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O DOSSIÊ SERRA E O DOSSIÊ DANTAS
26/09/2006 09:02h
Samuel Possebon*
De todo o episódio recente envolvendo o tal dossiê sobre o Serra, a entrevista dada pelos Vedoin à Revista IstoÉ, a prisão de pessoas ligadas ao PT que aparentemente comprariam um vídeo e fotos relacionando o tucano ao caso dos sanguessugas, a cobertura da imprensa que se seguiu ao caso, o comportamento da Polícia Federal, do ministro Márcio Thomaz Bastos, do presidente Lula etc, o que mais chama a atenção em tudo isso é como a memória recente de todos parece estar apagada. Não sei se por medo, por simples esquecimento ou pela proximidade da eleição, o fato é que um episódio idêntico, ocorrido em maio, deve tratamento totalmente diverso, por parte de todos os personagens. No centro do episódio esquecido está Daniel Dantas.
Recordando: no dia 14 de maio a revista Veja publicou uma matéria "bombástica" sobre supostas contas de Lula, Márcio Thomaz Bastos, Paulo Lacerda (diretor geral da Polícia Federal), Antônio Palocci, José Dirceu e Luiz Gushiken no exterior. Ah, sim, Romeu Tuma também estava no bolo. A revista Veja revelou que recebera o dossiê sobre o caso de Daniel Dantas (em uma pé**** do jornalismo investigativo, a revista admite que não conseguiu comprovar a autenticidade dos documentos, mas decidiu publicá-los mesmo assim). Dantas foi entrevistado, na mesma edição, por Diogo Mainardi. Acusou o governo, disse que foi extorquido (coisa que havia negado à CPMI dos Correios e do Mensalão). A entrevista, aliás, se encaixava em um contexto: na mesma época, o senador Arthur Virgílio abastecia a imprensa com um depoimento dado pela irmã de Daniel Dantas, Verônica, à Justiça de Nova York, dizendo ter sofrido achaque por parte do PT. Dantas desmentiu ter passado qualquer informação para Veja, mas uma semana depois a revista reafirmou que recebeu o dossiê de Dantas. Ficou por isso mesmo.
Lula reagiu ao dossiê e às denúncias da Veja. Declarou-se indignado. Thomaz Bastos também. Lacerda, da Polícia Federal, mandou investigar o caso. Na imprensa, a cobertura foi tímida. Ninguém criticou a Veja, ninguém acusou a revista de ter sido comprada. Poucos a condenaram por ter publicado a história sem comprová-la.
Mas os absurdos não acabaram por aí. Márcio Thomaz Bastos, o ministro "difamado", aceitou se encontrar com Daniel Dantas, o semeador do dossiê segundo a própria Veja, na casa do senador Heráclito Fortes (PFL do Piauí). O ministro da Justiça foi ao encontro do banqueiro acompanhado dos parlamentares Sigmaringa Seixas e José Eduardo Cardozo! Dantas disse que foi pedir desculpas, dizer que nada tinha a ver com o caso do dossiê sobre as supostas contas de Lula, Bastos e cia. Disse que tudo foi uma invenção da Veja. Bastos tentou esconder o encontro. Só o admitiu depois que a própria Veja revelou a manobra. Oficialmente, o ministro disse que leu as desculpas de Dantas, mas não lhe deu nenhuma garantia. O caso, afirmou MTB, estava nas mães da Polícia Federal.
O caso do dossiê das supostas contas no exterior de Lula esfriou rapidamente, como tudo que envolve Daniel Dantas. A PF não disse mais nada sobre como andam as investigações. A imprensa também não cobrou. Até a convocação de Dantas para ir à CPI dos Bingos prestar esclarecimentos foi abortada, inclusive com o apoio do senador Arthur Virgílio e da base do governo.
Qual a semelhança entre o caso daquele dossiê, plantado bem no começo da campanha e o atual dossiê sobre Serra, que tanta dor de cabeça tem causado ao governo e a Lula?
