O texto a seguir não é de minha autoria, apenas o transcrevo. Concordo com seu conteúdo.
A Montanha Pariu um Rato
Roberto Ponciano
Lênin adorava usar esta figura de estilo para ilustrar grandes farsas
históricas cuja sombra eram maior do que sua representação real. Um quase
sinônimo de o rei esta nu. Depois de um fenomenal estrondo, de dores sem
fim, de demonstrações ribombantes de que algo novo surgiria, eis que a
montanha política brasileira pariu um rato, no caso, um camundongo mesmo, a
candidatura sem rumo da ferocíssima senadora Heloísa Helena.
Marx gostava de dizer que a história não se repetia, acontecia a primeira
vez como tragédia (Napoleão Bonaparte), a segunda como farsa (Luís
Napoleão). Assim, quando um pequeno grupo de dissidentes saiu do Partido dos
Trabalhadores, tentando retomar e refundar o PT em sua proposta original,
ficava claro que a pretensão daria com os burros n´água.
O PT, com todos os seus erros e acertos (e aqui fala um não petista) nasceu
diretamente do movimento social brasileiro, dos movimentos de luta e
resistência contra a ditadura, dos movimentos sociais e sindicais de
resistência e renovação, da greve dos 100 mil, da dissidência intelectual
que não se via representada no pensamento do PCB ou do PC do B. Em suma, o
PT representou uma necessidade histórica da luta política do país, uma arma
de resistência e de renovação, que daria frutos durante os 20 anos seguidos.
Já o PSOL nasceria de uma crise de consciência e de uma pequena dissidência,
cujo pensamento político programático encontra cópia fiel dentro do Partido
dos Trabalhadores. A dissidência era muito mais "moral" e por conta de luta
por hegemonia no aparelho de partido do que propriamente por uma programa
diferenciado de construção de um projeto de país.
Quem acompanha os discursos de Lula e de Heloísa Helena vê claramente que,
tirando a proposta de redução imediata de juros e crescimento de 7% ao ano,
no lugar de 3,5%, não há praticamente diferenças entre os candidatos e,
quando há, a diferença é a favor de Lula (política externa, relação com os
movimentos sociais, questão de gênero). Heloísa Helena seria a cópia
feminina de Lula, com uma linguagem mais agressiva e com o guarda-roupa de
personagem de revista em quadrinhos (aquele que não muda, faça frio ou
calor, alguém lembra do armário da Mônica e seus 300 vestidinhos vermelhos?
Como não pensar nele ao ver as blusinhas sempre iguais da candidata?).
O PSOL, desde o seu nascedouro, não passa de uma fotocópia diminuída do PT,
com todos os equívocos do Partido dos Trabalhadores e eivado de alguma das
qualidades (como a articulação com o movimento social e sindical). O
programa é parecidíssimo, a ideologia dominante, social democrata e
reformista é igualzinha, até as alas radicais, trotskystas e marxistas,
existem em um e outro partido. Com este perfil é impossível para o PSOL
crescer enquanto o PT existir.
Se nasceu de um momento de indignação com a reforma neo-liberal da
previdência, posta em execução pelo governo Lula, o PSOL parou aí. Não foi
capaz de gerar uma única proposta viável de programa e de luta e muitas
vezes esteve à direita do governo Lula (como na PEC02 - o trem da alegria
dos requisitados do funcionalismo público, defendido em plenário pela líder
do partido, Luciana Genro - na questão da Bolívia - HH só faltou defender a
invasão do país vizinho!, na relação com Chaves - comparado, de forma
disparatada, por HH com Bush).
O que começou como um protesto virou um palanque moralista e eleitoreiro,
uma espécie de neo-UDN de esquerda, capaz de votar e apoiar discursos de
direita na luta pelo impeachment do presidente Lula, sem conseguir entender
que naquele momento esta manobra favorecia o PSDB-PFL.
A tão propalada Frente de Esquerda não passou de um slogan, foi abortada, em
primeiro lugar quando o PSTU foi proibido de entrar e fazer parte do PSOL (o
partido reproduzia a expulsão da Convergência Socialista do PT, só que,
agora, logo em seu nascedouro, o PSTU não foi expulso, foi barrado), e, logo
em seguida, quando o PSOL negou-se a ter um vice do PCB ou do PSTU ou mesmo
no fato de não existir um programa (até a data de hoje, 18 de setembro de
2006) de governo da frente.
Que frente é esta que não tem programa comum. O Partido de Heloísa Helena
ali era claro, mostrava qual seria o papel dos aliados na eleição, não o de
aliados, participantes de uma frente, mas a de apoiadores incondicionais de
HH. A escolha de César Benjamim (o criador do programa de governo
desenvolvimentista-nacionalista de Garotinho) mostrou bem que a frente era
só para inglês ver, aliança era PSOL-PSOL. Quem dava a linha era a senadora.
