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Ae pessoal, ontem uma amiga me disse que segundo uma teoria psiquica (esta certo isso?), o tipo de pessoa que eu sou se encaixa no perfil "narcisista". Eu concordei com ela em alguns aspectos, e pensando bem, em muitos aspectos eu me enquadro nesse perfil. Alguem poderia me explicar o porque deste meu comportamento, da minha personalidade. Pelo que sei na psicologia muitas coisas podem ser explicadas com o passado da pessoa. Alguem poderia dar possiveis causas para um comportamento narcisista?

2006-09-12 01:11:11 · 11 respostas · perguntado por Filipe 1 em Ciências Sociais Psicologia

11 respostas

O termo narcisismo deriva da descrição clínica e foi escolhido por Paul Näcke em 1899 para denotar a atitude de uma pessoa que trata seu próprio corpo da mesma forma pela qual o corpo de um objeto sexual é comumente tratado - que o contempla, vale dizer, o afaga e o acaricia até obter satisfação completa através dessas atividades. Desenvolvido até esse grau, o narcisismo passa a significar uma perversão que absorveu a totalidade da vida sexual do indivíduo, exibindo, conseqüentemente, as características que esperamos encontrar no estudo de todas as perversões.
Observadores psicanalíticos foram subseqüentemente surpreendidos pelo fato de que aspectos individuais da atitude narcisista são encontrados em muitas pessoas que sofrem de outras perturbações - por exemplo, conforme Sadger ressaltou, em homossexuais -, e finalmente afigurou-se provável que uma localização da libido que merecesse ser descrita como narcisismo talvez estivesse presente em muito maior extensão, podendo mesmo reivindicar um lugar no curso regular do desenvolvimento sexual humano. Dificuldades do trabalho psicanalítico em neuróticos conduziram à mesma suposição, pois parecia que, neles, essa espécie de atitude narcisista constituía um dos limites à sua susceptibilidade à influência. O narcisismo nesse sentido não seria uma perversão, mas o complemento libidinal do egoísmo do instinto de autopreservação, que, em certa medida, pode justificavelmente ser atribuído a toda criatura viva.
Um motivo premente para nos ocuparmos com a concepção de um narcisismo primário e normal surgiu quando se fez a tentativa de incluir o que conhecemos da demência precoce (Kraepelin) ou da esquizofrenia (Bleuler) na hipótese da teoria da libido. Esse tipo de pacientes, que eu propus fossem denominados de parafrênicos, exibem duas características fundamentais: megalomania e desvios de seu interesse do mundo externo - de pessoas e coisas. Em conseqüência da segunda modificação, tornam-se inacessíveis à influência da psicanálise e não podem ser curados por nossos esforços. Mas o afastamento do parafrênico do mundo externo necessita ser mais precisamente caracterizado. Um paciente que sofre de histeria ou de neurose obsessiva, enquanto sua doença persiste, também desiste de sua relação com a realidade. Mas a análise demonstra que ele de modo algum corta suas relações eróticas com as pessoas e as coisas. Ainda as retém na fantasia, isto é, ele substitui, por um lado, os objetos imaginários de sua memória por objetos reais, ou mistura os primeiros com os segundos, e, por outro, renuncia à iniciação das atividades motoras para a obtenção de seus objetivos relacionados àqueles objetos. Essa é a única condição da libido a que podemos legitimamente aplicar o termo 'introversão' da libido, empregado por Jung indiscriminadamente. Com o parafrênico a situação é diferente. Ele parece realmente ter retirado sua libido de pessoas e coisas do mundo externo, sem substituí-las por outras na fantasia. Quando realmente as substitui, o processo parece ser secundário e constituir parte de uma tentativa de recuperação, destinada a conduzir a libido de volta a objetos.
Surge a questão: Que acontece à libido que foi afastada dos objetos externos na esquizofrenia? A megalomania característica desses estados aponta o caminho. Essa megalomania, sem dúvida, surge a expensas da libido objetal. A libido afastada do mundo externo é dirigida para o ego e assim dá margem a uma atitude que pode ser denominada de narcisismo. Mas a própria megalomania não constitui uma criação nova; pelo contrário, é, como sabemos, ampliação e manifestação mais clara de uma condição que já existia previamente. Isso nos leva a considerar o narcisismo que surge através da indução de catexias objetais como sendo secundário, superposto a um narcisismo primário que é obscurecido por diversas influências diferentes.
Desejo ressaltar que não me proponho aqui explicar ou penetrar ainda mais no problema da esquizofrenia, limitando-me meramente a reunir o que já foi dito em outras ocasiões, a fim de justificar a introdução do conceito de narcisismo.
Essa extensão da teoria da libido - em minha opinião, legítima - recebe reforço de um terceiro setor, a saber, de nossas observações e conceitos sobre a vida mental das crianças e dos povos primitivos. Nos segundos, encontramos características que, se ocorressem isoladamente, poderiam ser atribuídas à megalomania: uma superestima do poder de seus desejos e atos mentais, a 'onipotência de pensamentos', uma crença na força taumatúrgica das palavras, e uma técnica para lidar com o mundo externo - 'mágica' - que parece ser uma aplicação lógica dessas premissas grandiosas. Nas crianças de hoje, cujo desenvolvimento é muito mais obscuro para nós, esperamos encontrar uma atitude exatamente análoga em relação ao mundo externo. Assim, formamos a idéia de que há uma catexia libidinal original do ego, parte da qual é posteriormente transmitida a objetos, mas que fundamentalmente persiste e está relacionada com as catexias objetais, assim como o corpo de uma ameba está relacionado com os pseudópodes que produz. Em nossas pesquisas, tomando, como se tomaram, os sintomas neuróticos como ponto de partida, essa parte da localização da libido permaneceu necessariamente oculta para nós no início. Tudo que observamos foram emanações dessa libido - as catexias objetais, que podem ser transmitidas e retiradas novamente. Também vemos, em linhas gerais, uma antítese entre a libido do ego e a libido objetal. Quanto mais uma é empregada, mais a outra se esvazia. A libido objetal atinge sua fase mais elevada de desenvolvimento no caso de uma pessoa apaixonada, quando o indivíduo parece desistir de sua própria personalidade em favor de uma catexia objetal, ao passo que temos a condição oposta na fantasia do paranóico (ou autopercepção) do 'fim do mundo'. Finalmente, no tocante à diferenciação das energias psíquicas, somos levados à conclusão de que, para começar, durante o estado de narcisismo, elas existem em conjunto, sendo nossa análise demasiadamente tosca para estabelecer uma distinção entre elas. Somente quando há catexia objetal é que é possível discriminar uma energia sexual - a libido - de uma energia dos instintos do ego.
Antes de prosseguir, devo tocar em duas questões que nos levam ao âmago das dificuldades de nosso assunto. Em primeiro lugar, qual a relação entre o narcisismo de que tratamos e o auto-erotismo, que descrevemos como um estado inicial da libido? Em segundo, se concedemos ao ego uma catexia primária da libido, por que há necessidade de distinguir ainda uma libido sexual de uma energia não-sexual dos instintos do ego? A postulação de uma única espécie de energia psíquica não nos pouparia de todas as dificuldades que residem em diferenciar uma energia dos instintos do ego da libido do ego, e a libido do ego da libido objetal?
No tocante à primeira questão, posso ressaltar que estamos destinados a supor que uma unidade comparável ao ego não pode existir no indivíduo desde o começo; o ego tem de ser desenvolvido. Os instintos auto-eróticos, contudo, ali se encontram desde o início, sendo, portanto, necessário que algo seja adicionado ao auto-erotismo - uma nova ação psíquica - a fim de provocar o narcisismo.
Provocaremos uma inquietação perceptível em qualquer analista de quem se exija uma resposta definitiva à segunda questão. Não é agradável a idéia de abandonar a observação pela controvérsia teórica estéril, mas nem por isso nos devemos esquivar de uma tentativa de elucidação. É verdade que noções tais como a de uma libido do ego, uma energia dos instintos do ego, e assim por diante, não são particularmente fáceis de apreender, nem suficientemente ricas de conteúdo; uma teoria especulativa das relações em questão deveria começar por buscar como base um conceito nitidamente definido. Mas sou da opinião de que é exatamente nisso que consiste a diferença entre uma teoria especulativa e uma ciência erigida a partir da interpretação empírica. Esta última não invejará a especulação por seu privilégio de ter um fundamento suave, logicamente inatacável, contentando-se, de bom grado, com conceitos básicos nebulosos mal imagináveis, que espera apreender mais claramente no decorrer de seu desenvolvimento, ou que está até mesmo preparada para substituir por outros, pois essas idéias não são o fundamento da ciência, no qual tudo repousa: esse fundamento é tão- somente a observação. Não são as bases, mas o topo de toda a estrutura, e podem ser substituídas e eliminadas sem prejudicá-la. Em nossos dias, a mesma coisa vem acontecendo na ciência da física, cujas noções básicas no tocante a matéria, centros de força, atração etc. são quase tão discutíveis quanto às noções correspondentes em psicanálise.