Antes é preciso responder a uma pergunta: em maio, Dantas agia apenas em defesa de seus interesses, sem nenhuma preocupação eleitoral, ou sua manobra, plantando um dossiê contra Lula, tinha algum objetivo político?
Difícil dizer. Fato é que o PFL é seu partido no Congresso. ACM é seu amigo, não é preciso entrar em detalhes. Heráclito Fortes é amigo de seu sócio e ex-cunhado Carlos Rodemburgo. O senador do PFL do Piauí voou nos aviões da Brasil Telecom quando Dantas mandava na empresa (ele mesmo admitiu isso à Carta Capital e ao O Globo). Foram não duas nem três vezes, mas "uns 10% de um total de 58 viagens", segundo Heráclito Fortes. Os jatinhos da Brasil Telecom fizeram, então, 58 viagens de Brasília para o Piauí, onde, sabe-se, a Brasil Telecom não tem clientes nem atividades comerciais. O senador do PFL de Santa Catarina Jorge Bornhausen também andou nos jatinhos de Dantas, como ele mesmo admitiu. E ainda conseguiu que "populares" de Santa Catarina entrassem com ações na Justiça quando Daniel Dantas foi demitido pelos fundos de pensão e pelo Citibank do conjunto de empresas cuja administração coube a ele após as privatizações do governo FHC. Ou seja, Bornhausen ajudou Dantas a se defender. E as vinculações entre o PFL e Dantas não param por aí. O deputado do PFL do Distrito Federal, Alberto Fraga, defende interesses junto ao Tribunal de Contas da União que são, não por acaso, exatamente os interesses de Dantas. São representações no TCU sobre temas complexos como um tal de "acordo de put" e contra o "acordo umbrella". Temas tão complexos que nem o deputado sabe explicar direito. Mesmo assim, suas representações estão lá, servindo aos interesses do Opportunity.
Isso para não citar o esforço da tropa pefelista para que Dantas se livrasse do relatório final da CPMI dos Correios, onde acabou apontado como um dos abastecedores do mensalão.
Questões familiares são sempre evitadas em eleições. Mas não se pode deixar de lembrar que Verônica Dantas, irmã e preposta de Daniel Dantas em diversas operações, foi sócia da filha de José Serra, Verônica Serra, na Decidir.com. Isso está documentado, conforme já mostrou a Carta Capital. Serra e o PSDB tiveram como tesoureiro em campanhas passadas Ricardo Sérgio de Oliveira, aquele do "limite da irresponsabilidade", o homem que, como diretor do Banco do Brasil (veja que o aparelhamento não é algo exatamente novo no BB), conseguiu cartas de garantia para Dantas participar do leilão da Telebrás. Foi ele também o homem que conseguiu convencer a Previ a dar um cheque em branco para Dantas administrar seus investimentos na época da privatização das teles.
O PFL e o PSDB, enfim, são umbilicalmente ligados a Dantas e, portanto, o dossiê plantado por Dantas contra Lula poderia, muito bem, atender aos interesses dos dois maiores partidos da oposição.
Comparando as semelhanças entre o dossiê de maio, sobre as contas de Lula e petistas, e o dossiê de setembro, sobre Serra, notam-se semelhanças. A primeira é o fato de os dossiês visarem atingir alguém no centro do processo eleitoral, o que é tão grave agora quanto foi em maio. Em maio, houve uma matéria em uma revista de grande circulação nacional, assim como agora. Mudaram apenas as publicações. Em maio, o semeador do dossiê era uma pessoa com nítidas vinculações partidárias. Agora são petistas de carteirinha, com circulação no governo e proximidade de Lula. Não dá para dizer que Dantas tenha operador por conta própria, assim como é possível supor que o comando da campanha de Lula tenha sabido do dossiê contra Serra.
Mas as semelhanças param por aí. Lula condenou o recente dossiê contra Serra, disse que a atitude é "abominável" e lembrou inclusive já ter sido vítima desse tipo de manobra em outras eleições. Mas, curiosamente, não disse que foi vítima de um dossiê nessa eleição, em maio. Por que razão? Thomaz Bastos também criticou a existência do dossiê contra Serra. Mas, assim como Lula, não lembrou do dossiê que Dantas plantou na Veja em maio. Aliás, nem Thomaz Bastos, nem nenhum jornal, blog ou colunista lembraram do episódio.
