Olá, sou um espermatozóide. Estou dentro da trompa do lado direito de uma mulher. Deveria estar mais à frente, assim como meus colegas, seduzindo aquele que sempre foi a fonte dos meus sonhos mais secretos, na verdade, minha única razão de existir: o óvulo. Mas me falta algo, sou imperfeito, um espermatozóide especial. Apesar da minha fina estampa, sempre muito bem cuidada, não tenho os 23 cromossomos que iriam se fundir com os 23 do óvulo para formar uma célula e depois um embrião. Um defeito grave. Sem essa carga genética, nada feito. Não consigo conquistar um óvulo. Na verdade, pela triagem natural do organismo, eu nem deveria estar aqui. Mas dei um jeito. Ao chegar a este mundo, cheio de esperanças de alcançar minha musa, não saí desembestado como meus outros colegas, correndo o risco de ser logo descartado. Nããão. Desconfiado de que eu tinha algo de diferente, resolvi investigar o terreno, fiz amizades, escutei os mais velhos. Percebi que a vida não precisava se resumir a uma conquista. Encontrei outra razão para viver e seguir em frente: ser um personal lover, um conselheiro sentimental para orientar os coleguinhas.
Lá vem ela
Apesar dos tempos difíceis, arranjei trabalho logo de cara. No segmento amoroso, o campo é fértil e os casais estão sempre louquinhos para fazer bebês - um sinal de saúde em minha opinião. Então, entreguei-me à tarefa com entusiasmo, primeiro observando a chegada dela, gatíssima, no ovário direito, no 14o dia de um ciclo menstrual.
- Uau, fui lançada! Nem acredito que chegou a minha vez - berrou ela, toda assanhada.
Ela é ele no nome, o óvulo, mas vem do universo feminino, é mulher aqui pra nós. Pois bem, ela tinha acabado de passar pela ovulação, um processo que parece longo, mas que dura apenas poucos segundos. É o exato momento em que, no ovário, o óvulo rompe a casca do folículo, um saco protetor cheio de fluidos onde amadurece, e é lançado em direção ao começo da trompa ou tuba uterina. E que bom que assim foi com nossa amiga, pois fiquei sabendo de casos de meninas que erram a mira e vão parar na cavidade abdominal. Aí é preciso um pouco de mágica - que a trompa as atraia quimicamente, às vezes já fecundadas pelo espermatozóide.
Continuando, nossa assanhadíssima senhorita tem cerca de 24 horas (otimistas falam em 48) para ser fertilizada. Nesse período, fica nadando pela tuba uterina, em direção ao útero, com a ajuda de pequenos cílios e dos movimentos peristálticos. Ela aguarda...
- Ah, podemos mudar de assunto, parar de falar de mim? Essa história toda de ovulação, ser lançada, nadar, esperar me deixa muito ansiosa. Tenho verdadeiro horror de morrer solteirona. Quando o espermatozóide vai chegar?
Milhões de gametas masculinos
disputam o óvulo
Que multidão!
Está bem, vamos falar dos rapazes. Estão na uretra do homem, naquele papo de macho.
- Quero só ver o desempenho... Quem agüenta? Quem tem peito para chegar na menina? Eu me garanto, heim. E vocês?
- Garante o quê? Sem essa. Não viu o tamanho da multidão? Ouvi dizer que podem ter de 20 milhões a 800 milhões de colegas nesta jornada. É muita pretensão se achar o escolhido. Se é que vai ter um, né? E se dermos de cara com a camisinha?
O espermatozóide tem razão. Descartada a hipótese mais fatalista dele sobre a camisinha (já que o casal envolvido nesta história quer um bebê), pelas contas que fiz, descobri que apenas 4% do grupo lançado pela uretra consegue chegar perto do óvulo. Eles têm um árduo caminho a percorrer e, vamos encarar, a maioria vai sucumbir. E são somente 72 horas de vida no máximo. Em uma ejaculação, 5% são os espermatozóides. Os outros 95% são o sêmen, um fluido adocicado, muito necessário nessa grande quantidade porque protege e fornece energia aos gametas. E eles vão precisar. Têm pela frente a grande travessia da vagina, o colo do útero, o útero e a tuba uterina. São quase 18 centímetros, uma estradona para rapazes com apenas 0,05 milímetro, que caminham a uma velocidade média de...
Na largada
- Nossa, a saída é uma loucura! Nunca imaginei que a gente conseguisse chegar a essa velocidade de quase 16 centímetros por hora. Onde estamos?
- No canal vaginal.
- Só nós estamos, porque aquele grupinho que saiu junto com a gente ficou para trás...
