A leitura é a fonte de sabedoria...porém não gostamos de ler ou não fomos educados a tal.
Leia os artigos a seguir e reflita sobre nossa sociedade, no momento polÃtico que vivemos, etc
Lembre-se não tenha preguiça de ler, muitos ensinamentos estão ali contidos.
A Internet é uma das criações mais fabulosas da humanidade, mas como sempre e em tudo temos que saber filtrar onde gastaremos nosso precioso tempo de vida e aprendizado
Abraços e divulgue a idéia
DANÃANDO CONFORME A MÃSICA ...
Não sou habilidoso em identificar os diferentes ritmos musicais: bolero, swing, tango, vanerão, chamamé, valsa, forró e outros. Mas, uma coisa podia categoricamente afirmar: havia ritmo que não dançava nem que a vaca tossisse. A vaca tossiu!
Pelas palavras iniciais, nota-se que escrevo mais uma crônica de desabafo. Só que desta vez acompanhando a indignação, sinto uma profunda decepção. Constato que aquela história de apadrinhamento e tráfico de influência se prolifera como a febre aftosa. Valores tais como merecimento, comprometimento e imparcialidade são besteiras nos dias de hoje. Vale o tal do QI (quem indique), contatos e conhecidos no lugar e hora certa, para puxar a sardinha para sua brasa, ou seja, corromper o processo. Do contrário, não há a menor chance. Certamente, serás mais uma carta fora do baralho por relutar a dançar qualquer música.
E, o pior de tudo, foi pensar não precisar me valer dessas artimanhas. Sem falsa modéstia e sim pela limpidez da minha consciência, pensava que uma vez tendo desempenhado adequadamente meu trabalho, seria naturalmente atendido nos meus anseios. Infantil engano! E assim, mais uma frustração vou assimilando, como uma vacina de placebo no lombo por obrigação. Parte do entusiasmo se esvai. O comprometimento torna-se enfraquecido. Certos valores morais ficam abalados.
Baixo a cabeça, corre a lágrima e outro dia nasce. Estou novamente pronto, disposto e colaborador, apesar de invisivelmente ferido e mais susceptÃvel a novos ritmos de dança.
Para não entrar no rol dos excluÃdos, começo a arrastar o pé. Meio trôpego e sem jeito (envergonhado) acabo me sujeitando ao ritmo musical interesseiro e desonesto. à a força do meio sobre o homem. Infelizmente, face as circunstâncias lá estou eu, juntando-me a vala comum, babando e dançando, como uma vaca louca com aftosa. A vacina moral não foi tão poderosa, cedendo espaço ao descalabro.
Lamento não ser mais forte. Tenhamos "BOA SORTE" para sobreviver na República do nepotismo! Afinal, hoje se comemora a Proclamação da República no Brasil.
Que paÃs é esse? - Renato Russo Fonte: "http://www.orkutmusic.com/pt/msgs_view.php?id=10"
"Se não há sentimento de confiança na organização e se as pessoas estão preocupadas em proteger suas posições ... então a criatividade vai ser uma das primeiras vÃtimas". MANFRED. F. R. KETS DE VRIES
Mario Câmara - 15/11/2005
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" Precisa-se de Matéria Prima para construir um PaÃs"
João Ubaldo Ribeiro
A crença geral anterior era que Collor não servia, bem como Itamar e Fernando Henrique. Agora dizemos que Lula não serve. E o que vier depois de Lula também não servirá para nada. Por isso estou começando a suspeitar que o problema não está no ladrão corrupto que foi Collor, ou na farsa que é o Lula.
O problema está em nós. Nós como POVO. Nós como matéria prima de um paÃs. Porque pertenço a um paÃs onde a "ESPERTEZA" é a moeda que sempre é valorizada, tanto ou mais do que o dólar. Um paÃs onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma famÃlia, baseada em valores e respeito aos demais.
