No problema do conhecimento, podemos distinguir vários elementos que se sobrepõem e se completam. Dentre eles, o mais discutível, e ao mesmo tempo o mais fascinante, é o problema do significado e do significante.
Um determinado objeto, através de um processo de adequação (homem e objeto) torna-se conhecido. Entretanto o conhecimento não demanda unicamente a apreensão de uma determinada realidade ou objeto; necessário se faz que esta realidade, ou este objeto seja apreendido de uma determinada maneira, consoante um determinado processo de análise e síntese.
Não caberia aqui distinguir os diversos modos de conhecimento, nem mesmo, o que é assunto árduo, difícil, e mesmo arriscado, diferir entre o conhecimento intuitivo e o discursivo. Entretanto, como premissa que nos é fundamental, teremos que reconhecer uma diferenciação entre estas duas formas. Sucintamente, poderemos admitir, o conhecimento intuitivo se faz tendo em vista as condição para que ele se processe, imediatamente, frente a uma determinada realidade ou objeto, ao passo que o discursivo requereria que de algo conhecido passássemos, através de uma série de juízos, à apreensão do ainda não apreendido.
A um chamaríamos analítico (conhecimento discursivo), ao outro, sintético (conhecimento intuitivo).
O processo do conhecimento não se dá, contudo, simplesmente como um processo de adequação da mente humana ao objeto. Impõe-se que inerente ao processo cognoscitivo haja um significado. Uma relação de significado em que o homem opera como ser significante e o objeto como ser significado. Desta forma diferiríamos: o conhecimento não se processa entre coisas a-históricas, mas em relação espacial e temporal, que exige, que tem necessidade, para que a interação homem/objeto, ou então, homem/realidade se estabeleça, de que haja algo maior, alguma coisa além de ambos, não causal, mas grandemente essencial.
Destarte, lembremo-nos que o homem não só se encontra ainda em um processo evolutivo, como é senhor deste processo. É um ser colocado no tempo e no espaço, "hic et nunc", bem como estabelece relação com o mundo que o cerca da mesma forma, sendo imprescindível que enfoquemos o processo cognoscitivo como algo colocado também dentro de uma dimensão que é a mesma do homem, historicamente considerado.
Devemos ainda ter como pressuposto que a natureza é fluída, encontra-se em um constante devir. Isto nos levaria, em análises mais profundas, a discutir mesmo a grande questão entre Heráclito e Parmênides, quanto ao movimento das coisas, quanto à fluidez do mundo. Encontraremos ainda no marxismo a grande questão, colocada por Engels sobre a dialética da natureza. Natureza, como tal, é dinâmica, como dinâmico seu processo mutativo.
É entre objeto, constantemente mutável e o homem, ser de evolução continuada, que evoluiu dentre de um processo social de que é senhor, que se coloca o problema do conhecimento. E dentro deste, aquele de que nos devemos preocupar: o problema do significado e do significante, dentro do processo do conhecimento, parte integrante e imprescindível do mesmo.
O ponto de que partimos é colocado muito bem por J.v.Uexkül. Dependendo a utilização de um determinado objeto o homem o conhece de uma determinada forma, o processo se verifica de uma determinada forma, de um prisma diferente.
É facilmente inferível ao que isto nos conduz. À impossibilidade de que se penetre na essência das coisas, na impossibilidade de atingirmos o ser global, o ser total, em toda a sua essência, à impossibilidade de analisar o ser como ele é. Pura e simplesmente podemos conhecer o ser como ele nos parece, em um determinado tempo, dentro de uma determinada realidade.
Entretanto, argumentar-se-á, ainda não está provada a importância do significado e do ser significante dentro do processo do conhecimento, com o que concordamos. Entretanto não é difícil fazê-lo. Mesmo porque de certa forma é quase que meridiana a sua importância.
O homem chega a conhecer um determinado objeto. Entretanto, no conhecimento do mesmo interfere uma série de questões; dentre elas temos (como já foi dito) a historicidade do homem. Indiscutível é o papel da ação do meio sobre o homem. Este homem, amalgamado por este meio e por um processo de formação (como ser histórico) não é um ser destituído de escalas de valores; não é destituído de preconceitos, não é destituído de pré-análises, não é destituído de condicionamentos. E é nisto que incide, justamente, a problema do conhecimento: como o homem, ser com todas estas características poderá vir a conhecer realmente o mundo que o cerca, e a partir daí lhe dar um sentido, ou mesmo, achar o seu sentido e seu papel dentro deste complexo todo?
