Análise de Dom Casmurro
Introdução
A finalidade desta análise literária da obra Dom Casmurro, e levar o leitor à reflexão quanto ao delírio de ciúmes que por vezes levou Bentinho a uma personalidade neurótica. Partimos de um estudo psicanalítico de Freud que ressalta o aspecto afetivo afirmando que o relacionamento entre pais e filhos durante a infância, e especialmente entre pai e filho resulta muitas vezes no destino do indivíduo no futuro.
Dom Casmurro no desejo de convencer a nós leitores e a si mesmo da culpa da mulher defende sua reputação de "um homem acima de qualquer suspeita" e em posse da palavra tenta seduzir quem ler sua história, para ganhar-lhes a confiança.
Síntese da obra: Dom Casmurro
Dom Casmurro narrou o romance entre dois jovens , Bentinho e Capitu , que foram criados juntos. Ele , um rapaz que se perturba facilmente , ela tem completo domínio de si mesma , casam-se logo após Bentinho voltar do seminário , pois desistira de ser padre. Tem um filho que passa com o desenrolar dos anos a ser a razão maior do ciúme de Bentinho, Por ocasião da morte de Escobar , melhor amigo de Dom Casmurro , ele tem a certeza da traição da mulher , por motivo das sua atitude diante do caixão. Manda-a juntamente com o filho para Europa ; Capitu morre um ano depois e Bentinho passa a viver solitário e não pode esquecer sua amada.
Análise do Enredo
Bentinho foi destinado à vida eclesiástica , nasceu sob a estigma da ansiedade agravada pela insegurança da mãe e dos que faziam parte de seu meio.
A importância da imaginação na sua personalidade influenciou-o por toda vida. Na puberdade chega quase na obsessão sexual. Quando o ciúme começa a abrir em sua alma as primeiras feridas , sua reação é quase histérica.
O Bentinho evocado por Dom Casmurro tem dois sinais: sexualidade tardia e predomínio da fantasia sobre a realidade. A presença dessa neurose foi o terreno onde medraram as flores doentias do ciúme.
O Ciúme
Bentinho , fisgado de "puro ciúme" sequer procurava esclarecer as dúvidas quanto as atitudes de Capitu. A imaginação continuava a correr e com ela corre o ciumento.
No capítulo LXXII , retoma-se a tragédia de Shakespeare , Otelo , para a preposição de uma reforma dramática , entretanto , na reconstrução do seu drama memorialista preferia o caminho tradicional.
Dom Casmurro não ousa deixar as coisas "em pratos limpos" , quase a ansiedade chega por vezes ao 1paroxismo de uma crise de nervos, com impulsos agressivos contra Capitu.
No capítulo CXIII , o narrador começa a direcionar suas suspeitas à Capitu , que não quis acompanhar o marido ao teatro em razão de uma indisposição. Bentinho vai só , mas volta para casa no final do primeiro ato e encontra Escobar no corredor de sua casa. O episódio e tratado com fria ironia , levando o leitor as mais variadas interpretações sugeridas pela coincidência entre o mal-estar de Capitu e a visita não anunciada do amigo.
"Dúvida sobre dúvida" (cap. CXV) é o saldo da visita de Escobar . Na conversa que se segue o assunto são as dúvidas e recomenda D. Casmurro que era ele um poço delas , coaxavam dentro dele como verdadeiras rãs. A necessidade do delírio , associada a perturbação do sono , configura a fase que os psiquiatras chamam de epofenia.
José Dias chama Ezequiel de "filho do homem" e isso irrita Capitu. Essa tenta corrigir o modo de andar do filho que imita José Dias e o modo de olhar que imita Escobar. Bentinho acredita que as imitações de Ezequiel é uma prova de paternidade e não decorrente da convivência.
Os dois casais , Bentinho e Capitu , Escobar e Sancha , planejam uma viagem para Europa, porém tal viagem não ocorre pois Escobar morre tragicamente. Nesse momento da obra , o ciúme se instaura para sempre no coração de Bentinho. O fato determinante surgiu nos momentos que procederam o enterro, quando a viúva é amparada por Capitu , que parecia vencer a si mesma.
O olhar fixo de Capitu para o defunto , leva Bentinho a uma interpretação exorbitante. Suas dúvidas tornam-se agora firmes e certas , já alimentando a sede de vingança.
A partir da morte de Escobar , Bentinho anda aborrecido , mergulha de vez na melancolia. E começa a fazer projetos de suicídio. A paranóia do ciúme se incorpora de tal forma que ele passa a tratar sua mulher com aspereza e toma o filho para transforma-lo em documento de traição.
Ezequiel é afastado para um colégio da Lapa , no entanto , esse afastamento não diminui , de Bentinho a idéia do suicídio. Certo dia , quando esperava o café D. Casmurro pensou em matar-se ; chega a derramar o veneno na xícara , tremendo , com "os olhos vagos à memória em 2Desdêmona inocente". A presença de Ezequiel corta-lhe o impulso suicida e surge com violência o desejo de liquidar o filho. Dom Casmurro , por um momento acreditou-se vítima de uma grande ilusão , a volta de Ezequiel lança-o novamente ao mundo de seus fantasmas.