É, a multidão começou a diminuir. São percalços da vida de um espermatozóide. Dada a largada, muitos escorrem para fora da vagina. Outros, sem o devido preparo para a corrida apaixonada de encontro ao óvulo, não suportam o ambiente ácido da vagina. Dizem que aqueles com cromossomo X, que geram meninas, se dão melhor nessa acidez que os portadores de Y, que resultam em meninos. Será por isso que há mais mulheres no Um desafio? vencer o muco, porta para o útero
mundo? Sei lá, especulação minha. Por outro lado, dizem também que certos espermatozóides são favorecidos nessa hora pelo orgasmo feminino. As contrações apressariam seu percurso para o útero. A verdade é que ninguém tem certeza sobre essas teorias, e o que interessa agora é outra coisa. Meus colegas precisam se preocupar em ultrapassar o muco, uma espécie de porta entre a vagina e o útero. Na maioria dos dias, esse muco é espesso e pegajoso, muito difícil de ser ultrapassado. No período fértil da mulher - cerca de quatro dias antes da ovulação e alguns dias depois -, ele fica mais ralo. A abertura do colo do útero também se alarga, o que facilita o trabalho.
- Ótimo, pessoal, entramos no colo do útero. Mas aqui também tem muco. Olhem que rápido aquele grupo ali na frente! Vamos atrás?
- Calma, muita calma nessa hora. O personal lover diz que essa tática nem sempre dá certo.
Com certeza, pois o muco tem mais duas funções. A primeira é a de selecionador. Ele elimina do jogo do amor os gametas muito pequenos, muito grandes, sem cauda ou com duas, sem cabeça, enfim, os desafortunados. Em uma ejaculação, nessa fase, apenas de 14% a 30% dos espermatozóides se mantêm na corrida. A eles se dirige a segunda função do muco, a de botar fogo, estimular a turma. É que nós temos um capuz e ele precisa ser quebrado para a conquista do óvulo. O muco nos dá essa capacidade desde que fiquemos um tempo em contato com ele. Por isso os espermatozóides muito apressadinhos podem se dar mal. Até avistam nossa menina primeiro - em cerca de 45 minutos, quando a maioria demora mais duas horas. Mas aí eles não têm força para tirar o chapéu e o esforço não resultará em nada. O ideal é aguardar um pouco no colo do útero. E é possível esperar numa boa. Há umas reentrâncias nas paredes e a gente fica protegido, aguardando os sinais para prosseguir. É o lado feminino que administra essa saída, em turnos. Mas não dá muita briga, não. A maioria de nós vai nos primeiros turnos. Afinal, como disse a mocinha antes, ela não quer dar muita chance para a vida de solteira.
Xi, dois caminhos
- Ufa! Estamos aqui há quase quatro horas. Finalmente, nosso grupo foi liberado. Cheguei a pensar que o personal lover tinha dado uma mancada com aquela história de a gente esperar para ganhar mais energia. Mas estou mesmo me sentindo vigoroso, apaixonado, pronto para um romance. Vamos lá! Subir em direção ao fundo do útero...
- Ei, mas olhem essa bifurcação no meio do caminho! Tem duas trompas! E agora?
A noiva tem dois
dias para encontrar
o noivo
Mais um obstáculo para os nossos heróis. O lado feminino organiza a saída, mas não está nem aí para sinalizar o caminho. E não há regras. Alguns espermatozóides vão para a trompa certa, onde está o óvulo. Outros, para a errada e ficam a ver navios. Simples assim. Já ouvi muito a expressão "começar com o pé direito". Deve servir para alguma coisa. No mínimo, para pensar duas vezes antes de tender à esquerda. Aconselhei o grupo a seguir pela trompa direita. Acertei na mosca!
- Ei, ei, estou vendo ela lá no fim!
- Não é estou vendo ela que se fala. Estou vendo-a, aprenda.
- Ah, está tentando me distrair, é? Espertinho...
- Tentando distrair-me, cara. É melhor assim.
- Não enche. Olha lá, que mulherão! Vou correr...
Mulherão mesmo. O óvulo é 16 vezes maior que o espermatozóide. E nosso grupo teve sorte de encontrá-lo, assim de primeira. Poderia ter chegado à trompa antes da noiva. Acontece e, aí, o jeito é dar um tempo e esperar o lance. Os espermatozóides podem aguardar uns três dias pelo óvulo, mas a mocinha só pode suspirar por eles uns dois dias. Colegas meus, europeus, descobriram o seguinte a esse respeito: casais que tinham de cinco a sete relações sexuais por semana engravidavam entre três e quatro meses. Quem mantinha de três a cinco aumentava o tempo para oito meses. E os casais que só transavam uma ou duas vezes na semana podiam demorar até dois anos para ter uma gravidez. Por isso, dizem, a dica para quem quer engravidar é uma só: transar bastante nos dias férteis. Meus colegas aconselham relações a cada dois dias para dar tudo certo.
2007-02-21 05:22:53
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answer #3
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answered by Ricardão 7
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