Pertenço a um paÃs onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros paÃses, isto é, pondo umas caixas nas calçadas onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM Sà JORNAL, DEIXANDO OS DEMAIS ONDE ESTÃO. Pertenço ao paÃs onde as "EMPRESAS PRIVADAS" são papelarias particulares de seus empregados desonestos, que levam para casa, como se fosse correto, folhas de papel, lápis, canetas, clipes e tudo o que possa ser útil para o trabalho dos filhos... e para eles mesmos. Pertenço a um paÃs onde a gente se sente o máximo porque conseguiu "puxar" a tevê a cabo do vizinho, onde a gente frauda a declaração de imposto de renda para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um paÃs onde a impontualidade é um hábito.
Onde os diretores das empresas não valorizam o capital humano. Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e depois reclamam do governo por não limpar os esgotos. Onde pessoas fazem "gatos" para roubar luz e água e nos queixamos de como esses serviços estão caros. Onde não existe a cultura pela leitura (exemplo maior nosso atual Presidente, que recentemente falou que é "muito chato ter que ler") e não há consciência nem memória polÃtica, histórica nem econômica. Onde nossos congressistas trabalham dois dias por semana para aprovar projetos e leis que só servem para afundar ao que não tem, encher o saco do que tem pouco e beneficiar só a alguns.
Pertenço a um paÃs onde as carteiras de motorista e os certificados médicos podem ser "comprados", sem fazer nenhum exame. Um paÃs onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no ônibus, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não dar o lugar. Um paÃs no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o pedestre. Um paÃs onde fazemos um monte de coisa errada, mas nos esbaldamos em criticar nossos governantes.
Quanto mais analiso os defeitos do Fernando Henrique e do Lula, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem "molhei" a mão de um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Dirceu é culpado, melhor sou eu como brasileiro, apesar de ainda hoje de manhã passei para trás um cliente através de uma fraude, o que me ajudou a pagar algumas dÃvidas.
Não. Não. Não. Já basta.
Como "Matéria Prima" de um paÃs, temos muitas coisas boas, mas nos falta muito para sermos os homens e mulheres que nosso paÃs precisa. Esses defeitos, essa "ESPERTEZA BRASILEIRA" congênita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até converter-se em casos de escândalo, essa falta de qualidade humana, mais do que Collor, Itamar, Fernando Henrique ou Lula, é que é real e honestamente ruim, porque todos eles são brasileiros como nós, ELEITOS POR NÃS. Nascidos aqui, não em outra parte ... Me entristeço. Porque, ainda que Lula renunciasse hoje mesmo, o próximo presidente que o suceder terá que continuar trabalhando com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos.
E não poderá fazer nada... Não tenho nenhuma garantia de que alguém o possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vÃcios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Collor, nem serviu Itamar, não serviu Fernando Henrique, e nem serve Lula, nem servirá o que vier. Qual é a alternativa? Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa "outra coisa" não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados, igualmente estancados...igualmente sacaneados!!!
à muito gostoso ser brasileiro. Mas quando essa brasilinidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, aà a coisa muda... Não esperemos acender uma vela a todos os Santos, a ver se nos mandam um Messias. Nós temos que mudar, um novo governador com os mesmos brasileiros não poderá fazer nada.
Está muito claro...... Somos nós os que temos que mudar. Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda nos acontecendo: desculpamos a mediocridade mediante programas de televisão nefastos e francamente tolerantes com o fracasso. à a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente decidi procurar o responsável, não para castigá-lo, senão para exigir-lhe (sim, exigir-lhe) que melhore seu comportamento e que não se faça de surdo, de desentendido.
Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. Aà ESTÃ. NÃO PRECISO PROCURÃ-LO EM OUTRO LADO.
E você, o que pensa?.... MEDITE!!!!!""
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"O homem de cabeça de papelão"
João do Rio
No PaÃs que chamavam de Sol, apesar de chover, à s vezes, semanas inteiras, vivia um homem de nome Antenor. Não era prÃncipe. Nem deputado. Nem rico. Nem jornalista. Absolutamente sem importância social.