Pode-se dizer que o dossiê das contas de Lula era uma clara montagem, que sequer merecia menção. Mas e daí? Mais uma razão para investigar. Além do absurdo em si da divulgação de um dossiê, ainda há a falsificação de informações para prejudicar alguém (o que, aliás, parece não ter acontecido nesse dossiê contra Serra).
O mais surpreendente é que, lá atrás, Thomaz Bastos aceitou o pedido de desculpas de Dantas, foi até a casa de Heráclito Fortes conversar com o semeador de dossiês, acompanhado de dois importantes petistas. Ficou por isso mesmo.
Será que dá para imaginar Valdebran Padilha, Gedimar Passos, Osvaldo Bargas, Jorge Lorenzetti, o tal do Freud Godoy ou mesmo o Ricardo Berzoini pedindo para ter um encontro com José Serra na casa, digamos, da senadora Ideli Salvatti, para pedir desculpas e dizer que nada têm a ver com o dossiê? E será que Serra, na remota hipótese de aceitar o convite, levaria consigo dois importantes parlamentares de seu partido, digamos, o deputado Alberto Goldman e o senador Arthur Virgílio? Pouco provável, e olhe que Serra é só um candidato, não é ministro da Justiça.
Já a Polícia Federal, que eficientemente abortou a "operação tabajara" do dossiê contra Serra, está andando rápido com as investigações. Todos os envolvidos já foram ouvidos em depoimento. O Ministério Público do Mato Grosso pressiona. Tudo tem que estar resolvido até o dia 1º de outubro, sob pena de que o Brasil eleja um presidente que "pode estar envolvido" em um caso de armação de um dossiê. Mas onde estão a mesma Polícia Federal e o mesmo Ministério Público para investigar se: 1) o dossiê de Dantas era verdadeiro ou não e; 2) para investigar a serviço de quem estava Dantas quando plantou o dossiê na Veja, em maio? Lula e Thomaz Bastos deveriam também esbravejar, mas não o fazem.
No caso do dossiê de Dantas, também parece que há uma investigação em curso, andando bem lentamente, assim como as outras investigações na PF contra o banqueiro (Caso Kroll, privatização da Telebrás etc). Mesmo assim, ninguém sabe nada sobre o que se passa. A imprensa nunca mais tratou do caso, nem o governo parece dar muita bola. Alguém se lembra quando foi e o que disse Dantas em algum depoimento à Polícia Federal sobre o dossiê das contas? Eu não.
A comparação dos dois episódios mostra ou que a oposição e a imprensa têm memória curta, ou que o governo continua tendo medo de Dantas, ou ambos. O banqueiro já mandou espionar gente do governo, criou inúmeros problemas para os fundos de pensão (públicos), denunciou ter sido achacado pelo PT depois de ter dito à CPI que nada sabia (os Vedoin também negaram o envolvimento de Serra no caso das ambulâncias, depois mudaram a versão para a IstoÉ), plantou dossiê contra o presidente da República, o diretor da Polícia Federal, o ministro da Justiça, e mesmo assim recebe tratamento, no mínimo, carinhoso do governo. Qual o medo? Dantas seria um Toninho da Barcelona de luxo, e poderia falar algo sobre contas de políticos no exterior? Dantas seria um novo Marcos Valério, e poderia falar algo sobre as fontes do mensalão? E a mídia, por que só fala de um dossiê e nem lembra de citar Dantas? Ele é tão plantador de dossiês como o Freud, o Valdebran ou qualquer outro petista envolvido no caso atual, certo? Dantas, por acaso, é apenas um empresário polêmico, sem vínculos partidários? Enfim, pelo visto, ninguém quer mexer com Dantas.
