Em O suicídio Durkheim põe à prova e aplica os princípios metodológicos escritos nas Regras do método sociológico (1895).
Seu estudo é um diagnóstico analítico das causas do mal estar geral pelo qual passava a Europa naquele momento, revelando a ruptura clara de laços sociais. Assim, a sua questão principal era responder que laços unem os indivíduos entre si.
Todavia, segundo Durkheim para entender a solidariedade há de se compreender seu oposto, isto é, a quebra total de vínculos.
Sua hipótese central é que a soma total dos suicídios em uma dada sociedade deve ser encarada como um fato que somente pode ser explicado na sua amplitude sociológica e não por motivos pessoais, em fim, o que é analisado é a sociedade e não o indivíduo.
Para ele o que caracteriza o fenômeno suicídio, enquanto, fato social é primeiro, sua "exterioridade em relação às consciências individuais", e pela "ação coercitiva que exerce ou é suscetível de exercer sobre essas mesmas consciências", portanto, o suicídio influencia o comportamento social do indivíduo levando-o a morte.
Sua posição metodológica consiste em discutir, de maneira inicial, as concepções vigentes que tratam do suicídio, para em seguida apresentar sua própria explicação com base especificamente sociológica.
Durkheim examina as duas causas extra-sociais que, a priori, exercem uma influência sobre a taxa de suicídios, isto é, as disposições orgânico-psiquicas e a natureza do meio físico. Sendo seu objetivo, analisar e descobrir se elas têm uma participação nos índices de suicídio e qual.
Seguindo seu método Durkheim apresenta a tese dos alienistas Esquirol, Falret e Moreau de Tours, segundo a qual o suicídio seria uma doença individual. Uma outra posição por ele abordada é a de Bourdin, que vê no suicídio um acontecimento de uma ou de varias espécies de loucuras.
Durkheim apresenta a seguinte questão: "Mas haverá uma loucura-suicídio?" (Durkheim, 2000: 34).
Naquele momento a terminologia tradicional da patologia mental, vê esses delírios como sendo monomanias:
"O monomaníaco é um doente cuja consciência é perfeitamente sã, salvo em um ponto; ele apresenta apenas uma tara, e nitidamente localizada. Por exemplo, em alguns momentos tem uma vontade irracional e absurda de beber, ou de roubar, ou de injuriar; mas todos os seus outros atos e pensamentos são de uma correção rigorosa." (Durkheim, 2000: 34)
Assim Durkheim questiona: Mas existirão monomanias? Sua resposta é clara, não, não há e não pode haver monomanias propriamente ditas. "Portanto, se não há monomanias, não pode haver uma monomania-suicídio e, por conseguinte, o suicídio não é uma loucura distinta" (Durkheim, 2000: 38).
No livro I, é eliminada qualquer dúvida com relação às causas extras do suicídio, conclui que tais explicações não contribuem para a compreensão do fenômeno suicídio.
Segundo Durkheim para descobrir se o suicídio é um ato particular aos alienados é preciso determinar as formas que ele assume na alienação mental e saber se os alienados são os únicos afetados pelo suicídio.
No livro II (Causas sociais e tipos sociais), capítulo I (Método para determiná-los), Durkheim apresenta sua tipologia do suicídio, segundo as causas sociais que são os tipos de suicídios egoísta, altruísta e anômico.
Segundo Durkheim, só pode haver tipos diferentes de suicídios na medida que as causas a que estão ligadas sejam diferentes. E para que cada uma tenha uma natureza própria, é necessário que tenha também, condições de existência que lhe seja específica. Assim, toda distinção específica constatada entre as causas, implica numa distinção semelhante entre os efeitos que o produzem.
Dessa forma ele primeiro examina quais são as condições sociais de que dependem, para depois, juntar essas condições segundo suas semelhanças e suas diferenças em um número de classes separadas, para só assim ter certeza que a cada uma dessas casses corresponderá a um tipo determinado de suicídio.