O PaÃs do Sol, como em geral todos os paÃses lendários, era o mais comum, o menos surpreendente em idéias e práticas. Os habitantes afluÃam todos para a capital, composta de praças, ruas, jardins e avenidas, e tomavam todos os lugares e todas as possibilidades da vida dos que, por desventura, eram da capital. De modo que estes eram mendigos e parasitas, únicos meios de vida sem concorrência, isso mesmo com muitas restrições quanto ao parasitismo. Os prédios da capital, no centro elevavam aos ares alguns andares e a fortuna dos proprietários, nos subúrbios não passavam de um andar sem que por isso não enriquecessem os proprietários também. Havia milhares de automóveis à disparada pelas artérias matando gente para matar o tempo, cabares fatigados, jornais, "tramways", partidos nacionalistas, ausência de conservadores, a Bolsa, o Governo, a moda, e um aborrecimento integral. Enfim, tudo quanto a cidade de fantasia pode almejar para ser igual a uma grande cidade com pretensões da América. E o povo que a habitava julgava-se, além de inteligente, possuidor de imenso bom senso. Bom senso! Se não fosse a capital do PaÃs do Sol, a cidade seria a capital do Bom Senso!
Precisamente por isso, Antenor, apesar de não ter importância alguma, era exceção mal vista. Esse rapaz, filho de boa famÃlia (tão boa que até tinha sentimentos), agira sempre em desacordo com a norma dos seus concidadãos.
Desde menino, a sua respeitável progenitora descobriu-lhe um defeito horrÃvel: Antenor só dizia a verdade. Não a sua verdade, a verdade útil, mas a verdade verdadeira. Alarmada, a digna senhora pensou em tomar providências. Foi-lhe impossÃvel. Antenor era diverso no modo de comer, na maneira de vestir, no jeito de andar, na expressão com que se dirigia aos outros. Enquanto usara calções, os amigos da famÃlia consideravam-no um "enfant terrible", porque no PaÃs do Sol todos falavam francês com convicção, mesmo falando mal. Rapaz, entretanto, Antenor tornou-se alarmante. Entre outras coisas, Antenor pensava livremente por conta própria. Assim, a famÃlia via chegar Antenor como a própria revolução; os mestres indignavam-se porque ele aprendia ao contrario do que ensinavam; os amigos odiavam-no; os transeuntes, vendo-o passar, sorriam.
Uma só coisa descobriu a mãe de Antenor para não ser forçada a mandá-lo embora: Antenor nada do que fazia, fazia por mal. Ao contrário. Era escandalosamente, incompreensivelmente, bom. Aliás, só para ela, para os olhos maternos. Porque quando Antenor resolveu arranjar trabalho para os mendigos e corria a bengala os parasitas na rua, ficou provado que Antenor era apenas doido furioso. Não só para as vÃtimas da sua bondade como para a esclarecida inteligência dos delegados de polÃcia a quem teve de explicar a sua caridade.
Com o fim de convencer Antenor de que devia seguir os trâmites legais de um jovem solar, isto é: ser bacharel e depois empregado público nacionalista, deixando à atividade da canalha estrangeira o resto, os interesses congregados da famÃlia em nome dos princÃpios organizaram vários "meetings" como aqueles que se fazem na inexistente democracia americana para provar que a chave abre portas e a faca serve para cortar o que é nosso para nós e o que é dos outros também para nós. Antenor, diante da evidência, negou-se.
— Ouça! bradava o tio. Bacharel é o princÃpio de tudo. Não estude. Pouco importa! Mas seja bacharel! Bacharel você tem tudo nas mãos. Ao lado de um polÃtico-chefe, sabendo lisonjear, é a ascensão: deputado, ministro.
— Mas não quero ser nada disso.
— Então quer ser vagabundo?
— Quero trabalhar.
— Vem dar na mesma coisa. Vagabundo é um sujeito a quem faltam três coisas: dinheiro, prestÃgio e posição. Desde que você não as tem, mesmo trabalhando — é vagabundo.
— Eu não acho.
— à pior. à um tipo sem bom senso. à bolchevique. Depois, trabalhar para os outros é uma ilusão. Você está inteiramente doido.