O valor dos conceitos 'libido do ego' e 'libido do objeto' reside no fato de que se originam do estudo das características íntimas dos processos neuróticos e psicóticos. A diferenciação da libido numa espécie que é adequada ao ego e numa outra que está ligada a objetos é o corolário inevitável de uma hipótese original que estabelecia distinção entre os instintos sexuais e os instintos do ego. Seja como for, a análise das neuroses de pura transferência (neurose de histeria e obsessiva) compeliu-me a fazer essa distinção, e sei apenas que todas as tentativas para explicar esses fenômenos por outros meios foram inteiramente infrutíferas.
Na ausência total de qualquer teoria dos instintos que nos ajude a encontrar nossa orientação, podemos permitir-nos, ou antes, cabe-nos começar por elaborar alguma hipótese para a sua conclusão lógica, até que ela ou se desintegre ou seja confirmada. Existem vários pontos a favor da hipótese de ter havido desde o início uma separação entre os instintos sexuais e os outros instintos do ego, além da utilidade de tal hipótese na análise das neuroses de transferência. Admito que somente essa segunda consideração não seria destituída de ambigüidade, porquanto poderia tratar-se de uma energia psíquica indiferente que só se torna libido através do ato de catexização de um objeto. Mas, em primeiro lugar, a distinção feita nesse conceito corresponde à distinção popular comum entre a fome e o amor. Em segundo lugar, há considerações biológicas a seu favor. O indivíduo leva realmente uma existência dúplice: uma para servir as suas próprias finalidades e a outra como um elo numa corrente, que ele serve contra sua vontade ou pelo menos involuntariamente. O indivíduo considera a sexualidade como um dos seus próprios fins, ao passo que, de outro ponto de vista, ele é um apêndice de seu germoplasma, a cuja disposição põe suas energias em troca de uma retribuição de prazer. Ele é o veículo mortal de uma substância (possivelmente) imortal - como o herdeiro de uma propriedade inalienável, que é o único dono temporário de um patrimônio que lhe sobrevive. A separação dos instintos sexuais dos instintos do ego simplesmente refletiria essa função dúplice do indivíduo. Em terceiro lugar, devemos recordar que todas as nossas idéias provisórias em psicologia presumivelmente algum dia se basearão numa subestrutura orgânica. Isso torna provável que as substâncias especiais e os processos químicos sejam os responsáveis pela realização das operações da sexualidade, garantindo a extensão da vida individual na da espécie. Estamos levando essa probabilidade em conta ao substituirmos as substâncias químicas especiais por forças psíquicas especiais.
Tento em geral manter a psicologia isenta de tudo que lhe seja diferente em natureza, inclusive das linhas biológicas de pensamento. Por essa mesma razão, gostaria, nessa altura, de admitir expressamente que a hipótese de instintos do ego e instintos sexuais separados (isto é, a teoria da libido) está longe de repousar, inteiramente, numa base psicológica, extraindo seu principal apoio da biologia. Mas serei suficientemente coerente [com minha norma geral] para abandonar essa hipótese, se o próprio trabalho psicanalítico vier a produzir alguma outra hipótese mais útil sobre os instintos. Até agora, isso não aconteceu. Pode ocorrer que, com mais fundamento e numa visão de maior alcance, a energia sexual - a libido - seja apenas o produto de uma diferenciação na energia que atua generalizadamente na mente. Mas tal assertiva não tem qualquer relevância. Relaciona-se com assuntos que se acham tão afastados dos problemas de nossa observação, e a respeito dos quais conhecemos tão pouco, que é igualmente ocioso contestá-la ou afirmá-la; essa identidade primordial talvez tenha tão pouco que ver com nossos interesses analíticos quanto o parentesco primordial de todas as raças da humanidade tem que ver com a prova de parentesco exigida a fim de se estabelecer um direito legal de herança. Todas essas especulações não nos levam a parte alguma. Visto não podermos esperar que outra ciência nos apresente as conclusões finais sobre a teoria dos instintos, é muito mais objetivo tentar ver que luz pode ser lançada sobre esse problema básico da biologia por uma síntese dos fenômenos psicológicos. Enfrentemos a possibilidade de erro, mas não nos deixemos dissuadir de buscar as implicações lógicas da hipótese, que em primeiro lugar adotamos, de uma antítese entre os instintos do ego e os instintos sexuais (hipótese à qual fomos forçosamente conduzidos pela análise das neuroses de transferência), e de verificar se ela se mostra destituída de contradições e se é profícua, e se pode ser aplicada também a outras perturbações, como a esquizofrenia.
Seria, naturalmente, uma questão diferente se provasse que a teoria da libido já fracassou na tentativa de explicar essa segunda doença. Isso foi asseverado por C. G. Jung (1912) e é por causa disso que me vi obrigado a entrar nessa última discussão, da qual gostaria de ter sido poupado. Teria preferido seguir até o fim o caminho trilhado na análise do caso Schreber sem qualquer discussão de suas premissas. Mas a asserção de Jung é, para dizer o mínimo, prematura. Os fundamentos que apresenta para ela são deficientes. Em primeiro lugar, recorre a uma confissão, que eu teria feito, de que fora obrigado, devido às dificuldades da análise de Schreber, a estender o conceito de libido (isto é, a desistir de seu conteúdo sexual) e a identificar a libido com o interesse psíquico em geral. Ferenczi (1913b), numa crítica exaustiva à obra de Jung, já disse tudo o que é necessário a título de correção dessa interpretação errônea. Posso apenas corroborar sua crítica e repetir que jamais fiz tal retratação no tocante à teoria da libido. Outro argumento de Jung, a saber, que não podemos supor que a retirada da libido seja em si mesma suficiente para acarretar a perda da função normal da realidade, não é um argumento, mas um ditame. 'Incorre em petição de princípio' e poupa discussão, pois se e como isso é possível era precisamente o ponto que devia estar sob investigação. Em sua grande obra seguinte, Jung (1913 [339-40]) simplesmente falha na solução que eu havia indicado: 'Ao mesmo tempo', escreve, 'ainda há o seguinte a ser levado em consideração (um ponto ao qual, incidentalmente, Freud se refere em sua obra sobre o caso Schreber [1911c]) - que a introversão da libido sexualis conduz a uma catexia do "ego", e que possivelmente é isso que produz o resultado de uma perda da realidade. É realmente uma possibilidade tentadora explicar a psicologia da perda da realidade dessa maneira'. Mas Jung não vai muito além no exame dessa possibilidade. Algumas linhas adiante ele a põe de lado com a observação de que essa determinante 'resultaria na psicologia de um anacoreta ascético, não em demência precoce'. Quão pouco essa analogia inadequada pode ajudar-nos a resolver a questão fica claro pela consideração de que um anacoreta dessa espécie, que 'tenta erradicar todos os traços de interesse sexual' (mas só no sentido popular da palavra 'sexual'), nem sequer necessariamente exibe qualquer localização patogênica da libido. Ele pode ter desviado inteiramente seu interesse sexual dos seres humanos; contudo, pode tê-lo sublimado num interesse elevado pelo divino, pela natureza, ou pelo reino animal, sem que sua libido tenha sofrido introversão até suas fantasias ou retorno a seu ego. Essa analogia pareceria excluir por antecipação a possibilidade de se estabelecer uma diferenciação entre o interesse que emana de fontes eróticas e os outros. Recordemos, além disso, que as pesquisas da escola suíça, por mais valiosas que sejam, elucidaram apenas duas facetas do quadro da demência precoce - a presença nele de complexos que conhecemos tanto em indivíduos saudáveis como em neuróticos e a similaridade das fantasias que nele ocorrem com mitos populares -, mas não puderam lançar mais luz alguma sobre o mecanismo da doença. Podemos, então, repudiar a asserção de Jung, segundo a qual a teoria da libido não só malogrou na tentativa de explicar a demência precoce, como também, portanto, é eliminada em relação às outras neuroses.