(*) Samuel Possebon é repórter da Teletime
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O DOSSIÊ SERRA E O DOSSIÊ DANTAS
26/09/2006 09:02h
Samuel Possebon*
De todo o episódio recente envolvendo o tal dossiê sobre o Serra, a entrevista dada pelos Vedoin à Revista IstoÉ, a prisão de pessoas ligadas ao PT que aparentemente comprariam um vídeo e fotos relacionando o tucano ao caso dos sanguessugas, a cobertura da imprensa que se seguiu ao caso, o comportamento da Polícia Federal, do ministro Márcio Thomaz Bastos, do presidente Lula etc, o que mais chama a atenção em tudo isso é como a memória recente de todos parece estar apagada. Não sei se por medo, por simples esquecimento ou pela proximidade da eleição, o fato é que um episódio idêntico, ocorrido em maio, deve tratamento totalmente diverso, por parte de todos os personagens. No centro do episódio esquecido está Daniel Dantas.
Recordando: no dia 14 de maio a revista Veja publicou uma matéria "bombástica" sobre supostas contas de Lula, Márcio Thomaz Bastos, Paulo Lacerda (diretor geral da Polícia Federal), Antônio Palocci, José Dirceu e Luiz Gushiken no exterior. Ah, sim, Romeu Tuma também estava no bolo. A revista Veja revelou que recebera o dossiê sobre o caso de Daniel Dantas (em uma pé**** do jornalismo investigativo, a revista admite que não conseguiu comprovar a autenticidade dos documentos, mas decidiu publicá-los mesmo assim). Dantas foi entrevistado, na mesma edição, por Diogo Mainardi. Acusou o governo, disse que foi extorquido (coisa que havia negado à CPMI dos Correios e do Mensalão). A entrevista, aliás, se encaixava em um contexto: na mesma época, o senador Arthur Virgílio abastecia a imprensa com um depoimento dado pela irmã de Daniel Dantas, Verônica, à Justiça de Nova York, dizendo ter sofrido achaque por parte do PT. Dantas desmentiu ter passado qualquer informação para Veja, mas uma semana depois a revista reafirmou que recebeu o dossiê de Dantas. Ficou por isso mesmo.
Lula reagiu ao dossiê e às denúncias da Veja. Declarou-se indignado. Thomaz Bastos também. Lacerda, da Polícia Federal, mandou investigar o caso. Na imprensa, a cobertura foi tímida. Ninguém criticou a Veja, ninguém acusou a revista de ter sido comprada. Poucos a condenaram por ter publicado a história sem comprová-la.
Mas os absurdos não acabaram por aí. Márcio Thomaz Bastos, o ministro "difamado", aceitou se encontrar com Daniel Dantas, o semeador do dossiê segundo a própria Veja, na casa do senador Heráclito Fortes (PFL do Piauí). O ministro da Justiça foi ao encontro do banqueiro acompanhado dos parlamentares Sigmaringa Seixas e José Eduardo Cardozo! Dantas disse que foi pedir desculpas, dizer que nada tinha a ver com o caso do dossiê sobre as supostas contas de Lula, Bastos e cia. Disse que tudo foi uma invenção da Veja. Bastos tentou esconder o encontro. Só o admitiu depois que a própria Veja revelou a manobra. Oficialmente, o ministro disse que leu as desculpas de Dantas, mas não lhe deu nenhuma garantia. O caso, afirmou MTB, estava nas mães da Polícia Federal.
O caso do dossiê das supostas contas no exterior de Lula esfriou rapidamente, como tudo que envolve Daniel Dantas. A PF não disse mais nada sobre como andam as investigações. A imprensa também não cobrou. Até a convocação de Dantas para ir à CPI dos Bingos prestar esclarecimentos foi abortada, inclusive com o apoio do senador Arthur Virgílio e da base do governo.
Qual a semelhança entre o caso daquele dossiê, plantado bem no começo da campanha e o atual dossiê sobre Serra, que tanta dor de cabeça tem causado ao governo e a Lula?
