bíblica” de unificar as terras de Israel, como etapa e condição para a vinda do messias, no caso Jesus, claro. Porque outro motivo seria a passividade completa de Bush em condenar as atitudes de Ariel Sharon e o genocídio que ele perpetra contra os palestinos?
Insistimos, com a mesma opinião do Prof. Habib: a questão no Oriente Médio não é religiosa, mas essencialmente política, significando na verdade uma nova colonização da região, especialmente um projeto do imperialismo americano. Mas, no passado recente, século XIX, isso se deu pelo imperialismo inglês e francês;
Será que a resistência à colonização e ocupação do território dos árabes pelos imperialistas será sempre terrorismo e fanatismo? Os que lutam são “terroristas”? O professor lembra, de forma muito interessante, que até mesmo Hitler, um fanático de extrema direita, chamava de “terroristas” franceses e italianos que resistiam à ocupação nazista;
Até Hannah Arendt é mencionada, quando fala que “a luta contra a opressão é a luta da memória contra o esquecimento”. E é isso que os palestinos e iraquianos fazem a todo momento;
Vejam o que disse o general Moshe Dayan, famoso durante a guerra dos Seis Dias (junho de 1967), sobre a memória dos árabes e palestinos: “Vimos para este país, que já era habitado pelos árabes, e estamos estabelecendo um estado judeu. Cidades israelenses foram construídas no lugar de cidades árabes. Vocês não sabem os nomes das cidades árabes e eu não os culpo por isso, pois não existem mais os antigos livros de geografia. Mas não apenas os livros que desapareceram, também cidades árabes não existem mais.” (jornal israelense Haaretz de 4 de abril de 1969). O que seria isso, senão genocídio de um povo? Mas Dayan é herói em Israel, e ninguém o chama de fanático. Só os palestinos o são?
Segundo levantamento feito pelo escritor de origem judaica, Meron Benvenisti, mais de 90% de 9 mil localidades, aldeias, cidades, povoados, rios, nomes de montanhas na Palestina em 1948, tinham nomes árabes e apenas 10% eram judaicos. No entanto, vendeu-se ao mundo de que aquelas terras eram “sem povo e que precisavam ser dadas a um povo sem terra” (sic). Assim, desde essa época tenta-se destruir vestígios da presença do povo palestino na região, que ainda hoje isso se materializa. É ou não genocídio? E reagir contra essas barbaridades é ser “fanático”?
Que o os EUA sustentam o estado sionista e discriminador de Israel, o mundo todo já sabia. No entanto, o economista Thomas Stauffer relata que, de 1973 a 2003, Israel recebeu, direto do tesouro americano, a imensa quantia de US1, 6 trilhão de dólares, quase três vezes o PIB brasileiro, para um estado onde vivem uma população com menos de cinco milhões de habitantes apenas! É para causar revolta no povo palestino ou não?
Porquê jovens tiram suas vidas?
Um dos grandes teóricos precursores da sociologia moderna, Emile Durkheim, francês (falecido em 1917), tratou do assunto “suicídio” em uma de suas grandes obras de referência. Em seus estudos, ainda hoje não superados, ele classificou os suicídios em três grandes tipos. A um deles chamou de suicídio “altruísta”, dizendo que quem age dessa forma o faz por um ideal mais elevado, por uma causa nobre. Não que a pessoa queira dar fim à sua vida, mas o faz pensando em uma causa que esta acima de sua individualidade e que ele reputa como importante. A história esta recheada de suicidas altruístas, desde Jesus Cristo, da lenda bíblica do início do cristianismo, passando pelos kamikazes da 2ª Guerra Mundial, entre outros. Morreram por uma causa, por um ideal.
Os casos mais recentes de atentados suicidas, os chamados homens-bomba, inovam em um aspecto, com relação ao altruísmo em geral: eles tiram as suas próprias vidas, mas levam dezenas e às vezes centenas de outras consigo (no caso, semelhantes aos kamikazes). É Uma forma de infligir em alvos que ele classifica como inimigos, uma dura derrota. Com isso, vem se criando um clima de quase pânico em determinadas regiões, especialmente nos territórios ocupados da Palestina e na cidade de Jerusalém. Já são dezenas de jovens (entre esses, nove mulheres), que deram suas vidas por uma causa. A mídia os chama de terroristas abertamente. É uma palavra que hoje faz parte do vocabulário cotidiano das pessoas. Apesar de não apoiar tais métodos, consigo compreender porque eles ocorrem. Um jovem palestino que viu seu pai ser preso, torturado e às vezes morto por tropas de Israel, que tem seus irmãos desempregados, que passa por extrema dificuldade, muitas vezes fome (fala-se que nos territórios ocupados come-se apenas azeitonas e pão e nada mais), que muitas vezes tem a sua própria casa demolida pelos famosos buldozzers (tratores da caterpilar americana), não vê outra perspectiva para a sua vida, que nada vale. Ou melhor: vale apenas para infligir uma derrota a um inimigo que o oprime. Dessa situação a juntar bananas de dinamite em seu corpo e se explodir em um mercado israelense é um pequeno passo. Muitas vezes esse jovem deixa gravada uma mensagem, para sua mãe, para sua família. Faz de seu corpo a sua única arma disponível.
