Direito internacional privado (DIPr) é o conjunto de normas jurídicas criado por uma autoridade política autônoma (um Estado nacional ou uma sua província que disponha de uma ordem jurídica autônoma) com o propósito de resolver os conflitos de leis no espaço.
Em termos simples, o DIPr é um conjunto de regras de direito interno que indica ao juiz local que lei – se a do foro ou a estrangeira; ou dentre duas estrangeiras - deverá ser aplicada a um caso (geralmente privado) que tenha relação com mais de um país.
A possibilidade de o juiz de um país (“juiz do foro”) aplicar lei estrangeira decorre da necessidade de se reconhecer fatos e atos jurídicos constituídos em outros países e cuja negação pelo juiz do foro causaria uma injustiça. Por exemplo, o DIPr brasileiro dispõe que a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre a capacidade: esta regra específica foi estabelecida pelo direito brasileiro para evitar, dentre outros problemas, que uma pessoa domiciliada num país estrangeiro e reconhecida ali como maior de idade venha a ser considerada menor de idade no Brasil (caso a lei brasileira e a estrangeira divirjam nesse particular – um “conflito de leis”), o que seria inconveniente e injusto. Este é apenas um exemplo do conjunto de regras que o Brasil criou para evitar conflitos semelhantes. Da mesma maneira que o Brasil, cada Estado nacional possui o seu DIPr, com regras não necessariamente uniformes.
Ao estudo dos conflitos de leis no espaço, muitos juristas acrescentam no escopo do DIPr as normas de direito interno referentes ao conflito de jurisdições, à nacionalidade e à condição jurídica do estrangeiro.
Objetivo da norma de DIPr (Numa definição estrita, o DIPr compreende apenas as normas de solução dos conflitos de leis no espaço. Muitos estudiosos, porém, entendem que as regras de direito referentes a nacionalidade, conflito de jurisdições e condição jurídica do estrangeiro também integram o objeto do DIPr.)
*Conflito de leis no espaço
*Elementos de conexão
*Nacionalidade
*Conflito de jurisdições
*Condição jurídica do estrangeiro
Explicando um por um:
Conflito de leis no espaço
Entende-se como conflito de leis no espaço qualquer relação humana ligada a duas ou mais ordens jurídicas cujas normas não são coincidentes. O juiz ou o intérprete da lei, diante de um caso de conflito de leis no espaço, assiste portanto à concorrência de duas ou mais leis - produzidas por países (ou províncias) diferentes - sobre a mesma questão jurídica.
A dúvida sobre qual direito (o nacional ou o estrangeiro; ou um dentre dois ou mais direitos estrangeiros) aplicar a um caso concreto envolvendo estrangeiros nasce da circulação de pessoas e coisas no espaço, de um lado, e, de outro, da proliferação de ordens jurídicas nacionais - e, em alguns casos, provinciais ou estaduais - autônomas que procuram regular, cada uma a seu modo, as mesmas situações jurídicas. Sendo impossíveis as soluções mais simplistas para o problema (a supressão do intercâmbio humano além-fronteiras ou a uniformização legislativa mundial), cabe ao juiz ou ao intérprete resolver o eventual conflito que se lhe apresente por meio da escolha dentre uma das leis concorrentes.
Tal escolha é efetuada com base em regras pré-estabelecidas, cujo conjunto constitui o DIPr.
Na imensa maioria dos casos, apenas uma ordem jurídica rege os fatos e atos jurídicos em um determinado local. Por exemplo, um contrato celebrado em São Paulo, Brasil, provavelmente terá sido assinado por brasileiros residentes no Brasil, e seus efeitos serão produzidos em território brasileiro, razão pela qual ele é regido pela lei brasileira. Mas ocorre às vezes que um fato ou ato jurídico (no exemplo, o contrato) tem relação com mais de uma ordem jurídica. Ainda no mesmo exemplo, seria o caso de um contrato assinado entre um brasileiro e um escocês, ou destinado a produzir efeitos no estado da Califórnia, EUA.
Dentre estes casos, há algumas situações especiais, em que o intérprete da lei (advogado, juiz ou outro) depara com um fato ou ato jurídico ligado a duas ou mais ordens jurídicas autônomas cujas normas, aplicáveis ao caso (no exemplo, o contrato), são divergentes - um conflito de leis no espaço. Retomando o exemplo, um contrato assinado entre um escocês de 17 anos de idade, domiciliado na Escócia, e um brasileiro de 18 anos é motivo de litígio em juízo no Brasil. O brasileiro, que deseja anular o contrato, argumenta que o escocês é menor de idade, pois a capacidade jurídica plena no Brasil começa aos 18 anos; o escocês, em sua defesa, alega que a maioridade na Escócia começa aos 16 anos e que é esta lei (a escocesa) que o juiz deve aplicar para determinar a sua capacidade jurídica. Nestes termos, o juiz brasileiro acolherá a alegação do escocês. Por quê?
Confrontado com um caso ligado a duas ordens jurídicas diferentes, o juiz consultará o DIPr brasileiro. Este, contido em grande parte na Lei de Introdução ao Código Civil (LICC), dispõe que a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre a capacidade. Assim sendo, e considerando que o escocês do exemplo é domiciliado na Escócia, quem define, para o juiz brasileiro, a capacidade jurídica daquele cidadão escocês é a lei escocesa. Está solucionado, mediante as regras do DIPr brasileiro, um caso de conflito de leis no espaço (entre a brasileira e a escocesa) com que deparava um juiz brasileiro.