"Em suma, nossa classificação, em vez de ser morfológica será, já de início, etiológica. Aliás, não se trata de uma inferioridade, pois penetramos mais a natureza de um fenômeno quando sabemos sua causa do que quando conhecemos apenas suas características, mesmo que essenciais." (Durkheim, 2000: 168)
Para Durkheim, uma vez conhecida à natureza das causas, é possível tentar deduzir delas a natureza dos efeitos, ao mesmo tempo caracterizados e classificados, por serem vinculados a suas respectivas origens. A sua dedução se guia através de fatos, para não se perder em "fantasmas". Sua proposta é ir das causas aos efeitos, portanto, completa sua classificação etiológica com uma classificação morfológica.
Durkheim não perde de vista o que estuda, isto é, a taxa social dos suicídios. Pois, o que importa são os tipos que contribuem para formá-lo e em função dos quais ele varia. Para tal, ele assegura que para saber de que confluências diversas resultam o suicídio, enquanto fenômeno coletivo, é sob essa forma coletiva, isto é, através dos dados estatísticos, que devemos abordá-los de início. Durkheim parte, portanto, do todo para as partes, já que é a determinação das causa que ele busca, para depois, examinar como elas repercutem nos indivíduos.
A outra questão agora é, então como chegar às causas? A resposta é que devemos primeiro, remontar as causas mais próximas, para só então, recuar mais nas séries dos fenômenos. Embora, reconheça as dificuldades de se definira causa do fenômeno.
A certeza que podemos ter, na sua opinião, é que as causas sociais do suicídio não são as mesmas para uns e para outros. Assim, para descobrirmos quais as causas produtoras do suicídio devemos questionar quais são as situações dos diferentes meios sociais como a família, em função das quais o suicídio varia.
O primeiro resultado, segundo Durkheim, é que a tendência ao suicídio deve estar relacionada ao espírito de livre exame que anima o protestantismo. Pois, o livre exame tem como causa, a necessidade que os indivíduos têm de construir sua fé livremente, devido à "falência das crenças tradicionais".
O livre exame é por assim dizer, uma reflexão em relação às idéias e sentimentos que não mais servem para dirigir a conduta de um grupo. Durkheim concluiu que a superioridade do protestantismo em relação ao número de suicídios é motivada por ela ser uma religião não tão integrada quanto o catolicismo.
Da mesma forma a religião Judaica por ser concentrada, e pela intolerância que os ronda, na opinião de Durkheim, apresenta uma fraca tendência ao suicídio. Isso devido ao forte sentimento que existe entre seus adeptos, isto é, não há muito espaço para os julgamentos individuais, é o inverso do que acontece com o livre exame protestante.
Na sua pesquisa, a Inglaterra foi o país protestante que apresentou o menor índice de suicídios. Apesar da idéia de liberdade individual, o que ele observa, é uma lei que sanciona prescrições religiosas. Isto é, um tradicionalismo desenvolvido que restringe o movimento individual, e a hierarquização do clero bastante desenvolvida.
O caso Inglês comprova a teoria durkheimiana, pois, "Se lá o protestantismo não produz os mesmos efeitos que no continente, é porque a sociedade religiosa é muito mais solidamente constituída, e nesse sentido, aproxima-se da Igreja católica" (Durkheim, 2000: 191).
Portanto, se o enfraquecimento dos preceitos coletivos e costumeiros serve de inclinação ao suicídio e se é daí que provem a predisposição do protestantismo. Durrkheim comprova dois fatores; o primeiro, a inclinação pela instrução como um fator que se destaca entre os protestantes em relação aos católicos. Segundo essa inclinação abala as crenças comuns, refletindo os casos de suicídios.
Com relação a essa segunda questão, ficou constatado que os indivíduos se matam mais nas áreas não letradas como a Saxônia, onde o número de alunos é maior, que o número legalmente exigido na época. Isso explica, portanto, o caso Inglês que revela números menores de suicídios e iletrados.
Outros fatores como as profissões liberais, as classes mais abastadas e os que apresentam o gosto pela ciência, os profissionais liberais é o grupo que mais contribuiu para o numero de suicídios. Segundo Durkheim, na França, entre os anos 1826 e 1860 foram registrados 550 caso de suicídios por milhão, entre os indivíduos desse tipo de profissão.
