Sim, tanto que escrevi um trecho que dizia sobre a inocência:
"Tal como eu, algumas continuam crendo nisso até à maturidade e conservam em seus interiores as crianças que sempre foram. Outras, munidas do seu escudo autoprotetor, ocultam a capacidade de exteriorizar sentimentos singelos (não de forma ingênua, mas sem malÃcia), só para parecerem “adultas”. Aliás, raras pessoas expõem sua criança interior com naturalidade e coragem, como fez o poeta nascido em 1839 nas serranias de Friburgo, entre S. José e Rio Preto (hoje, municÃpio de São José do Vale do Rio Preto), o genial Casimiro de Abreu, autor de “Camila”, “Carolina”, “Camões e o Jaú”, “As Primaveras”, etc, falecido com apenas vinte e um anos de idade, em 1860. Em sua obra – uma rica coleção de poesias sentimentais - a simplicidade da forma admite a união do sentimento melancólico ao intenso e apaixonado, ora profundamente fervoroso e contido, ora veemente e arrojado. Casimiro (nome eslavo para “aquele que comanda a paz”, batizado Casimiro José Marques de Abreu), como outros poetas de seu tempo, adorava a vida boêmia, mas seu pai português queria coagi-lo a trabalhar no comércio, e antes de enviá-lo para Portugal, onde passou quatro anos (1853/1857), colocou-o para estudar em Friburgo como interno no colégio do inglês João Henrique Freese, desde os nove até os quinze anos (1847/1853). Ali, enternecido pela saudade do lar, compôs seus primeiros versos (que brota com espontaneidade na alma dos que se deixam inspirar em tudo que é belo). Aos vinte anos, antes de morrer tuberculoso, tomado pelo pessimismo, em seu último livro “As Primaveras” dedicou o prefácio a Francisco Octaviano de Almeida Rosa, nascido no Rio em 1825, deputado, senador e, acima disso, admirável poeta e autor do pungente poema “Ilusões da Vida” (aliás, declamado com toda excelência pelo sensÃvel e brilhante ator e amigo Osmar Prado), cujo texto antológico demonstra o peso do carma que todo homem verdadeiro é forçado a se submeter:
"Quem passou pela vida em branca nuvem,
E em plácido repouso adormeceu,
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu,
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu".
E assim, para ocultar o peso que trazia em seu jovem coração, Casimiro deixava-se levar pela leve fluidez de sua precocemente envelhecida alma, tal como denota o melancólico prefácio dedicado a Octaviano:
"Um dia, além dos Ãrgãos, na poética Friburgo, isolado dos meus companheiros de estudo, tive saudades da casa paterna e chorei. Era tarde; o crepúsculo descia sobre a crista das montanhas e a natureza como que se recolhia, para entoar o cântico da noite; as sombras estendiam-se pelo leito dos vales e o silêncio tornava mais solene a voz melancólica do cair das cachoeiras. Era a hora da merenda em nossa casa e pareceu-me ouvir o eco das risadas de minha mana pequena! As lagrimas correram e fiz os primeiros versos de minha vida, que intitulei: “Ave-Maria”. A saudade havia sido a minha primeira musa"... Ãs vezes, parece justificável que a palavra “Saudade” seja privilégio da lÃngua portuguesa (e inspire a percepção do nome em algum apaixonado por sua terra natal), talvez pelo sentimento nostálgico que só invade a alma dos que estão preparados para senti-la, o que não é intrÃnseco ou próprio do caráter de alguns povos, eis que orgulhoso em enaltecer a primeira musa, gerada na saudade do seio familiar, aflorada justamente na chamada “hora do anjo”, a beleza interior de Casimiro revela-se por sua transparência, e nem por isso o seu estandarte bárdico - enérgico e ao mesmo tempo sensÃvel – deixa de ser viril apenas por não agredir a ninguém, mesmo ao invocar com todo vigor o seu inocente (e, por isso mesmo, magnÃfico) menino interior, desde os seus idos “oito anos”:
“Oh que saudade que tenho da aurora de minha vida...”
Aliás, tentando aparentar machismo tolo, o singular no homem medroso é o receio de expor a sua parte sublime, dissimulando seu lado imaculado (como também é tÃpico de todo brasileiro covarde, imaginar-se mais “esperto” que os demais à sua volta), e ao referir-se à infância, prefere ocultar o seu menino inocente para exibir seu moleque interior, mais sagaz e malicioso, que associa Passárgada à BrasÃlia (ou outro lugar onde a desigualdade de oportunidades e o tráfico de influências é mais vantajoso), e acaba empunhando outro tipo de “Bandeira”, declamando:
“Vou m'imbora pra Passárgada. Lá sou amigo do Rei ...”
Antes de pregar lições de cunho polÃtico, consultei meu anjo interior para saber se deveria escrever que um adulto deve se comportar de forma esperta e sagaz, evitando ser “passado para trás” ou como um inocente menino, sem qualquer malÃcia, apenas confiante na ajuda divina, pelo que o anjo me instruiu sobre a seguinte passagem na vida do Mestre:
“Quem é o maior no reino dos céus?” - Perguntaram a Jesus.
Chamando um menino, pô-lo no meio dos discÃpulos e disse:
“Na verdade vos digo que, se vos não converterdes e vos não tornardes como meninos, não entrareis no reino dos céus” (Mateus, 18). e como a narrativa é sobre os costumes, que encerram lei moral, esclareço que seja menino ou moleque, menina ou sapeca (conforme a natureza patiens ou agitatore de cada criança, onde a primeira sofre ou recebe impressões das travessuras geradas pela segunda), tanto o meio sócio-familiar como o geográfico-cultural em que são criados influem na formação e colaboram para construção da personalidade que o ser humano precisa conviver e carregar até a última morada, e assim, quando os costumes sadios são freqüentemente lembrados com carinho, deve-se tentar passá-los aos filhos e netos para que sejam eternizados, de forma que sejam manifestados como valores a serem incentivados.
2007-01-31 17:53:34
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answer #7
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answered by Origem9Ω 6
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