A aplicação do DIPr a um caso concreto ocorre por meio de três conceitos: o de "categoria de relações jurídicas" (ou "qualificação"), o de "elemento de conexão" e o de "lei competente". Por exemplo, o DIPr brasileiro dispõe que "para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que constituírem". Um juiz brasileiro que tenha em mãos um caso de conflito de leis sobre um contrato celebrado na França se perguntara, em primeiro lugar, qual a categoria de relações jurídicas (no caso, trata-se de obrigações – um contrato); em segundo lugar, qual o elemento de conexão que o DIPr brasileiro manda usar para reger as obrigações (é a lei do lugar onde se constituíram – a França); concluirá então que a lei competente para reger o contrato do exemplo é a francesa.
Embora a imensa maioria dos casos de DIPr diga respeito a questões de direito privado (família, sucessões, obrigações, personalidade e capacidade etc.), alguns juristas entendem que o DIPr pode aplicar-se também a questões de direito público.
Elementos de conexão
Os elementos de conexão constituem-se na chave para solucionar os conflitos de leis no espaço. As diversas legislações nacionais de DIPr organizam-se, via de regra, em torno daqueles, que apontam a lei competente para solucionar os conflitos. Valladão define-os como certas circunstâncias diretamente ligadas ao caso, usadas pela norma de DIPr para indicar a lei competente
Valladão classifica os elementos de conexão em:
* reais: a situação da coisa, o lugar do ato ou fato, o lugar do contrato ou de sua execução, o lugar da origem ou nascimento, o lugar do domicílio;
* pessoais: a nacionalidade, a religião, a tribo, a raça, a vontade; e
* institucionais: o pavilhão ou a matrícula de navio ou aeronave, o foro (i.e., a autoridade que conhece do caso).
Outro exemplo de classificação é a doutrina francesa (são, a rigor, "regras de conexão", pois já indicam o elemento e a lei competente):
* o estatuto pessoal é regido pela lei nacional;
* o estatuto real é regido pela lei da situação dos bens; e
* os fatos e atos jurídicos são regidos pela lei do local de sua ocorrência ou pela da escolha das partes.
São exemplos de regras de conexão (enunciadas tradicionalmente em latim):
* lex patriae: lei da nacionalidade da pessoa física;
* lex domicilii: lei do domicílio;
* lex loci actus e locus regit actus: lei do local da realização do ato jurídico;
* lex loci contractus: lei da celebração do contrato;
* lex loci solutionis: lei do local onde a obrigação ou o contrato deve ser cumprido;
* lex voluntatis: lei de escolha dos contratantes;
* lex loci delicti: lei do lugar onde o ato ilícito foi cometido;
* lex rei sitae: lei do local em que a coisa se encontra;
* mobilia sequuntur personam: lei do local onde se encontra o proprietário (para bens móveis);
* lex loci celebrationis: a lei do local da celebração rege as formalidades do casamento;
* lex monetae: lei do local em cuja moeda a dívida está expressa;
* lex loci executionis: lei do local onde se procede à execução forçada de uma obrigação;
* lex fori: lei do local onde corre a ação judicial.
Dentre as regras de conexão acima, cada país escolhe as que melhor lhes convêm para compor o DIPr nacional. Por exemplo, o DIPr brasileiro elegeu a lex domicilii para reger o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família; outros países preferem a lex patriae. O Brasil emprega a lex rei sitae para reger os bens; outros Estados podem recorrer à mobilia sequuntur personam.
Nacionalidade:
O estudo da nacionalidade é de grande importância para o DIPr, já que o tema é um dos elementos de conexão utilizados por diversos países para resolver conflitos de leis no espaço referentes ao estatuto pessoal (personalidade, capacidade etc.).
Nacionalidade é o vínculo jurídico de direito público interno entre uma pessoa e um Estado. A nacionalidade pressupõe que a pessoa goze de determinados direitos frente ao Estado de que é nacional, como o direito de residir e trabalhar no território do Estado, o direito de votar e ser votado (este, conhecido como cidadania), o direito de não ser expulso ou extraditado e o direito à proteção do Estado (inclusive a proteção diplomática e a assistência consular, quando o nacional se encontra no exterior), dentre outros.
A verificação da nacionalidade de uma pessoa permite distinguir entre nacionais e estrangeiros, que têm direitos diferentes. Ademais, a determinação da nacionalidade da pessoa é imprescindível ao DIPr, tendo em vista que alguns Estados adotam o critério da nacionalidade (lex patriae) para reger o estatuto pessoal.
Conflito de jurisdições
Condição jurídica do estrangeiro
Em princípio, a lei brasileira deve ser aplicada a todos os brasileiros e estrangeiros que se encontrem em território brasileiro (regra da territorialidade).
Processos que envolvam estrangeiros são de competência de autoridade judiciária brasileira, quando o réu for domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação ou pena (Artigo 11 do CC). Da mesma maneira, só à autoridade brasileira compete conhecer sobre as ações relativas a imóveis situados no Brasil. Poderá, contudo, cumprir solicitações de autoridade estrangeira competente pelas chamadas cartas rogatórias (por exemplo: num processo judicial na Alemanha, o juiz solicita a um juiz brasileiro que ouça determinada testemunha domiciliada aqui).
Já a homologação de sentença estrangeira, desde a Emenda Constitucional n.º 45, é um procedimento levado ao Superior Tribunal de Justiça cujo objetivo é possibilitar o cumprimento de sentenças estrangeiras no território brasileiro. Só pode ser apresentada mediante alguns requisitos (definidos no art.15 da LICC), como haver sido proferida por juiz competente, e estar traduzida por intérprete autorizado.
Observa-se porém que as leis, os atos e as sentenças de outro país não terão eficácia no Brasil quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes (art.17 da LICC).
2006-11-07 02:22:35
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answer #2
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answered by cris 7
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