II
Parece-me que certas dificuldades especiais perturbam o estudo direto do narcisismo. Nosso principal meio de acesso a ele continuará a ser provavelmente a análise das parafrenias. Assim como as neuroses de transferência nos permitiram traçar os impulsos instintuais libidinais, também a demência precoce e a paranóia nos fornecerão uma compreensão interna (insight) da psicologia do ego. Mais uma vez, a fim de chegar à compreensão do que parece tão simples em fenômenos normais, teremos de recorrer ao campo da patologia com suas distorções e exageros. Ao mesmo tempo, outros meios de abordagem nos permanecem acessíveis, e através deles podemos obter um conhecimento melhor do narcisismo. Passarei a examiná-los agora, na seguinte ordem: o estudo da doença orgânica, da hipocondria e da vida erótica dos sexos.
Ao avaliar a influência da doença orgânica sobre a distribuição da libido, sigo uma sugestão que me foi feita verbalmente por Sándor Ferenczi. É do conhecimento de todos, e eu o aceito como coisa natural, que uma pessoa atormentada por dor e mal-estar orgânico deixa de se interessar pelas coisas do mundo externo, na medida em que não dizem respeito a seu sofrimento. Uma observação mais detida nos ensina que ela também retira o interesse libidinal de seus objetos amorosos: enquanto sofre, deixa de amar. A banalidade desse fato não justifica que deixemos de traduzi-lo nos termos da teoria da libido. Devemos então dizer: o homem enfermo retira suas catexias libidinais de volta para seu próprio ego, e as põe para fora novamente quando se recupera. 'Concentrada está a sua alma', diz Wilhelm Busch a respeito do poeta que sofre de dor de dentes, 'no estreito orifício do molar'.
Aqui a libido e o interesse do ego partilham do mesmo destino e são mais uma vez indistiguíveis entre si. O egoísmo familiar do enfermo abrange os dois. Achamos isso tão natural porque estamos certos de que, na mesma situação, nosso comportamento seria idêntico. A maneira pela qual os sentimentos de quem ama, por mais fortes que sejam, são banidos pelos males corpóreos, e de súbito substituídos por uma indiferença completa, constitui um tema que tem sido consideravelmente explorado por escritores humorísticos.
A condição do sono também se assemelha à doença, por acarretar uma retirada narcisista das posições da libido até o próprio eu do indivíduo, ou, mais precisamente, até o desejo único de dormir. O egoísmo dos sonhos ajusta-se muito bem nesse contexto. [ver em [1]]. Em ambos os estados temos, pelo menos, exemplos de alterações na distribuição da libido que são resultantes de uma modificação no ego.
A hipocondria, da mesma forma que a doença orgânica, manifesta-se em sensações corpóreas aflitivas e penosas, tendo sobre a distribuição da libido o mesmo efeito que a doença orgânica. O hipocondríaco retira tanto o interesse quanto a libido - a segunda de forma especialmente acentuada - dos objetos do mundo externo, concentrando ambos no órgão que lhe prende a atenção. Torna-se agora evidente uma diferença entre a hipocondria e a doença orgânica: na segunda, as sensações aflitivas baseiam-se em mudanças demonstráveis [orgânicas]; na primeira, isso não ocorre. Mas estaria inteiramente de acordo com nossa concepção geral dos processos de neurose, se resolvêssemos dizer que a hipocondria deve estar certa: deve-se supor que as modificações orgânicas também estão presentes nela.
Mas o que seriam essas mudanças? Deixar-nos-emos guiar, nessa altura, por nossa experiência, a qual mostra que as sensações corpóreas de natureza desagradável, comparáveis às da hipocondria, ocorrem também nas outras neuroses. Já tive ocasião de dizer que me inclino a classificar a hipocondria, juntamente com a neurastenia e a neurose de angústia, como uma terceira neurose 'real' Provavelmente não seria ir muito longe supor que, no caso das outras neuroses, uma pequena dose de hipocondria também se forma regularmente ao mesmo tempo. Temos o melhor exemplo disso, creio eu, na neurose de angústia com sua superestrutura de histeria. Ora, o protótipo familiar de um órgão que é dolorosamente delicado, que de alguma forma é alterado e que, contudo, não está doente no sentido comum do termo, é o órgão genital em seus estados de excitação. Nessa condição, ele fica congestionado de sangue, intumescido e umectado, sendo a sede de uma multiplicidade de sensações. Descrevamos agora, tomando qualquer parte do corpo, sua atividade de enviar estímulos sexualmente excitantes à mente, como sendo sua 'erogenicidade', e reflitamos, ainda, que as considerações nas quais se baseou nossa teoria da sexualidade de há muito nos habituou à idéia de que certas outras partes do corpo - as zonas 'erógenas' - podem atuar como substitutos dos órgãos genitais e se comportarem analogamente a eles. Temos então apenas mais um passo a dar. Podemos decidir considerar a erogenicidade como uma característica geral de todos os órgãos e, então, podemos falar de um aumento ou diminuição dela numa parte específica do corpo. Para cada uma das modificações na erogenicidade dos órgãos poderia, então, verificar-se uma modificação paralela da catexia libidinal no ego. Tais fatores constituíram aquilo que acreditamos estar subjacente à hipocondria e aquilo que pode exercer o mesmo efeito sobre a distribuição da libido tal como produzida por uma doença material dos órgãos.
Vemos que, se acompanharmos essa linha de raciocínio, nos defrontaremos não só com o problema da hipocondria, mas também com o das outras neuroses 'reais' - a neurastenia e a neurose de angústia. Paremos, portanto, nesse ponto. Não pertence ao âmbito de uma indagação puramente psicológica penetrar tanto nas fronteiras da pesquisa fisiológica. Mencionarei simplesmente que, a partir desse ponto de vista, podemos suspeitar que a relação da hipocondria com a parafrenia é semelhante à das outras neuroses 'reais' com a histeria e a neurose obsessiva: podemos desconfiar, vale dizer, que ela está na dependência da libido do ego, assim como as outras estão na da libido objetal, e que a ansiedade hipocondríaca é a contrapartida, enquanto provém da libido do ego, da ansiedade neurótica. Além disso, visto já estarmos familiarizados com a idéia de que o mecanismo do adoecer e da formação de sintomas nas neuroses de transferência - o caminho da introversão para a regressão - deve ficar vinculado a um represamento da libido objetal, podemos também ficar mais perto da idéia de um represamento da libido do ego, e podemos estabelecer uma relação dessa idéia com os fenômenos da hipocondria e da parafrenia.
Nesse ponto, nossa curiosidade naturalmente perguntará por que esse represamento da libido no ego teria de ser experimentado como desagradável. Contentar-me-ei com a reposta de que o desprazer é sempre a expressão de um grau mais elevado de tensão, e que, portanto, o que ocorre é que uma quantidade no campo dos acontecimentos materiais é transformada, aqui como em outros lugares, na qualidade psíquica do desprazer. Não obstante, talvez o fator decisivo para a geração do desprazer não seja a magnitude absoluta do acontecimento material, mas antes alguma função específica dessa magnitude absoluta. Aqui podemos até mesmo aventurar-nos a abordar a questão de saber o que torna absolutamente necessário para a nossa vida mental ultrapassar os limites do narcisismo e ligar a libido a objetos. A resposta decorrente de nossa linha de raciocínio mais uma vez seria a de que essa necessidade surge quando a catexia do ego com a libido excede certa quantidade. Um egoísmo forte constitui uma proteção contra o adoecer, mas, num último recurso, devemos começar a amar a fim de não adoecermos, e estamos destinados a cair doentes se, em conseqüência da frustração, formos incapazes de amar. Isso acompanha mais ou menos os versos do quadro que Heine traça sobre a psicogênese da Criação:
Krankheit ist wohl der letzte GrundDes ganzen Schöpferdrangs gewesen;Erschaffend konnte ich genesen,Erschaffend wurde ich gesund.
Reconhecemos nosso aparelho mental como sendo, acima de tudo, um dispositivo destinado a dominar as excitações que de outra forma seriam sentidas como aflitivas ou teriam efeitos patogênicos. Sua elaboração na mente auxilia de forma marcante um escoamento das excitações que são incapazes de descarga direta para fora, ou para as quais tal descarga é, no momento, indesejável. No primeiro caso, contudo, é indiferente que esse processo interno de elaboração seja efetuado em objetos reais ou imaginários. A diferença não surge senão depois - caso a transferência da libido para objetos irreais (introversão) tenha ocasionado seu represamento. Nos parafrênicos, a megalomania permite uma semelhante elaboração interna da libido que voltou ao ego; talvez apenas quando a megalomania falhe, o represamento da libido no ego se torne patogênico e inicie o processo de recuperação que nos dá a impressão de ser uma doença.
Tentarei aqui penetrar um pouco mais no mecanismo da parafrenia e reunirei os conceitos que já me pareçam merecedores de consideração. A diferença entre as afecções parafrênicas e as neuroses de transferência parecem-me estar na circunstância de que, nas primeiras, a libido liberada pela frustração não permanece ligada a objetos na fantasia, mas se retira para o ego. A megalomania corresponderia, por conseguinte, ao domínio psíquico dessa última quantidade de libido, e seria assim a contrapartida da introversão para as fantasias que é encontrada nas neuroses de transferência; uma falha dessa função psíquica dá margem à hipocondria da parafrenia, e isso é homólogo à ansiedade das neuroses de transferência. Sabemos que essa ansiedade pode ser transformada por uma elaboração psíquica ulterior, isto é, por conversão, formação de reação ou construção de proteções (fobias). O processo correspondente nos parafrênicos consiste numa tentativa de restauração, à qual se devem as surpreendentes manifestações da doença. De uma vez que a parafrenia com freqüência, se não geralmente, acarreta apenas um desligamento parcial da libido dos objetos, podemos distinguir três grupos de fenômenos no quadro clínico: (1) os que representam o que resta de um estado normal de neurose (fenômenos residuais); (2) os que representam o processo mórbido (afastamento da libido dos seus objetos e, além disso, megalomania, hipocondria, perturbações afetivas e todo tipo de regressão); (3) os que representam a restauração, nos quais a libido é mais uma vez ligada a objetos, como uma histeria (na demência precoce ou na parafrenia propriamente dita), ou como numa neurose obsessiva (na paranóia). Essa nova catexia libidinal difere da primária por partir de outro nível e sob outras condições. A diferença entre as neuroses de transferência que ocorrem no caso de nova espécie de catexia libidinal e as formações correspondentes onde o ego é normal devem ser capazes de nos proporcionar a compreensão interna (insight) mais profunda da estrutura de nosso aparelho mental.