Antes é preciso responder a uma pergunta: em maio, Dantas agia apenas em defesa de seus interesses, sem nenhuma preocupação eleitoral, ou sua manobra, plantando um dossiê contra Lula, tinha algum objetivo político?
Difícil dizer. Fato é que o PFL é seu partido no Congresso. ACM é seu amigo, não é preciso entrar em detalhes. Heráclito Fortes é amigo de seu sócio e ex-cunhado Carlos Rodemburgo. O senador do PFL do Piauí voou nos aviões da Brasil Telecom quando Dantas mandava na empresa (ele mesmo admitiu isso à Carta Capital e ao O Globo). Foram não duas nem três vezes, mas "uns 10% de um total de 58 viagens", segundo Heráclito Fortes. Os jatinhos da Brasil Telecom fizeram, então, 58 viagens de Brasília para o Piauí, onde, sabe-se, a Brasil Telecom não tem clientes nem atividades comerciais. O senador do PFL de Santa Catarina Jorge Bornhausen também andou nos jatinhos de Dantas, como ele mesmo admitiu. E ainda conseguiu que "populares" de Santa Catarina entrassem com ações na Justiça quando Daniel Dantas foi demitido pelos fundos de pensão e pelo Citibank do conjunto de empresas cuja administração coube a ele após as privatizações do governo FHC. Ou seja, Bornhausen ajudou Dantas a se defender. E as vinculações entre o PFL e Dantas não param por aí. O deputado do PFL do Distrito Federal, Alberto Fraga, defende interesses junto ao Tribunal de Contas da União que são, não por acaso, exatamente os interesses de Dantas. São representações no TCU sobre temas complexos como um tal de "acordo de put" e contra o "acordo umbrella". Temas tão complexos que nem o deputado sabe explicar direito. Mesmo assim, suas representações estão lá, servindo aos interesses do Opportunity.
Isso para não citar o esforço da tropa pefelista para que Dantas se livrasse do relatório final da CPMI dos Correios, onde acabou apontado como um dos abastecedores do mensalão.
Questões familiares são sempre evitadas em eleições. Mas não se pode deixar de lembrar que Verônica Dantas, irmã e preposta de Daniel Dantas em diversas operações, foi sócia da filha de José Serra, Verônica Serra, na Decidir.com. Isso está documentado, conforme já mostrou a Carta Capital. Serra e o PSDB tiveram como tesoureiro em campanhas passadas Ricardo Sérgio de Oliveira, aquele do "limite da irresponsabilidade", o homem que, como diretor do Banco do Brasil (veja que o aparelhamento não é algo exatamente novo no BB), conseguiu cartas de garantia para Dantas participar do leilão da Telebrás. Foi ele também o homem que conseguiu convencer a Previ a dar um cheque em branco para Dantas administrar seus investimentos na época da privatização das teles.
O PFL e o PSDB, enfim, são umbilicalmente ligados a Dantas e, portanto, o dossiê plantado por Dantas contra Lula poderia, muito bem, atender aos interesses dos dois maiores partidos da oposição.
Comparando as semelhanças entre o dossiê de maio, sobre as contas de Lula e petistas, e o dossiê de setembro, sobre Serra, notam-se semelhanças. A primeira é o fato de os dossiês visarem atingir alguém no centro do processo eleitoral, o que é tão grave agora quanto foi em maio. Em maio, houve uma matéria em uma revista de grande circulação nacional, assim como agora. Mudaram apenas as publicações. Em maio, o semeador do dossiê era uma pessoa com nítidas vinculações partidárias. Agora são petistas de carteirinha, com circulação no governo e proximidade de Lula. Não dá para dizer que Dantas tenha operador por conta própria, assim como é possível supor que o comando da campanha de Lula tenha sabido do dossiê contra Serra.
Mas as semelhanças param por aí. Lula condenou o recente dossiê contra Serra, disse que a atitude é "abominável" e lembrou inclusive já ter sido vítima desse tipo de manobra em outras eleições. Mas, curiosamente, não disse que foi vítima de um dossiê nessa eleição, em maio. Por que razão? Thomaz Bastos também criticou a existência do dossiê contra Serra. Mas, assim como Lula, não lembrou do dossiê que Dantas plantou na Veja em maio. Aliás, nem Thomaz Bastos, nem nenhum jornal, blog ou colunista lembraram do episódio.
