IMPORTÃNCIA DA PIPOCA NO CINEMA MUNDIAL
Os comedores de pipoca estão em toda a parte. Não se pode fugir deles, nem vencê-los. Já pensou em se juntar a eles?
por Fernando de Castro Américo (fercastro@netcabo.pt)
cena é conhecida e faz parte de uma lei de Murphy da sétima arte: no exato momento em que descobrimos o verdadeiro sentido da existência do protagonista (“Rosebud...”); no preciso instante em que o herói confronta seu nêmesis e descobre que está intrinsecamente ligado a ele (“Luke, eu sou seu pai!”); no intervalo milimétrico do jogo entre a vida e a morte em que a heroÃna balança (“…sempre as horas”), o espectador ao nosso lado vai, com certeza, se aproveitar do anonimato proporcionado pelo escuro do cinema para mastigar uma pipoca. Crunch!
Podemos dividir o público de cinema entre aqueles que se entregam sofregamente ao sabor de uma boa pipoca enquanto assistem a um filme e aqueles que maldizem o dia em que Colombo levou para a Europa a primeira espiga de milho, dando origem à invasão dos “bárbaros” que teimam em cair na heresia de renunciar por segundos ao prazer estético para se entregar aos prazeres da carne – ou, no caso, prazeres do grão…
Esta divisão entre amantes e inimigos da pipoca até mesmo nos conduz a outras divisões, mais profundas e até mesmo mais filosóficas: entre diversão e reflexão, entre cinema-indústria e cinema de autor, entre entretenimento com e minúsculo e Arte com A maiúsculo. E, por incrÃvel que pareça, todas elas têm uma coisa em comum: não significam absolutamente nada.
Na verdade, a pipoca é mais antiga que a teoria do Cinema de Autor, inventada pelos crÃticos dos Cahiers do Cinema nos anos 50. A pipoca, aliás, é mais antiga que qualquer cinema: os Ãndios americanos já sabiam como despoletar a explosiva quÃmica do milho através de panelas cheias de areia quente. No entanto, todos temos a tendência de acreditar na divisão entre diversão e arte que a pipoca no cinema representa. Por quê?
O próprio François Truffaut, um dos mais raivosos crÃticos franceses e um dos pilares do cinema engajado, joga por terra toda esta briga entre comércio e arte ao dizer em um de seus livros mais famosos, Os Filmes da Minha Vida, que qualquer filme é, ao mesmo tempo, diversão e reflexão.
Ou seja…Independence Day, além de uma aventura descerebrada de tirar o fôlego, é também um tratado sobre a psique americana em tempos de guerra. E O Sétimo Selo, de Ingmar Bergman, não é apenas uma investigação sobre a finitude da existência: é também uma história de suspense, onde até o final, roemos as unhas para saber se o Cavaleiro vai vencer a Morte no jogo de xadrez.
Assim, a pipoca está para ambos assim como a tela grande está para o escuro. Ela faz parte do ritual do cinema, porque, mais que um alimento, a pipoca é um sÃmbolo. E o significado deste sÃmbolo é tão fugaz e necessário quanto seu sabor: em última instância, a pipoca nossa de cada sessão representa o prazer do cinema. Um prazer que se manifesta sob várias formas: temos prazer em rir de uma comédia, prazer em sentir medo de um filme de terror, prazer de descobrir uma verdade num drama existencialista, e por que não, prazer de sofrer com uma personagem de uma obra de cunho social (o cinéfilo é, à s vezes, um verdadeiro masoquista).
Por isso, da próxima vez em que um desavisado não controlar as suas mandÃbulas e mastigar uma pipoca do seu lado, pense que ele está mantendo viva a tradição do ritual do cinema, assim como você. Afinal, comer pipoca em casa sozinho, em frente a um DVD, pode ser tecnologica e politicamente correto… mas não tem graça nenhuma.
2007-01-16 01:42:04
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answer #2
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answered by Denise T 2
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