Uma terceira maneira pela qual podemos abordar o estudo do narcisismo é através da observação da vida erótica dos seres humanos, com suas várias espécies de diferenciação no homem e na mulher. Assim como a libido objetal inicialmente ocultava de nossa observação a libido do ego, também em relação à escolha de objeto nas crianças de tenra idade (e nas crianças em crescimento) o que primeiro notamos foi que elas derivavam seus objetos sexuais de suas experiências de satisfação. As primeiras satisfações sexuais auto-eróticas são experimentadas em relação com funções vitais que servem à finalidade de autopreservação. Os instintos sexuais estão, de início, ligados à satisfação dos instintos do ego; somente depois é que eles se tornam independentes destes, e mesmo então encontramos uma indicação dessa vinculação original no fato de que os primeiros objetos sexuais de uma criança são as pessoas que se preocupam com sua alimentação, cuidados e proteção: isto é, no primeiro caso, sua mãe ou quem quer que a substitua. Lado a lado, contudo, com esse tipo e fonte de escolha objetal, que pode ser denominado o tipo 'anaclítico', ou de 'ligação', a pesquisa da psicanálise revelou um segundo tipo, que não estávamos preparados para encontrar. Descobrimos, de modo especialmente claro, em pessoas cujo desenvolvimento libidinal sofreu alguma perturbação, tais como pervertidos e homossexuais, que em sua escolha ulterior dos objetos amorosos elas adotaram como modelo não sua mãe mas seus próprios eus. Procuram inequivocamente a si mesmas como um objeto amoroso, e exibem um tipo de escolha objetal que deve ser denominado 'narcisista'. Nessa observação, temos o mais forte dos motivos que nos levaram a adotar a hipótese do narcisismo.
Não concluímos, contudo, que os seres humanos se acham divididos em dois grupos acentuadamente diferenciados, conforme sua escolha objetal se coadune com o tipo anaclítico ou o narcisista; pelo contrário, presumimos que ambos os tipos de escolha objetal estão abertos a cada indivíduo, embora ele possa mostrar preferência por um ou por outro. Dizemos que um ser humano tem originalmente dois objetos sexuais - ele próprio e a mulher que cuida dele - e ao fazê-lo estamos postulando a existência de um narcisismo primário em todos, o qual, em alguns casos, pode manifestar-se de forma dominante em sua escolha objetal.
Uma comparação entre os sexos masculino e feminino indica então que existem diferenças fundamentais entre eles no tocante a seu tipo de escolha objetal, embora essas diferenças naturalmente não sejam universais. O amor objetal completo do tipo de ligação é, propriamente falando, característico do indivíduo do sexo masculino. Ele exibe a acentuada supervalorização sexual que se origina, sem dúvida, do narcisismo original da criança, correspondendo assim a uma transferência desse narcisismo para o objeto sexual. Essa supervalorização sexual é a origem do estado peculiar de uma pessoa apaixonada, um estado que sugere uma compulsão neurótica, cuja origem pode, portanto, ser encontrada num empobrecimento do ego em relação à libido em favor do objeto amoroso. Já com o tipo feminino mais freqüentemente encontrado, provavelmente o mais puro e o mais verdadeiro, o mesmo não ocorre. Com o começo da puberdade, o amadurecimento dos órgãos sexuais femininos, até então em estado de latência, parece ocasionar a intensificação do narcisismo original, e isso é desfavorável para o desenvolvimento de uma verdadeira escolha objetal com a concomitante supervalorização sexual. As mulheres, especialmente se forem belas ao crescerem, desenvolvem certo autocontentamento que as compensa pelas restrições sociais que lhes são impostas em sua escolha objetal. Rigorosamente falando, tais mulheres amam apenas a si mesmas, com uma intensidade comparável à do amor do homem por elas. Sua necessidade não se acha na direção de amar, mas de serem amadas; e o homem que preencher essa condição cairá em suas boas graças. A importância desse tipo de mulher para a vida erótica da humanidade deve ser levada em grande consideração. Tais mulheres exercem o maior fascínio sobre os homens, não apenas por motivos estéticos, visto que em geral são as mais belas, mas também por uma combinação de interessantes fatores psicológicos, pois parece muito evidente que o narcisismo de outra pessoa exerce grande atração sobre aqueles que renunciaram a uma parte de seu próprio narcisismo e estão em busca do amor objetal. O encanto de uma criança reside em grande medida em seu narcisismo, seu autocontentamento e inacessibilidade, assim como também o encanto de certos animais que parecem não se preocupar conosco, tais como os gatos e os grandes animais carniceiros. Realmente, mesmo os grandes criminosos e os humoristas, conforme representados na literatura, atraem nosso interesse pela coerência narcisista com que conseguem afastar do ego qualquer coisa que o diminua. É como se os invejássemos por manterem um bem-aventurado estado de espírito - uma posição libidinal inatacável que nós próprios já abandonamos. O grande encanto das mulheres narcisistas tem, contudo, o seu reverso; grande parte da insatisfação daquele que ama, de suas dúvidas quanto ao amor da mulher, de suas queixas quanto à natureza enigmática da mulher, tem suas raízes nessa incongruência entre os tipos de escolha de objeto.
Talvez não seja fora de propósito apresentar aqui a certeza de que essa descrição da forma feminina de vida erótica não se deve a qualquer desejo tendencioso de minha parte no sentido de depreciar as mulheres. Afora o fato de essa tendenciosidade ser inteiramente estranha a mim, sei que essas diferentes linhas de desenvolvimento correspondem à diferenciação de funções num todo biológico altamente complicado; além disso, estou pronto a admitir que existe um número bem grande de mulheres que amam de acordo com os moldes do tipo masculino e que também desenvolvem a supervalorização sexual própria àquele tipo.
Mesmo para as mulheres narcisistas, cuja atitude para com os homens permanece fria, há um caminho que eleva ao amor objetal completo. Na criança que geram, uma parte de seu próprio corpo as confronta como um objeto estranho, ao qual, partindo de seu próprio narcisismo, podem então dar um amor objetal completo. Existem ainda outras mulheres que não têm de esperar por um filho a fim de darem um passo no desenvolvimento do narcisismo (secundário) para o amor objetal. Antes da puberdade, sentem-se masculinas e se desenvolvem de alguma forma ao longo de linhas masculinas; depois de essa tendência ter sido interrompida de repente ao alcançarem a maturidade feminina, ainda retêm a capacidade de anseio por um ideal masculino - ideal que é de fato uma sobrevivência da natureza de menino que outrora possuíram.
O que eu disse até agora à guisa de indicação pode ser concluído por um breve sumário dos caminhos que levam à escolha de um objeto.
Uma pessoa pode amar:
(1)Em conformidade com o tipo narcisista:
(a) o que ela própria é (isto é, ela mesma),
(b) o que ela própria foi,
(c) o que ela própria gostaria de ser,
(d) alguém que foi uma vez parte dela mesma.
(2)Em conformidade com o tipo anaclítico (de ligação):
(a) a mulher que a alimenta,
(b) o homem que a protege,
e a sucessão de substitutos que tomam o seu lugar. A inclusão do caso (c) do primeiro tipo não pode ser justificada até uma etapa posterior deste exame. [ver em [1]]
A significância da escolha objetal narcisista para a homossexualidade nos homens deve ser considerada em relação a outra coisa.
O narcisismo primário das crianças por nós pressuposto e que forma um dos postulados de nossas teorias da libido é menos fácil de apreender pela observação direta do que de confirmar por alguma outra inferência. Se prestarmos atenção à atitude de pais afetuosos para com os filhos, temos de reconhecer que ela é uma revivescência e reprodução de seu próprio narcisismo, que de há muito abandonaram. O indicador digno de confiança constituído pela supervalorização, que já reconhecemos como um estigma narcisista no caso da escolha objetal, domina, como todos nós sabemos, sua atitude emocional. Assim eles se acham sob a compulsão de atribuir todas as perfeições ao filho - o que uma observação sóbria não permitiria - e de ocultar e esquecer todas as deficiências dele. (Incidentalmente, a negação da sexualidade nas crianças está relacionada a isso.) Além disso, sentem-se inclinados a suspender, em favor da criança, o funcionamento de todas as aquisições culturais que seu próprio narcisismo foi forçado a respeitar, e a renovar em nome dela as reivindicações aos privilégios de há muito por eles próprios abandonados. A criança terá mais divertimentos que seus pais; ela não ficará sujeita às necessidades que eles reconheceram como supremas na vida. A doença, a morte, a renúncia ao prazer, restrições à sua vontade própria não a atingirão; as leis da natureza e da sociedade serão ab-rogadas em seu favor; ela será mais uma vez realmente o centro e o âmago da criação - 'Sua Majestade o Bebê', como outrora nós mesmos nos imaginávamos. A criança concretizará os sonhos dourados que os pais jamais realizaram - o menino se tornará um grande homem e um herói em lugar do pai, e a menina se casará com um príncipe como compensação para sua mãe. No ponto mais sensível do sistema narcisista, a imortalidade do ego, tão oprimida pela realidade, a segurança é alcançada por meio do refúgio na criança. O amor dos pais, tão comovedor e no fundo tão infantil, nada mais é senão o narcisismo dos pais renascido, o qual, transformado em amor objetal, inequivocamente revela sua natureza anterior.