Pode-se dizer que o dossiê das contas de Lula era uma clara montagem, que sequer merecia menção. Mas e daí? Mais uma razão para investigar. Além do absurdo em si da divulgação de um dossiê, ainda há a falsificação de informações para prejudicar alguém (o que, aliás, parece não ter acontecido nesse dossiê contra Serra).
O mais surpreendente é que, lá atrás, Thomaz Bastos aceitou o pedido de desculpas de Dantas, foi até a casa de Heráclito Fortes conversar com o semeador de dossiês, acompanhado de dois importantes petistas. Ficou por isso mesmo.
Será que dá para imaginar Valdebran Padilha, Gedimar Passos, Osvaldo Bargas, Jorge Lorenzetti, o tal do Freud Godoy ou mesmo o Ricardo Berzoini pedindo para ter um encontro com José Serra na casa, digamos, da senadora Ideli Salvatti, para pedir desculpas e dizer que nada têm a ver com o dossiê? E será que Serra, na remota hipótese de aceitar o convite, levaria consigo dois importantes parlamentares de seu partido, digamos, o deputado Alberto Goldman e o senador Arthur Virgílio? Pouco provável, e olhe que Serra é só um candidato, não é ministro da Justiça.
Já a Polícia Federal, que eficientemente abortou a "operação tabajara" do dossiê contra Serra, está andando rápido com as investigações. Todos os envolvidos já foram ouvidos em depoimento. O Ministério Público do Mato Grosso pressiona. Tudo tem que estar resolvido até o dia 1º de outubro, sob pena de que o Brasil eleja um presidente que "pode estar envolvido" em um caso de armação de um dossiê. Mas onde estão a mesma Polícia Federal e o mesmo Ministério Público para investigar se: 1) o dossiê de Dantas era verdadeiro ou não e; 2) para investigar a serviço de quem estava Dantas quando plantou o dossiê na Veja, em maio? Lula e Thomaz Bastos deveriam também esbravejar, mas não o fazem.
No caso do dossiê de Dantas, também parece que há uma investigação em curso, andando bem lentamente, assim como as outras investigações na PF contra o banqueiro (Caso Kroll, privatização da Telebrás etc). Mesmo assim, ninguém sabe nada sobre o que se passa. A imprensa nunca mais tratou do caso, nem o governo parece dar muita bola. Alguém se lembra quando foi e o que disse Dantas em algum depoimento à Polícia Federal sobre o dossiê das contas? Eu não.
A comparação dos dois episódios mostra ou que a oposição e a imprensa têm memória curta, ou que o governo continua tendo medo de Dantas, ou ambos. O banqueiro já mandou espionar gente do governo, criou inúmeros problemas para os fundos de pensão (públicos), denunciou ter sido achacado pelo PT depois de ter dito à CPI que nada sabia (os Vedoin também negaram o envolvimento de Serra no caso das ambulâncias, depois mudaram a versão para a IstoÉ), plantou dossiê contra o presidente da República, o diretor da Polícia Federal, o ministro da Justiça, e mesmo assim recebe tratamento, no mínimo, carinhoso do governo. Qual o medo? Dantas seria um Toninho da Barcelona de luxo, e poderia falar algo sobre contas de políticos no exterior? Dantas seria um novo Marcos Valério, e poderia falar algo sobre as fontes do mensalão? E a mídia, por que só fala de um dossiê e nem lembra de citar Dantas? Ele é tão plantador de dossiês como o Freud, o Valdebran ou qualquer outro petista envolvido no caso atual, certo? Dantas, por acaso, é apenas um empresário polêmico, sem vínculos partidários? Enfim, pelo visto, ninguém quer mexer com Dantas.
(*) Samuel Possebon é repórter da Teletime
2006-09-26 06:44:32
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answer #2
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answered by Anonymous
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