Ora, é uma quimera tentar conhecer realmente. Porque este "realmente" é o significado que em um determinado momento uma determinada realidade tem para o indivíduo. E aqui retomamos um dos pontos que já coloquei no início: a diferenciação entre dois tipos de conhecimento. É justamente no conhecimento intuitivo que o problema reveste foros de maior importância. Na experiência estética (emoção estética) por exemplo, verificamos uma forma de conhecimento, uma forma de interação homem e objeto, em que pode não influir o processo discursivo de conhecimento. Entretanto, dentro deste contexto, mesmo neste caso deixa o homem de ser um ser formado? Não, de forma alguma, mesmo se dando este conhecimento em um nível superior, instantaneamente, sem um processo de elaboração discursiva, é ele condicionado pela historicidade do ser cognoscente. E dentro desta limitação sempre se processa a interação homem/objeto. Na esfera dos sentimentos e das paixões, determinados fatos que corriqueiramente passam desapercebidos, olhados, mas não vistos, passam a sê-lo. Por que? Por um dom divino? De forma alguma. É que naquele específico momento aquela determinada realidade tem um significado, que não é inerente, mas que, ao contrário, exige que um ser lhe dê. E este só pode ser e é o homem, que no caso é o ser significante.
Ampliando estes considerandos, chegaríamos a outro ponto de polêmica. Possuirá o mundo, o processo vital da humanidade em sua historicidade, um significado inerente, não possuirá absolutamente significado algum, ou ainda, possui um significado dado?
É evidente ao que as considerações acima colocadas nos levarão, dentro de uma coerência de pensamento. A que o mundo em si não possui significado imanente, mas que este significado lhe é dado pelo homem. Sendo correto, e reconhecido, que o homem evolui ainda, não entendendo apenas o sentido biológico do termo, sendo correto que o homem continua sua evolução em uma escala qualitativamente superior, enquanto ser social, sendo esta evolução social, não individual, o próprio sentido do processo de desenvolvimento da sociedade é dotado de um significado por aquele que não só sabe, não só evolui, mas que sabe que sabe, que evolui e pode ser senhor deste processo (evolutivo). Mas ao mesmo tempo este conhecimento, este significado dado, não se dá a-historicamente, mas sim dentro das limitações que o próprio homem deflagra.
E o que seria o determinismo senão um princípio de causa e efeito? Dadas determinadas causas, deflagrados determinados processos, não se seguiriam em grande número de casos, na maioria, ou na totalidade deles, determinados efeitos? Mas isto longe de ser argumento contra o fato de ser o homem o significante da evolução social, vem ao seu encontro, já porque é o homem que deflagra as causas, já porque é ele que historicamente pode modificar os seus efeitos, imprimindo ao processo nova direção.
Considerações acerca do processo de interação entre o ser significado e seu significante.
Como se processa, quer no caso isolado da interação entre homem e objeto, quer no caso de todo o processo cósmico, e mesmo na cosmovisão necessária ao homem, a relação entre significado e significante?
Inicialmente temos que considerar como dado certo que o homem é um ser significante. A partir daí, podemos concluir que a própria escala de valores dentro da qual um sistema ético é constituído, dentro dos quais uma sociedade vive, é parte integrante do significado dado ao mundo pelo homem. De onde decorre que dentro de uma interação significado-significante existem elementos de transformação, elementos dinâmicos.
Senão, vejamos. O processo de significação seria algo estático, como uma forma de contemplação especial? De forma alguma; seria ao contrário uma perspectiva para a mudança, para as transformações. Como no caso específico do habitat do homem. Como podemos reparar, o homem não possui um habitat natural, mas é um ser que faz seu habitat. Desta forma, através de um significado dado pelo homem à natureza, como ação oposta à natureza sobre o homem, este, dentro de um significado de utilização que lhe empresta, atua sobre ela, em um processo de transformação.
A relação, portanto, entre significante e significado não é de forma alguma estática, mas dinâmica e sobretudo dialética. Assim, podemos diferir diversas formas de significados emprestados pelo homem ou ao contexto social, ou ao mundo que o cerca, ou na elaboração de uma cosmovisão, ou ainda no surgimento de sistemas éticos, de utopias, etc.
Poderíamos mesmo radicalmente afirmar que (ressalvada a admissão de que o problema é muito mais complexo) é o principal problema para todas as filosofias e para a compreensão do processo histórico.
Entretanto, em atuando sobre o meio dentro de uma perspectiva de coisificação significante, o homem dá origem a processos que pode não mais controlar. Ainda mais que o homem na atual etapa da evolução social não atua (teria atuado jamais?) como ser isolado, mas as grandes transformações, e as grandes causas, são deflagradas pelo coletivo, com a participação social de cada um.
Os resultados podem não ser positivos. E para sua transformação necessário será que novamente, através de uma reação ao status (quo) imprima o homem, enquanto parcela do coletivo, novas causas de transformação para atingir um significado dado por um conjunto de homens à história, aos processos sociais.
De outro lado, através da relação estabelecida entre as duas partes (significado e significante) encontraremos uma das causas de conotações. A uma paisagem dar-se-á, em um determinado momento, a conotação de belo. Entretanto (e muitos psicólogos trataram exaustivamente da matéria) poder-se-á dar a significação de mudança.
Assim um rio poderá ser belo, poderá ser um potencial de energia, um meio de transporte, um meio de pesca, mas não é especificamente nada disto, senão potencialmente; não é nada disto per si; necessita que um ser que se torna seu significante lhe dê significado.
ok
2006-11-07 06:04:45
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answer #7
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answered by M.M 7
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