III
Os distúrbios aos quais o narcisismo original de uma criança se acha exposto, as reações com que ela procura proteger-se deles e os caminhos aos quais fica sujeita ao fazê-lo - tais são os temas que proponho deixar de lado, como importante campo de trabalho ainda por explorar. Sua parte mais importante, contudo, pode ser isolada sob a forma do 'complexo de castração' (nos meninos, a ansiedade em relação ao pênis; nas meninas, a inveja do pênis) e tratada em conexão com o efeito da coerção inicial da atividade sexual. A pesquisa psicanalítica em geral nos permite reconstituir as vicissitudes sofridas pelos instintos libidinais quando estes, isolados dos instintos do ego, ficam em oposição a eles; mas no campo específico do complexo de castração, ela nos permite inferir a existência de uma época e de uma situação psíquica nas quais os dois grupos de instintos, ainda atuando em uníssono e inseparavelmente mesclados, surgem como interesses narcisistas. Foi desse contexto que Adler [1910] extraiu seu conceito de 'protesto masculino', quase elevando-o à posição de única força motora na formação tanto do caráter quanto da neurose, e baseando-o não numa tendência narcisista, e portanto ainda libidinal, mas numa valorização social. A pesquisa psicanalítica reconheceu, desde o início, a existência e a importância do 'protesto masculino' mas o tem considerado, contrariamente a Adler, como sendo narcisista em sua natureza e oriundo do complexo de castração. O 'protesto masculino' está relacionado à formação do caráter, em cuja gênese penetra juntamente com muitos outros fatores, sendo, contudo, inteiramente inadequado para explicar os problemas das neuroses, no tocante às quais Adler nada leva em conta, a não ser a maneira pela qual elas servem aos instintos do ego. Acho inteiramente impossível situar a gênese da neurose na estreita base do complexo de castração, por mais poderosamente que, nos homens, esse complexo ocupe o primeiro plano entre suas resistências à cura de uma neurose. Incidentalmente, conheço casos de neuroses em que o 'protesto masculino' ou, como o encaramos, o complexo de castração, não desempenha qualquer papel patogênico, nem sequer chegando a aparecer.
A observação de adultos normais revela que sua megalomania antiga foi arrefecida e que as características psíquicas a partir das quais inferimos seu narcisismo infantil foram apagadas. Que aconteceu à libido do ego? Devemos supor que toda ela se converteu em catexias objetais? Essa possibilidade é claramente contrária ao encaminhamento de nossa argumentação; podemos, porém, encontrar uma sugestão em outra resposta para a pergunta na psicologia da repressão.
Sabemos que os impulsos instintuais libidinais sofrem a vicissitude da repressão patogênica se entram em conflito com as idéias culturais e éticas do indivíduo. Com isso, nunca queremos dizer que o indivíduo em questão dispõe de um conhecimento meramente intelectual da existência de tais idéias; sempre queremos dizer que ele as reconhece como um padrão para si próprio, submetendo-se às exigências que elas lhe fazem. A repressão, como dissemos, provém do ego; poderíamos dizer com maior exatidão que provém do amor-próprio do ego. As mesmas impressões, experiências, impulsos e desejos aos quais um homem se entrega, ou que pelo menos elabora conscientemente, serão rejeitados com a maior indignação por outro, ou mesmo abafados antes que entrem na consciência. A diferença entre os dois, que encerra o fator condicionante da repressão, pode ser facilmente expressa em termos que permitem seja ela explicada pela teoria da libido. Podemos dizer que o primeiro homem fixou um ideal em si mesmo, pelo qual mede seu ego real, ao passo que o outro não formou qualquer ideal desse tipo. Para o ego, a formação de um ideal seria o fator condicionante da repressão.
Esse ego ideal é agora o alvo do amor de si mesmo (self-love) desfrutado na infância pelo ego real. O narcisismo do indivíduo surge deslocado em direção a esse novo ego ideal, o qual, como o ego infantil, se acha possuído de toda perfeição de valor. Como acontece sempre que a libido está envolvida, mais uma vez aqui o homem se mostra incapaz de abrir mão de uma satisfação de que outrora desfrutou. Ele não está disposto a renunciar à perfeição narcisista de sua infância; e quando, ao crescer, se vê perturbado pelas admoestações de terceiros e pelo despertar de seu próprio julgamento crítico, de modo a não mais poder reter aquela perfeição, procura recuperá-la sob a nova forma de um ego ideal. O que ele projeta diante de si como sendo seu ideal é o substituto do narcisismo perdido de sua infância na qual ele era o seu próprio ideal.
Somos naturalmente levados a examinar a relação entre essa formação de um ideal e a sublimação. A sublimação é um processo que diz respeito à libido objetal e consiste no fato de o instinto se dirigir no sentido de uma finalidade diferente e afastada da finalidade da satisfação sexual; nesse processo, a tônica recai na deflexão da sexualidade. A idealização é um processo que diz respeito ao objeto; por ela, esse objeto, sem qualquer alteração em sua natureza, é engrandecido e exaltado na mente do indivíduo. A idealização é possível tanto na esfera da libido do ego quanto na da libido objetal. Por exemplo, a supervalorização sexual de um objeto é uma idealização do mesmo. Na medida em que a sublimação descreve algo que tem que ver com o instinto, e a idealização, algo que tem que ver com o objeto, os dois conceitos devem ser distinguidos um do outro.
A formação de um ideal do ego é muitas vezes confundida com a sublimação do instinto, em detrimento de nossa compreensão dos fatos. Um homem que tenha trocado seu narcisismo para abrigar um ideal elevado do ego, nem por isso foi necessariamente bem-sucedido em sublimar seus instintos libidinais. É verdade que o ideal do ego exige tal sublimação, mas não pode fortalecê-la; a sublimação continua a ser um processo especial que pode ser estimulado pelo ideal, mas cuja execução é inteiramente independente de tal estímulo. É precisamente nos neuróticos que encontramos as mais acentuadas diferenças de potencial entre o desenvolvimento de seu ideal do ego e a dose de sublimação de seus instintos libidinais primitivos; e em geral é muito mais difícil convencer um idealista a respeito da localização inconveniente de sua libido do que um homem simples, cujas pretensões permaneceram mais moderadas. Além disso, a formação de um ideal do ego e a sublimação se acham relacionadas, de forma bem diferente, à causação da neurose. Como vimos, a formação de um ideal aumenta as exigências do ego, constituindo o fator mais poderoso a favor da repressão; a sublimação é uma saída, uma maneira pela qual essas exigências podem ser atendidas sem envolver repressão.
Não nos surpreenderíamos se encontrássemos um agente psíquico especial que realizasse a tarefa de assegurar a satisfação narcisista proveniente do ideal do ego, e que, com essa finalidade em vista, observasse constantemente o ego real, medindo-o por aquele ideal. Admitindo-se que esse agente de fato exista, de forma alguma seria possível chegar a ele como se fosse uma descoberta - podemos tão-somente reconhecê-lo, pois podemos supor que aquilo que chamamos de nossa 'consciência' possui as características exigidas. O reconhecimento desse agente nos permite compreender os chamados 'delírios de sermos notados' ou, mais corretamente, de sermos vigiados, que constituem sintomas tão marcantes nas doenças paranóides, podendo também ocorrer como uma forma isolada de doença, ou intercalados numa neurose de transferência. Pacientes desse tipo queixam-se de que todos os seus pensamentos são conhecidos e suas ações vigiadas e supervisionadas; eles são informados sobre o funcionamento desse agente por vozes que caracteristicamente lhes falam na terceira pessoa ('Agora ela está pensando nisso de novo', 'Agora ele está saindo'). Essa queixa é justificada; ela descreve a verdade. Um poder dessa espécie, que vigia, que descobre e que critica todas as nossas intenções, existe realmente. Na realidade, existe em cada um de nós em nossa vida normal.
Os delírios de estar sendo vigiado apresentam esse poder numa forma regressiva, revelando assim sua gênese e a razão por que o paciente fica revoltado contra ele, pois o que induziu o indivíduo a formar um ideal do ego, em nome do qual sua consciência atua como vigia, surgiu da influência crítica de seus pais (transmitida a ele por intermédio da voz), aos quais vieram juntar-se, à medida que o tempo passou, aqueles que o educaram e lhe ensinaram, a inumerável e indefinível coorte de todas as outras pessoas de seu ambiente - seus semelhantes - e a opinião pública.
Dessa forma, grandes quantidades de libido de natureza essencialmente homossexual são introduzidas na formação do ideal do ego narcisista, encontrando assim um escoadouro e satisfação em conservá-lo. A instituição da consciência foi, no fundo, uma personificação, primeiro da crítica dos pais, e, subseqüentemente, da sociedade - processo que se repete quando uma tendência à repressão se desenvolve de uma proibição ou obstáculo que proveio, no primeiro caso, de fora. As vozes, bem como a multidão indefinida, são reconduzidas ao primeiro plano pela doença, e assim a evolução da consciência se reproduz de forma regressiva. Mas a revolta contra esse 'agente de censura' brota não só do desejo, por parte do indivíduo (de acordo com o caráter fundamental de sua doença), de libertar-se de todas essas influências, a começar pela dos pais, mas também do fato de retirar sua libido homossexual delas. A consciência do paciente então se confronta com ele de maneira regressiva, como sendo uma influência hostil vinda de fora.
As queixas feitas pelos paranóicos também revelam que, no fundo, a autocrítica da consciência coincide com a auto-observação na qual ela se baseia. Assim, a atividade da mente que assumiu a função da consciência também se coloca a serviço da pesquisa interna, que proporciona à filosofia o material para as suas operações intelectuais. Isso pode ter certa relação com a tendência, característica dos paranóicos, de formar sistemas especulativos.
Por certo será de grande importância para nós encontrar provas da atividade desse agente criticamente observador - que se torna elevada na consciência e na introspecção filosófica - também em outros campos. Mencionarei aqui o que Herbert Silberer denominou de 'fenômeno funcional', um dos poucos acréscimos indiscutivelmente valiosos à teoria dos sonhos. Silberer, como sabemos, demonstrou que em estados entre o sono e a vigília podemos observar diretamente a tradução dos pensamentos em imagens visuais, mas que, nessas circunstâncias, com freqüência temos a representação, não de um conteúdo do pensamento, mas do estado real (disposição, fadiga etc.) da pessoa que luta contra o sono. De forma semelhante, revelou que as conclusões de alguns sonhos ou de algumas divisões de seu conteúdo significam meramente a própria percepção, por parte daquele que sonha, do seu estado de sono ou de vigília. Silberer demonstrou assim o papel desempenhado pela observação - no sentido dos delírios do paranóico quanto a estar sendo vigiado - na formação dos sonhos. Esse papel não é constante. Provavelmente, desprezei-o por não desempenhar um papel relevante em meus próprios sonhos; nas pessoas filosoficamente dotadas e habituadas à introspecção ele pode tornar-se bastante evidente.