Antenor foi trabalhar, entretanto. E teve uma grande dificuldade para trabalhar. Pode-se dizer que a originalidade da sua vida era trabalhar para trabalhar. Atendendo ao pedido da respeitável senhora que era mãe de Antenor, Antenor passeou a sua má cabeça por várias casas de comércio, várias empresas industriais. Ao cabo de um ano, dois meses, estava na rua. Por que mandavam embora Antenor? Ele não tinha exigências, era honesto como a água, trabalhador, sincero, verdadeiro, cheio de idéias. Até alegre — qualidade rarÃssima no paÃs onde o sol, a cerveja e a inveja faziam batalhões de biliosos tristes. Mas companheiros e patrões prevenidos, se a princÃpio declinavam hostilidades, dentro em pouco não o aturavam. Quando um companheiro não atura o outro, intriga-o. Quando um patrão não atura o empregado, despede-o. à a norma do PaÃs do Sol. Com Antenor depois de despedido, companheiros e patrões ainda por cima tomavam-lhe birra. Por que? à tão difÃcil saber a verdadeira razão por que um homem não suporta outro homem!
Um dos seus ex-companheiros explicou certa vez:
— à doido. Tem a mania de fazer mais que os outros. Estraga a norma do serviço e acaba não sendo tolerado. Mau companheiro. E depois com ares...
O patrão do último estabelecimento de que saÃra o rapaz respondeu à mãe de Antenor:
— A perigosa mania de seu filho é por em prática idéias que julga próprias.
— Prejudicou-lhe, Sr. Praxedes?
— Não. Mas podia prejudicar. Sempre altera o bom senso. Depois, mesmo que seu filho fosse águia, quem manda na minha casa sou eu.
No PaÃs do Sol o comércio éuma maçonaria. Antenor, com fama de perigoso, insuportável, desobediente, não pôde em breve obter emprego algum. Os patrões que mais tinham lucrado com as suas idéias eram os que mais falavam. Os companheiros que mais o haviam aproveitado tinham-lhe raiva. E se Antenor sentia a triste experiência do erro econômico no trabalho sem a norma, a praxe, no convÃvio social compreendia o desastre da verdade. Não o toleravam. Era-lhe impossÃvel ter amigos, por muito tempo, porque esses só o eram enquanto, não o tinham explorado.
Antenor ria. Antenor tinha saúde. Todas aquelas desditas eram para ele brincadeira. Estava convencido de estar com a razão, de vencer. Mas, a razão sua, sem interesse chocava-se à razão dos outros ou com interesses ou presa à sugestão dos alheios. Ele via os erros, as hipocrisias, as vaidades, e dizia o que via. Ele ia fazer o bem, mas mostrava o que ia fazer. Como tolerar tal miserável? Antenor tentou tudo, juvenilmente, na cidade. A dignÃssima sua progenitora desculpava-o ainda.
— Ã doido, mas bom.
Os parentes, porém, não o cumprimentavam mais. Antenor exercera o comércio, a indústria, o professorado, o proletariado. Ensinara geografia num colégio, de onde foi expulso pelo diretor; estivera numa fábrica de tecidos, forçado a retirar-se pelos operários e pelos patrões; oscilara entre revisor de jornal e condutor de bonde. Em todas as profissões vira os cÃrculos estreitos das classes, a defesa hostil dos outros homens, o ódio com que o repeliam, porque ele pensava, sentia, dizia outra coisa diversa.
— Mas, Deus, eu sou honesto, bom, inteligente, incapaz de fazer mal...
— à da tua má cabeça, meu filho.
— Qual?
— A tua cabeça não regula.
— Quem sabe?
Antenor começava a pensar na sua má cabeça, quando o seu coração apaixonou-se. Era uma rapariga chamada Maria Antônia, filha da nova lavadeira de sua mãe. Antenor achava perfeitamente justo casar com a Maria Antônia. Todos viram nisso mais uma prova do desarranjo cerebral de Antenor. Apenas, com pasmo geral, a resposta de Maria Antônia foi condicional.
— Só caso se o senhor tomar juÃzo.
— Mas que chama você juÃzo?
— Ser como os mais.
— Então você gosta de mim?
— E por isso é que só caso depois.
Como tomar juÃzo? Como regular a cabeça? O amor leva aos maiores desatinos. Antenor pensava em arranjar a má cabeça, estava convencido.
