Para Roger Chartier, o historiador interpreta os artefactos,
objectos históricos de análise, num campo onde se cruzam duas linhas: uma vertical, ou diacrónica, pela qual os historiador estabelece a relação de um texto ou de um sistema de pensamento com manifestações anteriores no mesmo ramo de actividade cultural; a outra é horizontal ou sincrónica, e através dela determina a relação do objecto cultural com o que vai surgindo noutros aspectos de uma cultura.
Roger Chartier tem uma posição bastante clara e comunga com a nova maneira de fazer história iniciada pela escola dos
Annales."Desembaraçando-se das etiquetas que pretendendo identificar os pensamentos antigos, os marcaram na realidade, a tarefa dos historiadores do movimento intelectual(como escreve Febre) é acima de tudo reencontrar a originalidade irredutível a qualquer definição à priori, de cada sistema de pensamento, na sua complexidade e nas suas mudanças"[(1) Roger Chartier, obra citada na bibliografia, p.33]. A dicotomia esquemática proposta pelos historiadores românticos não tem lugar dentro deste novo conceito de fazer história, assim como qualquer outro exemplo de oposição rígida torna-se ridículo face a esta concepção nova dos historiadores dos Annales; concepção reafirmada pela actual definição de História Cultural que coloca a posição do historiador perante os artefactos históricos.
2006-12-04 23:04:17
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answer #1
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answered by APRENDIZ DE Y!R 5
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não sei se é isso que tu procuras...mas vai la...bj.
CHARTIER, Roger.CrÃtica Textual e História Cultural: o texto e a voz, séculos XVI-XVII. Trad. Celene Margarida Cruz e João Wanderley Geraldi. Revista Semestral da Associação de Leitura do Brasil: Campinas, São Paulo, n. 30, dez. 1997.
Nesse artigo, Roger Chartier, estudioso da história sóciocultural defende que a análise do texto literário, enquanto objeto essencial da história literária e da crÃtica textual, pauta-se no processo pelo qual leitores de obras escritas, espectadores de textos encenados e ouvintes de textos orais dão sentido aos textos de que se apropriam.
Chartier afirma que, na história das literaturas, analisar textos literários ou emitir uma crÃtica textual ancorada no processo pelo qual os leitores dão sentido aos textos lidos não se traduz em abordagem nova, esta nasceu em oposição ao estreito formalismo da Nova CrÃtica, ou do New Criticism, que considerava a frieza, a impessoalidade da linguagem, sustentada na interpretação soberana do crÃtico literário.
Roger Chartier considera importante que o crÃtico literário não só analise a obra sob o ponto de vista técnico de leitor competente, verificando apenas o funcionamento automático e impessoal da escrita, mas passe também a considerar os aspectos que implicam a interpretação de sentido que cada leitor faz de um texto.
Assim, o autor aborda a questão da produção de sentido, ora como uma relação dialógica entre proposições das obras e as categorias estéticas interpretativas de seus públicos, ora como uma dinâmica interação entre o escrito e quem dele se apropria (leitor), ou na perspectiva de “negociação” entre obras, discursos ou práticas de leitura, o que representam ao mesmo tempo as maneiras de entender os textos.
Para Chartier, o importante na história da leitura é pensar na distância que há entre o sentido atribuÃdo pelo seu autor e seu leitor, ou seja, que o mesmo texto escrito, encenado ou lido, não tem o mesmo significado para os diferentes leitores que dele se apropriam. A interpretação de sentido pode ser uma ou outra, dependendo do suporte em que as letras estão fixadas; dos diferentes públicos, com seus gostos, suas tradições; ou da comunidade a que pertencem. Assim, Chartier estabelece uma relação entre a forma (suporte da escrita) e o sentido (interpretação) de um texto.
A mesma obra pode possuir públicos diferentes e inúmeras possibilidades de interpretação. Ele cita por exemplo que algumas comédias de Molière, apresentadas em festas da corte em Versalhes, representavam para esse público divertimento e prazer, no entanto, o público do teatro do Palácio Real, que assistia à mesma comédia sem os cantos, as músicas e as danças, não interpretava o texto da mesma forma que o público anterior era diferente ainda da interpretação dada pelo público dos textos impressos e veiculados, pois uma coisa é ver a comédia e outra é ler a comédia. Nesse exemplo, temos o mesmo texto, três públicos diferentes e diversas possibilidades de interpretações de sentido.
Uma outra questão a ser considerada é a da “recepção” ou uma “resposta”, advinda da “abstração” e da universalização da leitura com que operam implicitamente. A leitura possui uma história social e cultural e, de acordo com as capacidades, códigos e convenções de leitura próprias à s diferentes comunidades de leitores, o mesmo texto muda seu sentido. Para melhor compreensão, cito as palavras: “Interrogar-se sobre as condições de possibilidades da leitura é interrogar-se sobre as condições sociais de possibilidades das situações nas quais se lê” (Chartier, Revista ALB, n. 30, 1997).
Em outras palavras: remontar uma história da leitura e dos gêneros é considerar as diferentes apropriações dos textos, considerando o “mundo do texto” e o “mundo do leitor”, o que significa pensar, de um lado, em seu autor e, de outro, no leitor, imerso na sua comunidade de interpretação.
São importantes numa obra, a época a que esta faz referência, uma vez que a escrita é datada, fixa em seu tempo e espaço, e, ainda, as coerções exercidas pela instituição, pelo patrocÃnio ou pelo mercado que muitas vezes solicita ao autor modificações para atender determinados interesses, o espaço que o autor teve para escrever (economia da escrita) entre outros aspectos.
Chartier chama a atenção para uma questão mais técnica e mais especÃfica, a pontuação dos textos. Afirma que a pontuação dada a um texto para ser oralizado se diferencia da pontuação gramatical, ou seja, uma obra escrita para ser encenada recebe as pausas e as interferências necessárias, enquanto que a mesma obra, se escrita para atender a um outro público teria uma pontuação necessária a outro tipo de texto.
Destaca Chartier que muitas vezes o revisor de texto, na expectativa de colocar à disposição do leitor um texto com as pontuações verdadeiramente corretas, interfere nas concepções do autor.
Portanto, Chartier destaca a importância de considerar as diversas implicações a que a materialidade e a modalidade de uma obra estão sujeitas.
Recomendo a leitura desse artigo de Roger Chartier para quem desempenha o papel de crÃtico literário, pois nesse trabalho o autor alerta para mais alguns fatores a serem considerados no momento da análise de uma obra. O crÃtico literário, por sua vez, é um leitor competente, no entanto se faz necessário que, em sua leitura solitária, considere o leitor menos hábil, aquele que irá ter contato com o escrito. E que aquela obra possivelmente passou por diversos crivos, a saber: de seu autor, seu editor, seu revisor, talvez até de um patrocinador e outros envolvidos. Diante disso, entre o autor e o editor pode haver uma distância pensável, uma vez que um texto pode sofrer alterações de sentido dadas pelo seu autor, antes mesmo de a obra ser publicada e por último, considerar a interpretação de sentido que cada leitor, imerso em sua cultura e sua comunidade de leitores, atribuirá à s mesmas palavras escritas.
Assim, quem exerce o papel de crÃtico literário poderá considerar em sua análise todos os fatores pertinentes à interpretação de sentido de um texto.
2006-12-05 11:19:05
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answer #2
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answered by eu Amabile 7
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