Culpa do própriuo povo e da mídia.
Dois pesos, duas medidas
SILÊNCIO NAS CONDENAÇÕES DO CASO
ESCOLA BASE DERRUBA DISCURSO ÉTICO
Mídia prepara nova artilharia na reta final do segundo turno
20 de Outubro de 2006 @ 00:36 por Alceu Nader
A inserção anterior, sobre o Observatório Brasileiro de Mídia (OBM), motivou pesquisa sobre a função dos media watchdogs, os vigilantes da mídia. A maioria das ONG funciona nos Estados Unidos, com arco de atuação que atende a todas as correntes ideológicas. Lá, como em vários países, os vigilantes da mídia formam ativa parceria com escritórios de advocacia cidadã na formulação das ações indenizatórias e corretivas. Temidos, os vigilantes fazem com que grandes grupos de mídia do exterior preservem anotações e gravações integrais do material apurado para as reportagens, para responder a uma eventual contestação ou ação judicial. Os processos contra abusos atacam no ponto mais frágil das empresas: o bolso dos seus acionistas.
As ONG mais poderosas têm até mesmo lobby no Congresso, como é o caso da liberal conservadora AIM (Accuracy in Media), dos EUA, que se conta com estrutura superprofissional para vigiar a mídia mais poderosa do planeta. Seus alvos preferenciais são a publicação de obscenidades e abusos cometidos contra o consumidor/leitor. Mais: a AIM e outras ONG do gênero investigam também quais as razões que provocaram os grupos controladores da mídia a dar maior relevância para determinado assunto e, a partir daí, com novas informações, analisar o conteúdo da onda midiática.
Sob os olhos dos vigilantes, por exemplo, não passaria despercebido o fato de a revista Veja ter dedicado quinze capas seguidas - quase quatro meses - à exploração do caso do mensalão, com afirmações e induções que até hoje não foram confirmadas.
O Observatório Brasileiro de Mídia é ligado à rede Media Watch Global, com sede em Paris, que tem em seus observadores jornalistas, leitores/consumidores e acadêmicos, visando a justiça e a precisão das informações. O OBM, criado durante o Fórum Social Mundial de Porto Alegre, em 2003, até pelo próprio nome, pode complementar a atividade pioneira do Observatório da Imprensa, com dez anos de estrada, com medições e aferições como a apresentada nesta semana (ver inserção abaixo).
Há outras associações do gênero funcionando no Brasil, mas ainda falta muito para o país ter um sistema de defesa eficiente contra os abusos e transgressões cometidos pela mídia. O primeiro passo da longa caminhada será dado quando a pressão dessas entidades tirar os julgamentos de primeira instância das comarcas de bairro, onde os juízes são penetráveis a pressões, não contam com a necessária especialização e são facilmente engolidos pelos grandes escritórios de advocacia que atendem a mídia.
Tomando-se como exemplo o caso da Escola Base, o que se tem hoje, para o cidadão que decide enfrentar a mídia, é que prevalece a mesmíssima sensação de impunidade que colunistas e editoriais continuamente denunciam e condenam.
Para relembrar, em 1994, o casal proprietário e o motorista da pré-escola de São Paulo, Capital, tiveram suas vidas anuladas pelos erros de avaliação de um delegado do estado e a ampla e emocional cobertura da imprensa paulista. Os três eram acusados de seviciar e violentar crianças em idade pré-escolar. A onda midiática estendeu-se durante semanas, sempre contra os donos e o funcionário da escola, levada pelo embalo da busca da notícia mais sensacional e da nova revelação a confirmar o crime abjeto. No auge, um grupo de radicais destruiu a escola, enquanto seus donos eram mantidos na prisão diante de novos depoimentos e provas de culpabilidade que a mídia apresentava e o delegado engolia.
Doze anos depois, os processos contra as empresas responsáveis continuam inconclusos. A partir deste ano, as três vítimas conseguiram ultrapassar o obstáculo da segunda instância. Todas as empresas foram condenadas, mas decidiram recorrer da decisão. A Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo foram condenados a pagar, cada um, R$ 750 mil. As revistas Istoé e Veja também foram condenadas. A primeira, com indenização de R$ 360 mil; a segunda, de R$ 250 mil. Entre as emissoras de tevê, o SBT foi condenado a R$ 900 mil, depois de absolvido junto com a Bandeirantes em um julgamento posteriormente anulado. Para a Rede Globo, que lotou seu noticiário local com o caso, a sentença mais dura: R$ 1,35 milhão.
O registro dessas acusações praticamente inexistiu na imprensa, mantendo-se o código da Omertà para silenciar sobre o crime cometido. Nenhuma publicação ou emissora noticiou suas próprias condenações ou as das demais rés. Houve apenas uma exceção, a da Folha de S.Paulo, em duas ocasiões. Primeiro, por meio de uma nota de cinco linhas; segundo, em uma das colunas do ombudsman Marcelo Beraba. Na única e solitária manifestação, Beraba dizia não entender porque as empresas mantinham a estratégia de recorrer seguidamente às sentenças desfavoráveis diante de um caso que se tornou “emblemático”.
A condenação em massa não gerou considerações da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) nem a Associação Nacional dos Jornais (ANJ), e muito menos sensibilizou os acionistas das empresas condenadas para a discussão do problema e a adoção de novos procedimentos para se evitar a repetição do erro brutal. Para essas entidades e os controladores das empresas de mídia, o perigo mora nos controles que as sociedades organizadas dispõem, como os organismos reguladores e a reivindicação de pagamento de multas e indenizações. Ambos são tidos como ameaça à liberdade de imprensa e de expressão.
Comparado com o comportamento predominante no caso da Escola Base, tem-se a contradição. De um lado, apelam indefinidamente para não serem condenadas e, quando o são, escondem a informação. Do outro, demonizam a regulação do setor para manter o controle sobre o que julgam ser os verdadeiros valores morais e éticos do país.
É essa mesma e poderosa indústria que, agora, na reta final ao segundo turno, está na contramão da opinião pública refletida nas pesquisas eleitorais (leia, abaixo, a inserção anterior). Também é essa mesma indústria que se submeteu e apoiou os desvios do delegado da Polícia Federal que para que fotos do dinheiro apreendido no caso do dossiê furado fossem divulgadas às vésperas do primeiro turno.
Algumas empresas de mídia vêm investindo pesado, desde meados do ano passado, na inviabilização de um eventual (e cada vez mais provável) segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. A reversão das expectativas do investimento é desesperante, e novas tentativas de desestabilização do processo eleitoral estão sendo preparadas para os nove dias que faltam para o segundo turno.
2006-10-23 02:42:15
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answer #1
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answered by Anonymous
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