Lembremo-nos aqui de já termos verificado que a formação de sonhos ocorre sob o domínio de uma censura que força a distorção dos pensamentos oníricos. Não figuramos, contudo, essa censura como tendo um poder especial, mas escolhemos o termo para designar uma faceta das tendências repressivas que regem o ego, a saber, a faceta que está voltada para os pensamentos oníricos. Se penetrarmos ainda mais na estrutura do ego, também poderemos reconhecer, no ideal do ego e nas expressões orais dinâmicas da consciência, o censor dos sonhos. Se esse censor estiver, até certo ponto, alerta, mesmo durante o sono, poderemos compreender como sua atividade sugerida de auto-observação e de autocrítica - com pensamentos tais como 'agora ele está com muito sono para pensar', 'agora ele está despertando' - presta uma contribuição ao conteúdo do sonho.
Nessa altura, podemos tentar um exame da atitude de auto-estima nas pessoas normais e nos neuróticos.
Em primeiro lugar, parece-nos que a auto-estima expressa o tamanho do ego; os vários elementos que irão determinar esse tamanho são aqui irrelevantes. Tudo o que uma pessoa possui ou realiza, todo remanescente do sentimento primitivo de onipotência que sua experiência tenha confirmado, ajuda-a a aumentar sua auto-estima.
Aplicando nossa distinção entre os instintos sexuais e os do ego, devemos reconhecer que a auto-estima depende intimamente da libido narcisista. Aqui somos apoiados por dois fatos fundamentais: o de que, nos parafrênicos, a auto-estima aumenta, enquanto que nas neuroses de transferência ela se reduz; e o de que, nas relações amorosas, o fato de não ser amado reduz os sentimentos de auto-estima, enquanto que o de ser amado os aumenta. Como já tivemos ocasião de assinalar, a finalidade e satisfação em uma escolha objetal narcisista consiste em ser amado.
Além disso, é fácil observar que a catexia objetal libidinal não eleva a auto-estima. A dependência ao objeto amado tem como efeito a redução daquele sentimento: uma pessoa apaixonada é humilde. Um indivíduo que ama priva-se, por assim dizer, de uma parte de seu narcisismo, que só pode ser substituída pelo amor de outra pessoa por ele. Sob todos esses aspectos, a auto-estima parece ficar relacionada com o elemento narcisista do amor.
A compreensão da impotência, da própria incapacidade de amar, em conseqüência de perturbação física ou mental, exerce um efeito extremamente diminuidor sobre a auto-estima. Aqui, em minha opinião, devemos procurar uma das fontes dos sentimentos de inferioridade experimentados por pacientes que sofrem de neuroses de transferência, sentimentos que esses pacientes estão prontos a relatar. A principal fonte desses sentimentos é, contudo, o empobrecimento do ego, por causa das enormes catexias libidinais dele retiradas - por causa, vale dizer, do dano sofrido pelo ego em função de tendências sexuais que já não estão sujeitas a controle.
Adler [1907] tem razão quando sustenta que, quando uma pessoa dotada de vida mental ativa reconhece uma inferioridade em um de seus órgãos, isso age como estímulo, provocando nessa pessoa um nível mais elevado de realização mediante supercompensação. Mas, definitivamente, incorreríamos em exagero se, seguindo o exemplo de Adler, procurássemos atribuir toda realização bem-sucedida a essa inferioridade original de um órgão. Nem todos os pintores são desfavorecidos por uma visão deficiente, e nem todos os oradores foram originariamente gagos. E existem numerosos exemplos de excelentes realizações que brotam de propriedades orgânicas superiores. Na etiologia das neuroses, a inferioridade orgânica e o desenvolvimento imperfeito desempenham papel insignificante - semelhante ao desempenhado por material perceptual geralmente ativo na formação dos sonhos. As neuroses fazem uso de tais inferioridades como um pretexto, assim como o fazem em relação a qualquer outro fator que se preste a isso. Somos tentados a acreditar numa paciente neurótica quando ela nos diz que era inevitável adoecer, visto que, por ser feia, deformada ou carente de encantos, ninguém poderia amá-la; logo, porém, outra neurótica nos prestará melhores esclarecimentos - pois persiste em sua neurose e em sua aversão à sexualidade, embora pareça mais desejável, e seja, de fato, mais desejada, do que a mulher comum. Em sua maioria, as mulheres histéricas são representantes atraentes e mesmo belas de seu sexo, ao passo que, por outro lado, a freqüência da fealdade, de defeitos orgânicos e de enfermidades nas classes inferiores da sociedade não aumenta a incidência da doença neurótica entre elas.
As relações entre auto-estima e erotismo - isto é, catexias objetais libidinais - podem ser expressas concisamente da seguinte forma. Devemos distinguir dois casos, conforme as catexias eróticas sejam ego-sintônicas, ou, pelo contrário, tenham sofrido repressão. No primeiro caso (onde o uso feito da libido é ego-sintônico), o amor é avaliado como qualquer outra atividade do ego. O amar em si, na medida em que envolva anelo e privação, reduz a auto-estima, ao passo que ser amado, ser correspondido no amor, e possuir o objeto amado, eleva-a mais uma vez. Quando a libido é reprimida, sente-se a catexia erótica como grave esgotamento do ego; a satisfação do amor é impossível e o reenriquecimento do ego só pode ser efetuado por uma retirada da libido de seus objetos. A volta da libido objetal ao ego e sua transformação no narcisismo representa, por assim dizer, um novo amor feliz; e, por outro lado, também é verdade que um verdadeiro amor feliz corresponde à condição primeira na qual a libido objetal e a libido do ego não podem ser distinguidas.
A importância e o grau de extensão dos tópicos constituem minha justificativa para acrescentar algumas poucas observações de concatenação algo desconexa.
O desenvolvimento do ego consiste num afastamento do narcisismo primário e dá margem a uma vigorosa tentativa de recuperação desse estado. Esse afastamento é ocasionado pelo deslocamento da libido em direção a um ideal do ego imposto de fora, sendo a satisfação provocada pela realização desse ideal.
Ao mesmo tempo, o ego emite as catexias objetais libidinais. Torna-se empobrecido em benefício dessas catexias, do mesmo modo que o faz em benefício do ideal do ego, e se enriquece mais uma vez a partir de suas satisfações no tocante ao objeto, do mesmo modo que o faz, realizando seu ideal.
Uma parte da auto-estima é primária - o resíduo do narcisismo infantil; outra parte decorre da onipotência que é corroborada pela experiência (a realização do ideal do ego), enquanto uma terceira parte provém da satisfação da libido-objetal.
O ideal do ego impõe severas condições à satisfação da libido por meio de objetos, pois ele faz com que alguns deles sejam rejeitados por seu censor como sendo incompatíveis onde não se formou tal ideal, a tendência sexual em questão aparece inalterada na personalidade sob a forma de uma perversão. Tornar a ser seu próprio ideal, como na infância, no que diz respeito às tendências sexuais não menos do que às outras - isso é o que as pessoas se esforçam por atingir como sendo sua felicidade.
O estar apaixonado consiste num fluir da libido do ego em direção ao objeto. Tem o poder de remover as repressões e de reinstalar as perversões. Exalta o objeto sexual transformando-o num ideal sexual. Visto que, com o tipo objetal (ou tipo de ligação), o estar apaixonado ocorre em virtude da realização das condições infantis para amar, podemos dizer que qualquer coisa que satisfaça essa condição é idealizada.
O ideal sexual pode fazer parte de uma interessante relação auxiliar com o ideal do ego. Ele pode ser empregado para satisfação substitutiva onde a satisfação narcisista encontra reais entraves. Nesse caso, uma pessoa amará segundo o tipo narcisista de escolha objetal: amará o que foi outrora e não é mais, ou então o que possui as excelências que ela jamais teve (cf. (c) [ver em [1]]). A fórmula paralela à que se acaba de mencionar diz o seguinte: o que possui a excelência que falta ao ego para torná-lo ideal é amado. Esse expediente é de especial importância para o neurótico, que, por causa de suas excessivas catexias objetais, é empobrecido em seu ego, sendo incapaz de realizar seu ideal do ego. Ele procura então retornar, de seu pródigo dispêndio da libido em objetos, ao narcisismo, escolhendo um ideal sexual segundo o tipo narcisista que possui as excelências que ele não pode atingir. Isso é a cura pelo amor, que ele geralmente prefere à cura pela análise. Na realidade, ele não pode crer em outro mecanismo de cura; em geral traz para o tratamento expectativas dessa espécie, dirigindo-as à pessoa do médico. A incapacidade de amar do paciente, resultante de suas repressões extensivas, naturalmente atrapalha um plano terapêutico dessa natureza. Muitas vezes, se nos depara um resultado não pretendido quando, por meio do tratamento, o paciente é parcialmente liberado de suas repressões: ele suspende o tratamento a fim de escolher um objeto amoroso, deixando que sua cura continue a se processar por uma vida em comum com quem ele ama. Poderíamos ficar satisfeitos com esse resultado, se ele não trouxesse consigo todos os perigos de uma dependência mutiladora em relação àquele que o ajuda.
O ideal do ego desvenda um importante panorama para a compreensão da psicologia de grupo. Além do seu aspecto individual, esse ideal tem seu aspecto social; constitui também o ideal comum de uma família, uma classe ou uma nação. Ele vincula não somente a libido narcisista de uma pessoa, mas também uma quantidade considerável de sua libido homossexual,, que dessa forma retorna ao ego. A falta de satisfação que brota da não realização desse ideal libera a libido homossexual, sendo esta transformada em sentimento de culpa (ansiedade social). Originalmente esse sentimento de culpa era o temor de punição pelos pais, ou, mais corretamente, o medo de perder o seu amor; mais tarde, os pais são substituídos por um número indefinido de pessoas. A freqüente causação da paranóia por um dano ao ego, por uma frustração da satisfação dentro da esfera do ideal do ego, é tornada assim mais inteligível, bem como a convergência da formação do ideal e da sublimação no ideal do ego, e ainda a involução das sublimações e a possível transformação de ideais em perturbações parafrênicas.