Nessas disposições, Antenor caminhava por uma rua no centro da cidade, quando os seus olhos descobriram a tabuleta de uma "relojoaria e outros maquinismos delicados de precisão". Achou graça e entrou. Um cavalheiro grave veio servi-lo.
— Traz algum relógio?
— Trago a minha cabeça.
— Ah! Desarranjada?
— Dizem-no, pelo menos.
— Em todo o caso, há tempo?
— Desde que nasci.
— Talvez imprevisão na montagem das peças. Não lhe posso dizer nada sem observação de trinta dias e a desmontagem geral. As cabeças como os relógios para regular bem...
Antenor atalhou:
— E o senhor fica com a minha cabeça?
— Se a deixar.
— Pois aqui a tem. Conserte-a. O diabo é que eu não posso andar sem cabeça...
— Claro. Mas, enquanto a arranjo, empresto-lhe uma de papelão.
— Regula?
— à de papelão! Explicou o honesto negociante. Antenor recebeu o número de sua cabeça, enfiou a de papelão, e saiu para a rua.
Dois meses depois, Antenor tinha uma porção de amigos, jogava o pôquer com o Ministro da Agricultura, ganhava uma pequena fortuna vendendo feijão bichado para os exércitos aliados. A respeitável mãe de Antenor via-o mentir, fazer mal, trapacear e ostentar tudo o que não era. Os parentes, porém, estimavam-no, e os companheiros tinham garbo em recordar o tempo em que Antenor era maluco.
Antenor não pensava. Antenor agia como os outros. Queria ganhar. Explorava, adulava, falsificava. Maria Antônia tremia de contentamento vendo Antenor com juÃzo. Mas Antenor, logicamente, desprezou-a propondo um concubinato que o não desmoralizasse, a ele. Outras Marias ricas, de posição, eram de opinião da primeira Maria. Ele só tinha de escolher. No centro operário, a sua fama crescia, querido dos patrões burgueses e dos operários irmãos dos spartakistas da Alemanha. Foi eleito deputado por todos, e, especialmente, pelo presidente da República — a quem atacou logo, pois para a futura eleição o presidente seria outro. A sua ascensão só podia ser comparada à dos balões. Antenor esquecia o passado, amava a sua terra. Era o modelo da felicidade. Regulava admiravelmente.
Passaram-se assim anos. Todos os chefes polÃticos do PaÃs do Sol estavam na dificuldade de concordar no nome do novo senador, que fosse o expoente da norma, do bom senso. O nome de Antenor era cotado. Então Antenor passeava de automóvel pelas ruas centrais, para tomar pulso à opinião, quando os seus olhos deram na tabuleta do relojoeiro e lhe veio a memória.
— Bolas! E eu que esqueci! A minha cabeça está ali há tempo... Que acharia o relojoeiro? à capaz de tê-la vendido para o interior. Não posso ficar toda vida com uma cabeça de papelão!
Saltou. Entrou na casa do negociante. Era o mesmo que o servira.
— Há tempos deixei aqui uma cabeça.
— Não precisa dizer mais. Espero-o ansioso e admirado da sua ausência, desde que ia desmontar a sua cabeça.
— Ah! fez Antenor.
— Tem-se dado bem com a de papelão? — Assim...
— As cabeças de papelão não são más de todo. Fabricações por séries. Vendem-se muito.
— Mas a minha cabeça?
— Vou buscá-la.
Foi ao interior e trouxe um embrulho com respeitoso cuidado.
— Consertou-a?
— Não.
— Então, desarranjo grande?
O homem recuou.
— Senhor, na minha longa vida profissional jamais encontrei um aparelho igual, como perfeição, como acabamento, como precisão. Nenhuma cabeça regulará no mundo melhor do que a sua. à a placa sensÃvel do tempo, das idéias, é o equilÃbrio de todas as vibrações. O senhor não tem uma cabeça qualquer. Tem uma cabeça de exposição, uma cabeça de gênio, "hors-concours".
Antenor ia entregar a cabeça de papelão. Mas conteve-se.
— Faça o obséquio de embrulhá-la.
— Não a coloca?
— Não.
— V.Exa. faz bem. Quem possui uma cabeça assim não a usa todos os dias. Fatalmente dá na vista.