Em resumo, o suicídio progride com a ciência, no entanto ela não é a causa, como demonstrou Durkheim no caso dos judeus. Pois, o fato dos judeus conseguirem se instruir sem se matarem tanto, é porque, afirma Durkheim:
"É uma lei geral que as minorias religiosas, para poderem resistir com maior segurança contra os ódios de que é objeto ou simplesmente em conseqüência de uma espécie de emulação, esforçam-se para serem superiores, quando ao saber, às populações que as cercam." (2000: 199)
Após uma analise crítica dos trabalhos referentes à influência do estado civil e o sexo do indivíduo sobre o suicídio Durkheim elaborar algumas leis; a primeira se refere ao casamento precoce, que exerce uma influência sobre o suicídio principalmente entre os homens. A segunda se refere ao fato que a partir dos 20 anos de idade, os casados de ambos os sexos se beneficiam de um coeficiente de preservação com relação aos solteiros.
A terceira lei, afirma que o coeficiente de preservação dos casados em relação aos solteiros varia de acordo com os sexos.
Portanto, o suicídio depende principalmente de causa exteriores (fatos sociais). A conclusão durkheimiana é a seguinte; "o suicídio varia na razão inversa do grau de integração dos grupos sociais de que o indivíduo faz parte" (Durkheim, 2000: 258).
Dessa maneira, o Egoísmo é o estado em que o eu individual se afirma excessivamente diante do eu social e às expensas deste último, então, o suicídio egoísta é todo suicídio que resulta de uma individualização descomedida.
Para Durkheim foi ação da sociedade que despertou no indivíduo os sentimentos de simpatia e solidariedade que os remetes aos outros, no sentido religioso, político e moral, que os orienta em termos de comportamentos, já que tem origem coletiva essas formas superiores da atividade humana têm um fim social também. Como tem origem na sociedade, é a ela que se remetem, é a sociedade encarnada e individualizada em cada um dos indivíduos.
Assim, quando não sentimos a sociedade "viva e ativa em tornos e acima de nós, o que há de social em nós se vê desprovido de todo fundamento objetivo" (Durkheim, 2000: 264).
Se o egoísmo é a causa que leva o indivíduo ao suicídio, "[...] é porque o próprio vínculo que o liga a sociedade se afrouxou" (Durkheim, 2000: 265).
No caso do suicídio altruísta a sociedade determina formalmente o individuo abandoná-la. É com o objetivo social que a sociedade o obriga ao sacrifício, "é preciso que o destino de um seja o destino de todos" (Durkheim, 2000: 273).
Se um indivíduo em um grupo ameaça à sobrevivência desse grupo, este não contará com o vigor de uma divindade que se encontra doente. Daí a necessidade da morte com vistas ao bem comum.
No entanto, só é possível tal feito se a personalidade individual tiver pouca importância. A individuação fraca que por sua vez, tem como causa o fato dele ser totalmente absorvido pelo grupo, e que este seja totalmente integrado, assim, as partes terão pouca existência própria.
Essa questão da coesão foi trabalhada melhor, por Durkheim na sua obra Da divisão do trabalho social, pois, na sociedade orgânica tudo é comum a todos.
O que distingue o suicídio egoísta do suicídio altruísta é que o primeiro marcado por um forte traço de individuação, ao paço que o segundo a individuação é muito fraca. Quando a sociedade impõe ao individuo o dever de se suicidar, trata-se do suicídio altruísta obrigatório.
O suicídio altruísta facultativo é aquele que se caracteriza por não ser expressamente exigido pela sociedade do que aqueles que são estritamente obrigatórios. Além destas duas variações de suicídios, existem, segundo o autor, outros casos em que o altruísmo leva ao suicídio méis diretamente e com maior violência.
No caso onde a impessoalidade se eleva ao extremo, isto é, o suicídio altruísta em estado agudo, para Durkheim, "Não há suicídios cujo caráter altruísta seja mais marcante" (Durkheim, 2000: 280).
Se por um lado, o tipo egoísta é marcado por ser triste, pois, "não vê nada real no mundo a não ser o indivíduo" (Durkheim, 2000: 281). Por outro, a tristeza do altruísta é devido o indivíduo parecer destruído de toda a realidade. Assim, o suicida egoísta se sente inútil, e o altruísta tem um objetivo, fora desta vida.