Santiago isola Capitu e o filho na Suíça. Capitu morre. O primeiro e único amor estava morto e enterrado , mas o ciúme não: ressurgia na figura do filho que de volta de uma das viagens o visitara inesperadamente.
Conclusão Psicanalítica - Segundo Freud
Partamos do princípio de que todos nós temos uma família e mais precisamente pai e mãe, e que como Bentinho , desde a infância sofremos de forma profunda ou não as conseqüências negativas ou positivas do relacionamento que tivemos com eles. Sendo assim compactuamos quando "Freud chamou a atenção para o fato do relacionamento afetivo das crianças com os pais e , sobretudo , com o pai , se da maior importância para o conteúdo de uma neurose futura.
O relacionamento com os pais é , de fato , o canal infantil por excelência por onde flui de volta a libido ao encontrar obstáculos na vida posterior e por meio do qual revive conteúdos psíquicos da infância , já de há muito esquecidos. Sempre é assim na vida humana: quando voltamos para trás diante de um obstáculo grande demais , de uma decepção muito ameaçadora ou de um risco de uma decisão muito importante , então a energia acumulada para resolver a tarefa flui de volta e torna a encher os antigos leitos , os sistemas obsoletos do passado. Quando , por ex. , a sorte no amor vai mal , ele volta para trás e procura uma amizade sentimental ou uma falsa religiosidade. Se o decepcionado for um neurótico, ele volta mais ainda para trás e se apega a relacionamentos infantis que ele nunca abandonou de todo e aos quais também o normal está preso por mais de uma corrente: o relacionamento com o pai e a mãe".
( Freud e a psicanálise - p. 295 )
A citação a seguir vem ao encontro desse pensamento freudiano , no que se refere aos sentimentos de Bentinho , quando criança , em relação aos pais:
"... Tenho ali na parede o retrato dela , ao lado do marido , tais quais na outra casa. A pintura escureceu muito , mais ainda da idéia de ambos . Não me lembra nada dele , a não ser vagamente que era alto e usava cabeleira grande ; o retrato mostra uns olhos redondos , que me acompanham para todos os lados , efeito da pintura que me assombrava em pequeno. O pescoço sai de uma gravata preta de muitas voltas , a cara é toda rapada , salvo um trechozinho pegado às orelhas. O de minha mãe mostra que era linda. Contava então vinte anos , e tinha uma flor entre os dedos. No painel parece oferecer a flor ao marido... Se padeceram moléstias , não sei , como não sei se tiveram desgostos: era criança e comecei por não ser nascido".
( Dom Casmurro - cap. VII - p. 21 )
2006-11-07 01:49:07
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answer #1
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answered by Carol 4
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Para esclarecer: intertextualidade é a relação vc encontra entre dados da obra e alguma outra história. Como já foi citado, Otelo é uma grande intertextualidade, porque a história narra os pensamentos de um homem que supõe ser traído pela esposa e causa sua morte por isso. Mas vc pode relacionar outros pontos da narrativa com outras histórias, pode destacar algum clímax de outra obra, ou procurar uma personagem com características como as da Capitu, etc..Boa sorte!!! Precisando de ajuda, envie-me um e-mail, okayy??
2006-11-08 10:12:57
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answer #2
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answered by ..witch.. 3
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A pós-estruturalista Julia Kristeva, no seu livro Introdução à Semanálise, observa que a palavra literária não é um ponto com um sentido fixo, mas um cruzamento de superfícies textuais: a do escritor, do destinatário(ou da personagem), do contexto cultural. O autor pode, portanto, apropriar-se da palavra do "outro", para inserir um sentido novo, tendo esse "outro" a função de orientar e atravessar o discurso do "eu".
A relação desse "eu" (o contexto cultural no qual está inserido, sua identidade e história pessoal) com "outro”(da simultaneidade estilística e diversidade de linguagens estéticas) produziu a essência de alguns movimentos artísticos modernistas.
O escritor norte-americano T.S Eliot, em The Waste Land, incorporou textos científicos, bíblicos e de autores como Dante e Baudelaire, produzindo, dessa forma, uma das principais referências literárias dentro desse conceito de uma linguagem intertextual.
No Brasil, Manuel Bandeira, em “Antologia”, fragmentou pedaços dos seus próprios textos passados e transformou-os num novo poema: “A vida/ não vale a pena e a dor de ser vivida./Os corpos se entendem mas as almas não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino./ Vou-me embora pra Pasárgada! aqui não sou feliz.."
A estética da intertextualidade marcou ainda a poesia de Wally Salomão, Paulo Leminski e até mesmo Machado de Assis. Este ( Machado de Assis ), na introdução de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", cita Stendhal e Lawrence Sterne, referindo-se à influência dos dois autores na literatura universal; e em Dom Casmurro alude a um texto de Montaigne no qual o autor francês diz: não são meus gestos que eu escrevo, sou eu, é minha essência. Talvez seja essência a qual também chama a atenção Bakhtin: a história pessoal do autor, suas referências literárias.
2006-11-08 00:02:07
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answer #3
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answered by GORS 3
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