Mas Antenor era prudente, respeitador da harmonia social.
— Diga-me cá. Mesmo parada em casa, sem corda, numa redoma, talvez prejudique.
— Qual! V.Exa. terá a primeira cabeça.
Antenor ficou seco.
— Pode ser que V., profissionalmente, tenha razão. Mas, para mim, a verdade é a dos outros, que sempre a julgaram desarranjada e não regulando bem. Cabeças e relógios querem-se conforme o clima e a moral de cada terra. Fique V. com ela. Eu continuo com a de papelão.
E, em vez de viver no PaÃs do Sol um rapaz chamado Antenor, que não conseguia ser nada tendo a cabeça mais admirável — um dos elementos mais ilustres do PaÃs do Sol foi Antenor, que conseguiu tudo com uma cabeça de papelão.
João do Rio foi o pseudônimo mais constante de João Paulo EmÃlio Coelho Barreto, escritor e jornalista carioca, que também usou como disfarce os nomes de Godofredo de Alencar, José Antônio José, Joe, Claude, etc., nada ou quase nada escrevendo e publicando sob o seu próprio nome. Foi redator de jornais importantes, como "O PaÃs" e "Gazeta de NotÃcias", fundando depois um diário que dirigiu até o dia de sua morte, "A Pátria". Contista romancista, autor teatral (condição em que exerceu a presidência da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais, tradutor de Oscar Wilde, foi membro da Academia Brasileira de Letras, eleito na vaga de Guimarães Passos. Entre outros livros deixou "Dentro da Noite", "A Mulher e os Espelhos", "Crônicas e Frases de Godofredo de Alencar", "A Alma Encantadora das Ruas", "Vida Vertiginosa", "Os Dias Passam", "As religiões no Rio" e "Rosário da Ilusão", que contém como primeiro conto a admirável sátira "O homem da cabeça de papelão". Nascido no Rio de Janeiro a 05 de agosto de 1881, faleceu repentinamente na mesma cidade a 23 de junho de 1321.
O texto acima foi extraÃdo do livro "Antologia de Humorismo e Sátira", organizada por R. Magalhães Júnior, Editora Civilização Brasileira — Rio de Janeiro, 1957, pág. 196. Fonte: "http://www.releituras.com/joaodorio_homem.asp"
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A Lei do Zeca Pagodinho
Nailor Marques Junior *
Diz uma história que numa cidade apareceu um circo, e que entre seus artistas havia um palhaço com o poder de divertir, sem medida, todas as pessoas da platéia e o riso era tão bom, tão profundo e natural que se tornou terapêutico. Todos os que padeciam de tristezas agudas ou crônicas eram indicados pelo médico do lugar para que assistissem ao tal artista que possuÃa o dom de eliminar angústias.
Um dia porém um morador desconhecido, tomado de profunda depressão, procurou o doutor. O médico então, sem relutar, indicou o circo como o lugar de cura de todos os males daquela natureza, de abranda mento de todas as dores da alma, de iluminação de todos os cantos escuros do nosso jeito perdido de ser. O homem nada disse, levantou-se, caminhou em direção à porta e quando já estava saindo, virou-se, olhou o médico nos olhos e sentenciou: "não posso procurar o circo... aà está o meu problema: eu sou o palhaço".
Como professor vejo que, à s vezes, sou esse palhaço, alguém que trabalhou para construir os outros e não vê resultado muito claro daquilo que faz. Tenho a impressão que ensino no vazio (e sei que não estou só nesse sentimento) porque depois de formados meus ex-alunos parecem que se acostumam rapidamente com aquele mundo de iniqüidades que combatÃamos juntos. Parece que quando meus meninos(as) caem no mercado de trabalho a única coisa que importa é quanto cada um vai lucrar, não importando quem vai pagar essa conta e nem se alguém vai ser lesado nesse processo. Aprenderam rindo, mas não querem passar o riso à frente e nem se comovem com o choro alheio.
Digo isso, até em tom de desabafo, porque vejo que cada dia mais meus alunos se gabam de desonestidades. Os que passam os outros para trás são heróis e os que protestam são otários, idiotas ou excluÃdos, é uma total inversão dos valores. Vejo que alguns professores partilham das mesmas idéias e as defendem em sala de aula e na sala de professores e se vangloriam disso.