2006-09-12 09:31:50 · answer #1 · answered by jhonny 1 · 1 1

Que problema há nisso??? tb sou narcisista e é isso que me torna diferente dos outros, eu me amo, em primeiro lugar no mundo sou eu, segundo eu, terceiro eu, se der tempo opino pelos outros, mas eu sou o principal, eu me amo....

2006-09-12 09:35:35 · answer #2 · answered by Anonymous · 0 0

A palavra narcisista se refere a alguem que se preocupa demasiadamente por si mesmo, considerando-se superior a todos incluindo seus amigos e sua familia, e adora se venerar no em frente ao espelho. A palavra narcisista, vem de Narciso, personagem da mitología Grega. Narciso era um jovem muito bonito. Muitas mulheres queriam namorar com ele, mas ele era muito vaidoso e orgulhoso e rejeitava a todas. Uma das mulheres rejeitadas foi a menina Eco. Eco se sentia perdida e se trancou em seu quarto sem comer nem beber. Assim se foi consumindo lentamente de dor, até que desapareceu e somente podia-se escutar sua voz nas paredes do quarto. Dai a palavra "eco". A deusa Némesis (A deusa da vingança) escutou as preces de Eco e decidiu castigar a Narciso para que sofresse da mesma maneira que ela. Um dia, Narciso foi tomar água no rio. Ao agachar-se e beber, viu sua própia cara refletida na água. Némesis usou seus poderes para que Narciso se apaixonasse loucamente por essa imagem. Narciso não podia deixar de olhar-se. Queria tocar sua imagem e abraçá-la, mas não podia pois desaparecia ao tocar na água. Tampoco a podia ver bem, pois as ondas do rio o impediam. Ele não se podia beijar, pois a imagem desaparecia. Assim se tratando de admirar a si mesmo, pulou no rio e se afogou.

2006-09-12 08:27:03 · answer #3 · answered by lgh54412 1 · 0 0

São pessoas que se amam , se veneram , se admiram até demais , assim como eu tbém hehe!!!

2006-09-12 08:13:59 · answer #4 · answered by Armando Trovão 3 · 0 0

Nossa!
será que eu tb sou narcisista????????????

2006-09-12 22:19:53 · answer #5 · answered by Linah 3 · 0 0

oi td bom? olha essa tatinha ta de esculhambação aqui no yahoo respostas ela sempre poe: infelizmente nao sei, mas boa sorte! so pra ganhar pontos na custa dos outros se um monte de gente denunciasse o yahoo tinha q tomar uma providencia pra ela parar de ser besta.

2006-09-12 10:06:09 · answer #6 · answered by wendell a 7 · 0 0

Com todo respeito e vivência na psicologia, sugiro ao colega que procure um profissional idôneo para te orientar,eu sou uma. Me habilito,vc, gostaria de uma orientação psicológica?Entre no meu e-mail:alinatomaz@hotmail.com.Por favor se cuida...

2006-09-12 08:41:27 · answer #7 · answered by bingo 1 · 0 0

NARCISISMO E RELAÇÃO NARCÍSICA DE OBJETO

Apresentação

Há muito se afirma que vivemos sob o signo do narcisismo; e no campo da psicanálise isso aparece freqüentemente através das referências ao crescimento das patologias chamadas narcísicas. Sem pretender realizar uma discussão mais ampla sobre tal fenômeno, se assim podemos dizer, buscaremos fazer aqui, uma investigação e discussão sobre o narcisismo, mais especificamente sobre as relações narcísicas de objeto.

Primeiramente, vamos apresentar e discutir sumariamente a noção de narcisismo enquanto conceito e como ele está articulado na obra de Freud. Depois, faremos uma discussão sobre o narcisismo no que diz respeito ao seu significado unificador junto ao desenvolvimento pulsional. Por fim, vamos investigar sobre o modelo narcísico de escolha de objeto e levantar questões relacionadas a ele.

Narcisismo em Freud

Embora o conceito de narcisismo tenha representado somente um parêntese no pensamento de Freud, ele trouxe contribuições e modificações importantes para a teoria metapsicológica. (12)

Foi Havelock Ellis, em 1898, quem fez uma primeira alusão ao mito de Narciso, a propósito das mulheres cativadas por sua imagem no espelho. Mas foi Paul Näcke que, em 1899, introduziu pela primeira vez o termo ‘narcisismo’ no campo da psiquiatria para designar um estado de amor por si mesmo, que constituiria uma nova categoria de perversão. (3)

Freud já fazia uso do conceito de narcisismo antes de introduzi-lo em 1914 em Sobre o narcisismo: uma introdução, onde o articula mais profundamente na teoria psicanalítica. O termo narcisismo aparece em sua obra pela primeira vez em 1910 (Três Ensaios), para explicar a escolha de objeto nos homossexuais. Freud afirmou que estes tomam a si mesmos como objeto sexual, já que procuram jovens que se pareçam com eles, e a quem possam amar como suas mães o amaram. (9)

Em Leonardo Da Vinci e uma lembrança da sua infância (1910), o conceito narcisismo vem fundamentar um tipo de identificação quando, ante a perda de um objeto, o ego se transforma à imagem e semelhança daquele.

No Caso Schreber (1911) Freud propôs o narcisismo como uma fase da evolução intermediária entre o auto-erotismo e o amor de objeto. O sujeito começa por tomar a si mesmo, ao seu próprio corpo, como objeto de amor. Aqui o narcisismo aparece também como um ponto de fixação das psicoses, denominadas “neuroses narcísicas”.

Em Totem e Tabu, 1912, aparece como um processo de retração da libido ao ego; e como uma série de atitudes, estados ou traços atribuídos ao narcisismo, como a megalomania e a onipotência do pensamento. (12)

É, no entanto, somente em Sobre o Narcisismo: uma introdução, que o conceito de narcisismo é inserido no conjunto da teoria psicanalítica, do ponto de vista dos investimentos libidinais. No caso da psicose (neurose narcísica), por exemplo, Freud discute a possibilidade que a libido tem de reinvestir o ego desinvestindo o objeto. O narcisismo também aparece no campo da transferência e do trabalho analítico, no que se refere a insusceptibilidade à influência de certos pacientes, causada por um alto grau de narcisismo. É estabelecido um equilíbrio entre a “libido do ego” (investida no ego) e “libido objetal”: quanto maior o investimento no objeto, mais se dá a retirada da libido sobre o sujeito e vice-versa.

Aqui, o narcisismo não é posto somente como uma fase evolutiva do desenvolvimento libidinal, mas como uma “condição” do psiquismo que nenhum investimento objetal permite ultrapassar completamente. [Neste texto Freud também define a escolha objetal narcísica e anaclítica, as quais abordaremos mais adiante].

Posteriormente, Freud desenvolveu esse conceito em outros textos. Com a elaboração da segunda teoria do aparelho psíquico, opôs um estado narcísico primário (anobjetal), caracterizado pela ausência de relações com o meio, indiferenciação entre o ego e o id e as relações com o objeto. O protótipo desse estado primitivo é a vida intra-uterina, da qual o sono, seria uma reprodução aproximada. (4) [Freud coloca o narcisismo como uma etapa entre o auto-erotismo e o amor objetal e, segundo Laplanche, essa profunda modificação na concepção de Freud, que leva ao desaparecimento da distinção entre auto-erotismo e narcisismo, vem trazer alguns problemas teóricos].