Da nossa parte, tanto como sociólogo, como analista de política internacional, temos que procurar ver as causas, as raízes dessa situação, do porquê que ela acontece. Apesar da crueldade que as imagens mostram em ataques como os de Londres de 7 de julho, a mesma mídia não mostra a crueldade que as tropas israelenses fazem contra um povo oprimido na Palestina, ou mesmo com o que se esta fazendo com os povos do Iraque e do Afeganistão por tropas americanas e inglesas.
Um debate e duas visões
A própria reunião do G-8 na Escócia trataria do assunto, mais uma vez, que vem ocupando a pauta dos principais países ricos da terra. A questão que se coloca é: qual é a causa, a raiz desse tipo de atentado, chamado de terrorista? De um lado, temos os que afirmam que o terrorismo é gerado pela fome e a pobreza no mundo. De outro lado, existem os que afirmam que o terrorismo é gerado exatamente pelas ações dos países imperialistas com relação aos povos oprimidos. E, de ambos os lados, intelectuais saem a campo para opinar sobre o assunto.
A primeira versão do debate, de que a fome e a miséria podem gerar terrorismo não encontra guarida na história. No caso da Índia, da África e em certos períodos da própria China, presenciamos grandes surtos de fome e miséria, sem que se tenha visto grandes ações desse tipo. Na verdade, por trás dessa análise, tem uma certa tentativa de fazer um mea culpa pelos países ricos de sua omissão para ajudar os mais pobres e a forma como exploram essas nações. Já se fala inclusive em cancelar as “dívidas” de vários países africanos (que na verdade foram pagas diversas vezes). Fala-se em destinar até 50 bilhões de dólares nos próximos anos para combater a fome no mundo. De nada adiantará se medidas concretas para serem asseguradas liberdades democráticas, soberania e independência nacional a esses países não forem garantida. Tais recursos são apenas esmolas, migalhas, frente ao que se explora desses povos, ao que se rouba desses países e das riquezas que se transfere da periferia do sistema capitalista, para os países centrais.
Nós nos alinhamos à segunda corrente de análise sobre as causas e as raízes do chamado terrorismo. Elas se encontram na forma pelos quais os povos dos países explorados e ocupados militarmente pelas potências centrais são agredidos. Esta é a questão central e a causa do terrorismo. Enquanto os Estados Unidos e seu aliado incondicional, a Inglaterra, não desocuparem o Iraque, o Afeganistão, não desmontarem suas bases militares em todo o mundo, não revirem suas formas de tratar árabes e muçulmanos em todos os países, ações como a que presenciamos em Londres (e em março de 2004 na Espanha) vão continuar e são até inevitáveis, por mais que se ampliem os esquemas de segurança. Faço minhas as palavras do combativo escritor paquistanês radicado em Londres, Tariq Ali, quando diz “a principal causa da violência é a violência infligida contra os povos do mundo muçulmano. O bombardeio de pessoas inocentes é idêntica barbaridade em Cabul, Bagdá, Jenin, como em Nova York, Madri ou Londres. E, a menos que isso seja reconhecido, os horrores continuarão”[5]. Também o professor Murched Taha, da Unifesp, compara os atentados de Londres com a situação dos países do Oriente Médio[6]. Os ingleses puderem ver e sentir uma pequenina parte da dor, infinitamente menor, que os povos árabes e os muçulmanos sentem todos os dias, aos quais a mídia ocidental não consegue registrar (salvo em atentados onde morrem crianças). Parece estar havendo a banalização da morte nos países árabes e islâmicos. Parece que a dor de europeus e americanos é maior e mais importante do que a de árabes.