Essa idéia vem me assustando cada vez mais, desde que repreendi, numa conversa com alunos, o comportamento do cantor Zeca Pagodinho, no episódio da guerra das cervejas e quase todos disseram que o cantor estava certo, tontos foram os que confiaram nele. "O importante professor é que o cara embolsou milhões", disse-me um; outro: "daqui a pouco ninguém lembra mais, no Brasil é assim, e ele vai continuar sendo o Zeca, só que um pouco mais rico", todos se entreolharam e riram, só eu, bobo que sou, fiquei sem graça.
O pior é quando a gente se dá conta que no Brasil é assim mesmo, o que vale é a lei de Gérson: "o importante é levar vantagem em tudo". ( Lei de Gerson... dá para rir...) A pergunta é: é possÃvel, pela lógica, que todo mundo ganhe ? Para alguém ganhar é óbvio que alguém tem de perder. A lógica é guardar o troco a mais recebido no caixa do supermercado; é enrolar a aula fingindo que a matéria está sendo dada; é fingir que a apostila está aberta na matéria dada, mas usá-la como apoio enquanto se joga forca, batalha naval ou jogo da velha; é cortar a fila do cinema ou da entrada do show; é dizer que leu o livro, quando ficou só no resumo ou na conversa com quem leu; é marcar só o gabarito na prova em branco, copiado do vizinho, alegando que fez as contas de cabeça; é comprar na feira uma dúzia de quinze laranjas; é bater num carro parado e sair rápido antes que alguém perceba; é brigar para baixar o preço mÃnimo das refeições nos restaurantes universitários, para sobrar mais dinheiro para a cerveja da tarde; é arrancar as páginas ou escrever nos livros das bibliotecas públicas; é arrancar placas de trânsito e colocá-las de enfeite no quarto; é trocar o voto por empregos, pares de sapato ou cestas básicas; é fraudar propaganda polÃtica mostrando realizações que nunca foram feitas.
à a lógica da perpetuação da burrice. Quando um paÃs perde, todo mundo perde. E não adianta pensar que logo bateremos no fundo do poço, porque o poço não tem fundo. Parafraseando Schopenhauer: "Não há nada tão desgraçado na vida da gente que ainda não possa ficar pior".
Se os desonestos brasileiros voassem, nós nunca verÃamos o sol. Felizmente há os descontentes, os lutadores, os sonhadores, os que querem manter o sol aceso, brilhando e no alto. A luz é e sempre foi a metáfora da inteligência. No entanto, de nada adianta o conhecimento sem o caráter. Que nas escolas seja tão importante ensinar Literatura, Matemática ou História quanto decência, senso de coletividade, coleguismo e respeito por si e pelos outros. Acho que o mundo (e, sobretudo, o Brasil) precisa mais de gente honesta do que de literatos, historiadores ou matemáticos.
Ou o Brasil encontra e defende esses valores e abomina Zecas, Gérsons, Dudas e todos os marketeiros que chamam desonestidades flagrantes, de espertezas técnicas, ou o Brasil passa de paÃs do futuro para paÃs do só furo.
De um Presidente da República espera-se mais do que choro e condecoração a garis honestos, esperam-se honestidade em forma de trabalho e transparência. De professores, espera-se mais que discurso de bons modos, espera-se que mereçam o salário que ganham (pouco ou muito) agindo como quem é honesto. A honestidade não precisa de propaganda, nem de homenagens, precisa de exemplos. Quem plantar joio, jamais colherá trigo.
Quando reflexões assim são feitas cada um de nós se sente o palhaço perdido no palco das ilusões. A gente se sente vendendo o que não pode viver, não porque não mereça, mas porque não há ambiente para isso. Quando seria de se esperar uma vaia coletiva pelo tombo, pelo golpe dado na decência, na coerência, na credibilidade, no senso de respeito, vemos a população em coro delirante gritando "bis" e, como todos sabemos, um bis não se despreza.
Então, uma pirueta, duas piruetas, bravo ! bravo ! E vamos todos rindo e afinando o coro do: "se eu livrar a minha cara o resto que se dane".