Para Durkheim "A diferença de causas, assim, se encontra nos efeitos e a melancolia de um é de natureza completamente diferente da melancolia do outro" (Durkheim, 2000: 281).
Por fim, fica evidente que Durkheim constata que o suicídio altruísta se manifesta em três variedades diferentes que são, o obrigatório, facultativo e o agudo.
A sociedade não apenas atraí os sentimentos e a atividade dos indivíduos, "também é um poder que os regula" (Durkheim, 2000: 303). É fato notório para Durkheim, que as crises exerçam uma influência sobre a tendência ao suicídio.
Há também uma relação entre a maneira pela qual se exerce essa ação reguladora e a taxa social dos suicídios.
Logo, questionou Durkheim, então a que essas crises devem sua influência? Segundo ele, não é o aumento da miséria que provoca o aumento dos suicídios, e menos ainda as crises favoráveis.
"Se, portanto, as crises ou financeiras aumentam os suicídios, não é por empobrecerem, uma vez que crises de prosperidade têm o mesmo efeito, é por serem crises, ou seja, perturbações da ordem coletiva." (Durkheim, 2000: 311)
Dessa forma sempre há um desequilíbrio do corpo social os homens se matam com mais freqüência. E por que isso é possível? É outra questão por ele levantada.
A resposta de Durkheim é a seguinte afirmação: "tendências que não são satisfeitas se atrofiam e, como a tendência a viver não é mais que a resultante de todas as outras, ela não pode deixar de se enfraquecer quando as outras se afrouxam" (Durkheim, 2000: 311-312).
Portanto, a anomia é na sociedade moderna um fator regulador e específico de suicídios, isto é, é uma das fontes que contribuem para o numero anual, onde segundo o autor, o suicídio anômico difere dos demais, pois, não depende da maneira pela qual os indivíduos estão ligados à sociedade e sim, do modo pelo qual ela os regulamenta.
O suicídio egoísta e o anômico, ambos têm origem no fato da sociedade não estar presente de forma suficiente na vida dos indivíduos. No entanto, a esfera da qual ela se faz ausente não é a mesma nos dois casos, segundo o autor, pois, no caso do suicídio egoísta ela se destaca pela ausência da vida coletiva, no caso do anômico ela fala às paixões individuais. Logo, ele concluiu que apesar das relações eles independem um do outro.
Conclusão
Ao buscar o elemento social do suicídio no livro III Durkheim rejeita as explicações que atribuem uma maior influencia as condições individuais, e menos aquelas que se baseiam no meio físico como tendo ação sobre o sistema nervoso, com raça, e o clima, expressas no Livro I.
O suicídio é um trabalho que buscou na natureza das próprias sociedades as causas que cada uma delas tem para esse fenômeno.
Só diante destas leis reais, foi possível classificar através de um método (comparativo) os tipos de suicídios.
O resultado de sua pesquisa, é que a taxa de suicídios só se explica sociologicamente:
"É a constituição moral da sociedade que estabelece, a cada instante, o contingente de mortes voluntárias. Existe, portanto, para cada povo, uma força coletiva, de energia determinada, que leva os homens a se matar" (Durkheim, 2000: 384)
E não é por metáfora, essa expressão tem como base à natureza das crises. E o que a forma, são o egoísmo e o altruísmo, são elas, ao penetrarem no individuo, que os impõem que se matem.
Se por um lado, o suicídio tem origem na constituição moral dos grupos, por outro, Durkhreim questiona: "como é possível, se apenas indivíduos estão envolvidos?" (Durkheim, 2000: 397).
Para ele é devido a uma ação moral permanente de origem impessoal que está acima de todos os casos particulares. Pois, essas tendências coletivas são forças reais e exterior ao indivíduo.
E como forças morais, são também necessariamente sociais, enquanto, um conjunto de energia que nos determina a agir de fora.
"Com efeito, sabe-se hoje que o eu é a resultante de uma multiplicidade de consciências sem eu: que cada uma dessas consciências elementares é por sua vez, o produto de unidades vitais sem consciências, assim como cada unidade vital se deve a uma associação de partículas inanimadas." (Durkheim, 2000: 412)
espero q te ajude...
bjim
2006-10-03 03:08:12
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answer #2
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answered by moa_9 2
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