A questão que se levanta no momento, depois de todos esses ataques – que não vão parar – é se a política externa americana de combate ao terrorismo vem dando certo ou não. As pessoas em todos os países se indagam se o mundo esta mais seguro depois da invasão do Iraque em março de 2003. A resposta vem sendo um contundente não, na medida que a insegurança hoje ronda qualquer cidadão em qualquer parte do mundo. Pessoas hoje em Tóquio e Roma já esperam a qualquer momento um ataque, pois esses dois países ainda insistem em manter tropas no Iraque e apóiam a ocupação americana. Isso vai colocar cada vez mais em xeque a política externa americana e seu unilateralismo. E os números comprovam facilmente essa resposta. Só em 2004 o número de ataques terroristas passou de 175 (em 2003), para 650, mais que triplicou. Entre mortos, feridos e seqüestrados foram mais de 28 mil pessoas em todo o mundo[7]. Assim, depois de dois anos de ocupação, um gasto astronômico de mais de 200 bilhões de dólares, mais de 30 mil insurgentes iraquianos e quase dois mil soldados americanos mortos, a política americana se vê colocada em xeque. As táticas da resistência iraquiana e afegã se espalham pelo mundo afora e as capitais européias vão ficando cada dia mais inseguras, pois se esperam novos ataques a qualquer momento.
Um outro excelente artigo que demonstra a falência dessa política, especialmente na guerra das idéias, foi escrito por David Gardner, do jornal conservador londrino Financial Times[8]. A questão colocada é a dominação americana especialmente depois da 2ª Guerra mundial. Se bem que o imperialismo americano já vinha crescendo desde o final da 1ª Grande Guerra, ele se consolida mesmo é depois de 1945, com o declínio da Inglaterra, que passa a potência coadjuvante no cenário internacional (sendo a sua própria moeda, a libra, substituída nas trocas comerciais internacionais desde o ano anterior, nos acordos de Breton Woods nos EUA). O que se viu nesses 60 últimos anos foi a ocupação de países por parte dos Estados Unidos, derrubadas de governo, apoio a tiranias e ditaduras antipopulares, agentes da CIA matando ministros, derrubando governos, conspirando etc. Os Estados Unidos não sabem viver num mundo com diversidade cultural, vendo apenas a sua forma de viver e sua cultura como a melhor de todas. Bush chegou a dizer que os povos árabes e os países de religião islâmica não saberiam viver em uma democracia (sic). A secretária de Estado, Condolezza Rice chegou a afirmar recentemente no Cairo que os Estados Unidos haviam aprendido a lição dos últimos 60 anos, no sentido de que apoiar tiranias teria sido um erro. Mas, será mesmo que aprenderam a lição? Ao que tudo indica não, pois sua política externa deverá seguir unilateral e isolacionista, até que consigamos construir um mundo multipolar.
Um terrorista bíblico
Como a maioria dos nossos leitores ou são cristãos, ou muçulmanos ou mesmo judeus e particularmente estes últimos são os que mais temem os ataques hoje dos chamados homens-bomba, gostaria de lembrar uma pequena passagem bíblica, do Velho Testamento. Como todos sabem, o Velho Testamento cristão, da Bíblia, é um conjunto de livros judaicos, extraídos da Torá, livro sagrado dos judeus. Nele podemos encontrar coisas bonitas e interessantes.
Em um desses livros, chamado de Juízes[9], há uma passagem que relata o primeiro caso de terrorismo que se tem notícia, pelo menos do ponto de vista da lenda bíblica. E é um caso bastante parecido com o dos homens-bomba palestinos de hoje. Trata-se do famoso caso de Sansão, aquele cuja namorada se chamava Dalila, que lhe traiu cortando seus cabelos, fonte de seu poder.
Sansão era um líder hebreu (judeu), que vivia em terras dos filisteus (palestinos), no que hoje chamamos de Faixa de Gaza, fronteira com a Jordânia. Era uma espécie de príncipe hebreu. Ele fora capturado pelos filisteus, que o aprisionaram, cegaram-no e sua amada, Dalila, descobrindo que a fonte de sua força eram os cabelos e suas tranças, cortou-lhes uma certa noite, de forma que ele fora anulado completamente. Só após algum tempo, quando seu cabelo volta a crescer, mas ainda cego, Sansão recupera sua força.
Assim, numa certa manhã, ele é levado a um templo filisteu, onde se adorava o deus Dagom. Havia no templo mais de três mil pessoas, entre homens e mulheres e, sempre, segundo a lenda bíblica. Sansão fora exposto na presença dos líderes e príncipes filisteus. Num certo momento, pediu que, mesmo acorrentado e cego, fosse aproximado das colunas centrais do templo. Eis que, numa atitude que pegou de surpresa os palestinos presentes, Sansão afastou com seus braços as duas colunas centrais do templo, fazendo-o cair e destruindo-o completamente, matando homens e mulheres. Ou seja, ele deu a sua vida e levou consigo outras três mil, todos inocentes. Não apoiaríamos tal atitude se lá vivêssemos, mas se não soubermos compreendê-la nunca entenderemos as raízes do terrorismo moderno
Beijos
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2007-03-11 01:52:17
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