Enquanto isso o Brasil de irmã Dulce, de Manuel Bandeira, do Betinho, de Clarice Lispector, de Chiquinha Gonzaga e de muitos outros heróis anônimos que diminuÃram a dor desse PaÃs com a sua obra, levanta-se, caminha em silêncio até a porta, vira-se e diz:
"Esse é o problema, eu sou o palhaço!"
* Nailor Marques Junior é professor universitário e autor de diversos livros na área de educação
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A “ética da conveniência” do brasileiro
Rudolfo Lago
Da equipe do Correio
Quem dançaria como a deputada Angela Guadagnin (PT-SP) se o corrupto absolvido fosse um parente próximo ou um amigo querido? Quem recusaria indignado o mensalão se tivesse de fato a oportunidade de ser um dos beneficiários da mesada do governo? Uma pesquisa do Ibope concluÃda no fim da semana passada mostra um triste quadro: o mesmo brasileiro que é por vezes crÃtico e rigoroso com a corrupção no poder público é frouxo quanto à sua própria ética no seu cotidiano e nas coisas que lhe afetam diretamente.
A extensa pesquisa, com mais de 300 páginas, foi apresentada pelo Ibope no 2º Congresso Brasileiro de Pesquisa na última quinta-feira. Com o tÃtulo de Corrupção na PolÃtica: Eleitor VÃtima ou Cúmplice?, o estudo ouviu 2.002 eleitores de 143 municÃpios entre os dias 12 e 16 de janeiro. A margem de acerto da pesquisa é de 95%. A pesquisa mostra a existência na sociedade de uma certa “ética da conveniência”: um rigor maior quando se fala do comportamento dos outros e uma certa frouxidão quanto ao próprio comportamento. Os problemas éticos não estariam concentrados apenas nas elites e lideranças polÃticas, mas seria um problema verificado em todas as camadas e grupos da sociedade.
A grande maioria dos brasileiros pesquisados (69%) confessa que já transgrediu alguma lei ou contrato para obter algum benefÃcio pessoal. São pessoas que, por exemplo, já aceitaram um desconto de seus médicos ou dentistas para não pegar o recibo e não declarar a consulta no imposto de renda. Ou que têm uma carteira de estudante falsa para pagar meia entrada em shows ou no cinema.
Transgressões
Diante de uma lista de 13 diferentes transgressões éticas, um percentual ainda maior (75%) dos entrevistados disse acreditar que poderia cometer pelo menos uma dessas irregularidades. Coisas como fazer ligação clandestina de TV a cabo, apresentar atestado médico falsificado para conseguir uma folga no trabalho ou comprar um produto sabendo que é roubado.
Alguns itens da lista receberam percentual bastante alto. Mais da metade dos entrevistados (55%) já comprou pelo menos uma vez um produto pirata. Propina para guarda de trânsito é coisa que 14% dos brasileiros, de acordo com a pesquisa, já fizeram.
Outra lista aponta mais ainda para a existência da tal “ética da conveniência”. Uma outra lista apontou 13 práticas comuns de corrupção polÃtica. Quase 60% (59%) dos entrevistados, se estivessem num cargo público, cometeriam nepotismo. E perto da metade (43%) se valeria de uma viagem de trabalho para, na verdade, fazer turismo.
Cúmplices da corrupção
Os mesmos brasileiros que condenam as atitudes dos governos e dos polÃticos cometem ou admitem ilicitudes na sua rotina no dia-a-dia
69% já transgrediram alguma lei ou descumpriram alguma regra contratual para obter vantagens de forma consciente e intencional
75% acreditam que cometeriam pelo menos um de 13 atos de corrupção avaliados pela pesquisa
55% compram sempre ou algumas vezes produtos piratas
15% pagam propina sempre ou algumas vezes a guardas de trânsito para se livrar de multa
57% escolheriam um parente ou uma pessoa conhecida para exercer cargo de confiança
41% se aproveitariam de uma viagem oficial para lazer próprio e de familiares
Fonte: Ibope
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2006-10-03 04:13:58
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answer #6
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answered by marcelo 1
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