Logo a candidata fez questão de mostrar que o programa do partido não era
para a sociedade, era para consumo interno, para ter panfletadores e
agitadores gratuitos pelo Brasil. Mas, quem falava pela frente, a única que
tinha autorização era ela. O programa dos partidos era um mero detalhe.
Daí em diante, a candidatura foi de decepção em decepção. O que começou como
uma opção "mais à esquerda", logo se mostrou algo quase que tirado do
romance de realismo fantástico Cem Anos de Solidão, de Gabriel Garcia
Marques, a matriarca moralista Úrsula Buendia. Um dia atacava o aborto,
ameaçando com o fogo do inferno as infiéis que cometessem este pecado (ainda
nos casos de estupro e risco de vida) e dizia que esta coisa de a mulher ter
direito ao próprio corpo não era certo. No outro negava direito aos
homossexuais de terem sua união civil. Aparecia mais um espacinho para falar
e ela condenava o governo Lula por não ter sustentado a falida e famigerada
Varig, criada e alimentada pela ditadura militar; depois, não satisfeita,
defendia que o governo brasileiro tinha que financiar a transnacional
Volkswagen... Enquanto os militantes da frente, cabisbaixos e horrorizados
faziam das tripas coração para defender a candidata, ela mostrava claramente
que a frente era apenas um detalhe, um palanque para sua candidatura, que de
esquerda nada mais tinha e virava uma prédica messiânica moralista.
Uma aliada incondicional da direita em sua luta pelo golpe contra a Lula,
Heloísa Helena posou de promotora e juíza, condenando sem investigar não só
o governo Lula, mas também o PT, como um partido de "quadrilheiros e
mensaleiros" (não levando em consideração os anos de militância e convívio
com camaradas honrados, honestos e dedicados a mudar a face deste país).
Absolveu o governo Fegacê e a quadrilha tucano-pefelista, erigindo o governo
Lula como o mais corrupto da história do Brasil (se calando sobre o governo
privatista entreguista de Fernando Henrique). Defendeu todas as manobras
golpistas, todas as tentativas de impeachment, saiu em todas as fotos da
direita (ao lado de ACM, Bonhausen, Jereissati, festejando com a oligarquia
as vitórias que a direita conseguiu no Congresso). Chegou mesmo a insinuar,
repetindo o discurso do PFL em São Paulo, que o dinheiro do suposto dossiê
do caso Serra-Verdoin viria do Narcotráfico; por outro lado, não mostrou
nenhum interesse em apurar o que o conteúdo do dossiê denunciava, as
gravíssimas denúncias do envolvimento de Serra e do PSDB na máfia dos
sanguessugas... Para que? Tudo pelo segundo turno, não dá para bater em
aliado eleitoral, não é?
O que começou como esperança de renovação, está terminando como uma grande
decepção. O resumo da ópera foi o discurso moralista-religioso que ela fez,
num senado vazio, num contexto de ópera bufa, no qual ela se orgulhava de
não ter aprendido socialismo nos clássicos... Não leu Marx, não leu Lênin,
não leu Trotsky, não leu Gramsci... Nem precisou, segundo o discurso dela...
Tava tudo na bíblia... E quem duvidar disto está nas profundas do inferno.
Um discurso maniqueísta, triste, que omite as categorias econômicas,
políticas e filosóficas e divide tudo nos bonzinhos e nos malvadões...
Talvez por conta desta ignorância ela consiga separar o capital produtivo do
improdutivo (quem mandou não ler O Imperialismo Fase Superior do
Capitalismo, de Lênin, não falaria tanta besteira). Os bonzinhos seriam os
que seguem Joana D´Arc HH no caminho da salvação, os malvados são todos que
estão do outro lado. Para que 200 anos de luta para separar a igreja do
Estado, para tornar a política um campo laico? Ignorante de dialética e
marxismo, HH transforma Marx e Trotsky em diáconos desta nova igreja, que
congrega fiéis somente entre a classe média reacionária e conservadora (num
espetáculo surrealista, no qual os votos moralistas migram entre Alckmim e
Heloísa Helena), nenhuma penetração no proletariado e algum apelo na
esquerda intelectualizada extremista. Tanto assim é que HH não transfere
sequer 1% de seus votos para seus deputados (o que significa que o PSOL pode
ser extinto já em sua primeira eleição...).
O que começou como um sopro de esperança, terminou como um grande fiasco,
digno de uma tese de pós-doutorado: A Neo Igreja Teológico-Marxista e o
papel do moralismo conservador na mediocridade eleitoral da classe média
conservadora.
2006-09-21 10:09:27
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answer #4
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answered by sidney 4
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