A idéia de um narcisismo contemporâneo à formação do ego em que a libido retirada dos objetos reflui ao primeiro através da identificação é denominada “narcisismo secundário”. (4)

Unificação pulsional em torno do narcisismo

Do ponto de vista pulsional, é o narcisismo que vai permitir uma primeira unificação das pulsões sexuais que se dá em torno do eu. Até então, predominava a sexualidade infantil caracterizada pela parcialidade no funcionamento das zonas erógenas. Num estado em que as pulsões sexuais se satisfaziam de forma anárquica, independentes uma das outras, o ego vem a ser tomado como objeto de amor, num primeiro movimento no sentido de unificação pulsional, em torno de uma imagem integrada. O narcisismo infantil coincide com o surgimento do ego enquanto unidade psíquica e representação do corpo. (9)

Lacan denominará ‘fase do espelho’ a esse momento da constituição egóica, em que a criança é apresentada à imagem de si mesma, a qual recebe com júbilo. É que ela pode ver-se através do espelho, por uma imagem integrada, antecipatória do que virá no futuro: uma organização do seu esquema corporal ainda incipiente. (8)

Há, no entanto, um contraponto entre o desenvolvimento pulsional, do corpo erógeno e o desenvolvimento do ego – ao mesmo tempo agente e produto das atividades do narcisismo.

De acordo com Bleichmar, o narcisismo adquire uma prioridade sobre a biologia. A exigência de ser amado, exigência egóica, se desenvolve a partir de uma necessidade de satisfação narcísica. Tal necessidade de satisfação, agirá no psiquismo como uma espécie de atividade pulsional, sendo sempre convocada a ser satisfeita, acompanhando o sujeito por toda sua vida, levando-o a ultrapassar e superar as tendências pulsionais parciais. (1)

O objeto da pulsão que produz prazer de órgão também passa a ser objeto da atividade narcísica; isso é levado a um tal nível que o prazer narcisista pode chegar eliminar o primeiro. As atividades das zonas erógenas podem passar a serem utilizadas independentemente do prazer ou desprazer que causem, simplesmente para satisfazer a superioridade do ego.

No melhor dos casos, pensemos na criança que passa a abrir mão de suas satisfações anais, por exemplo, para se sentir amada. São exigências de satisfação do narcisismo que estão em ação e que levam ao superamento das exigências pulsionais, parciais.

Nesses termos, da oposição do eu à sexualidade infantil, podemos pensar como o narcisismo vem se articular na dinâmica do conflito psíquico. Freud, ao explicar a dinâmica do psiquismo, sempre tomou como seu ponto central a sexualidade, contra a qual alguma força se opõe, gerando o conflito psíquico. O Ego, desde o início na obra de Freud é o agente da ação recalcante, de defesa contra a sexualidade. Antes do narcisismo, foram as pulsões de auto-conservação; depois dele, a pulsão de morte. A introdução do conceito de narcisismo implicou uma libidinização das pulsões de auto-conservação, designadas pulsões do ego, exigindo então uma reformulação na teoria da dualidade pulsional. (12)

Não estamos aqui resgatando a teoria Freudiana da oposição entre libido do ego e libido sexual, mas devemos ter presente que o narcisismo atuará, enquanto envolvido no contexto libidinal, primeiramente em favor da satisfação egóica, mas também contra qualquer coisa que venha a se opor aos seus ideais e a qualquer coisa que venha prejudicar ou diminuir seu valor. O ego está então diretamente relacionado e centralizado com o conflito psíquico que se dá em torno da sexualidade infantil, mas não só isso; também em torno da relação aos investimentos no próprio eu e nos objetos.

Com a segunda tópica e a noção do antagonismo entre pulsão de vida e pulsão de morte, o eu ainda se mantém num lugar de destaque em relação ao conflito psíquico, agora entre essas duas tendências antagônicas. É através da desfusão pulsional em virtude da identificação com o objeto - desinvestimento libidinal do objeto - que surge o supereu, que por sua vez, age também sob os auspícios da agressividade liberada nesse processo. Vale lembrar que o ego também é o produto de identificações.

Além disso, o conflito psíquico se expressa, por assim dizer, numa dimensão social quando uma tendência pulsional vai contra os ideais do sujeito ou da sociedade. Tudo para atender às exigências das necessidades narcísicas.

Relação narcísica primária – constituinte do eu

Quando falamos de narcisismo estamos no campo das qualidades, dos valores: bondade e maldade, inteligência e mediocridade, valentia e covardia, melhor e pior, homem e mulher, etc. Em primeira instância quem estabelece que, para cada sujeito no início de sua vida, tal ser incipiente é possuidor de qualidades é a perspectiva de um outro, especialmente dos pais. O narcisismo em sua dimensão primitiva tem a ver com esse momento em que são instauradas no sujeito, através do olhar de terceiros, essas qualidades que o definem para os outros e para si mesmo. Isso tudo é o fundamental do narcisismo para cada um de nós.

É através desse investimento externo sobre o psiquismo que vai ser instaurado (no narcisismo primário) um estado precoce em que a criança investe toda sua libido em si mesma. (9) Na melhor das possibilidades, então, constitui-se um campo da ilusão, o da ilusão narcísica: o pequeno sujeito vai passar não só a ser alimentado por uma imagem ao mesmo tempo integrada e de perfeição, mas também vai poder, a partir daí, definir-se, identificar-se, reconhecer-se.

Freud define essa imagem perfeita de si mesmo como ‘eu ideal’ - muito embora uma distinção mais precisa desse termo e do ‘ideal de eu’ tenha sido feita posteriormente por outros teóricos. À medida que se constitui essa imagem de si mesmo, esta vai ser cultivada e defendida como uma necessidade de satisfação narcísica. Em última análise é uma relação de amor consigo mesmo que surge e daqui para frente se transformará numa demanda: demanda de ser objeto do amor de um outro.

O ego ideal erige-se como uma referência perene no psiquismo, uma ilusão e um modelo ao qual o eu sempre buscará ‘retornar’: uma posição na qual estava a perfeição narcísica e na qual se assenta a ilusão de ter sido amado e admirado sem restrições.

Deste modo, o outro será incluído como objeto à medida que vem satisfazer às necessidades narcísicas do psiquismo.

Resulta disso a necessidade do investimento externo, da mãe, sobre o eu. O eu primeiro necessita ser tomado como objeto para que possa ser constituído. Na relação primária com a mãe deve ter havido tanto um investimento pulsional nas zonas parciais, no corpo erógeno, quanto investimento narcísico, em direção ao eu da criança, futuro indivíduo. Na verdade ambos os investimentos devem coincidir: o eu do bebê e o seu corpo erógeno são simultaneamente investidos pelos pais.

Esse momento narcísico primordial, em que não há relação de objeto é o tempo da identificação primária. O eu não pode desde sempre ter sido alvo do próprio amor. A princípio, as catexias dirigidas ao eu não provem do id porque aquele não está constituído. Trata-se de uma relação do tipo que Freud definiu como oral. Essa catexia que o id emite em direção ao objeto é ao mesmo tempo uma relação de identificação, já que o eu está com aquele numa relação de fusão, insuficientemente diferenciado. O narcisismo primário é um tempo ‘mítico’, que é o tempo da identificação primária, quando sujeito e objeto estão fusionados, indiscriminados.

É somente a partir da constituição de uma unidade tal como é o eu, de uma imagem de si mesmo, após esse tempo da identificação primária, que é possível pensar a questão da relação com objetos e da escolha objetal. [Só após a constituição do eu e com a perda do objeto (ou renúncia libidinal ao objeto) no Édipo que resultará ao id a possibilidade de reenviar catexias dirigidas a esse novo objeto: o eu.]

O abalo dessa imagem narcísica e da ilusão em torno dela será colocado para o eu, especialmente através do Édipo. O sujeito resistirá mais ou menos em enxergar-se fora do centro das atenções e do amor do casal parental, assim como de seus substitutos. Mesmo diante dessas frustrações narcísicas o indivíduo será convocado a satisfazer tais ‘necessidades’ encontrando formas mais variadas para isso.

O narcisismo secundário, designa um retorno ao ego da libido retirada dos seus investimentos objetais. Trata-se de uma estrutura permanente no sujeito, onde será sempre solicitado um equilíbrio entre investimento narcísico e objetal – através do ideal do eu. A satisfação pulsional passará a se dar também através do eu, e portanto ligada à imagem integrada de um corpo. (9)

[O ideal do eu poderá se constituir o herdeiro do eu ideal. O ideal do eu abre o campo da temporalidade no narcisismo. O narcisismo do ego ideal é transferido para os ideais que o sujeito passará se esforçar para alcançar no futuro, numa promessa da restituição, pelo menos em parte, da perfeição narcísica perdida.]

Quanto à distinção libido narcisista-libido de objeto: a libido de objeto nasce da libido narcisista – o eu é o primeiro objeto – pelo menos em parte; secundariamente, a libido narcisista será retirada dos objetos. (6)

Talvez o tipo narcisista esteja fixado numa fase narcísica primária, seja porque não foi investido primitivamente o suficiente pelo outro, seja porque o foi excessivamente. Ele seria levado a manter-se num campo próximo a este momento fundante, em que qualquer amor se confunde com o amor por si mesmo, de modo que só pode investir num outro se isso significar um não menor investimento em si mesmo. O narcisismo nestes casos não é um ganho secundário na relação com os objetos.

Escolha objetal narcísica

Em Sobre o Narcisismo: Uma Introdução, a propósito da vida erótica das pessoas, Freud define a escolha de objeto anaclítica e a narcísica. A escolha objetal deriva das primeiras experiências de satisfação [infantis]. As pulsões sexuais (parciais) estão ligadas de início às satisfações das pulsões do ego e só depois se tornam independentes: uma criança tem como objetos sexuais, as pessoas que a alimentaram, cuidaram dela e a protegeram.

Assim, Freud definiu a escolha objetal ‘anaclítica’ ou de ‘ligação’: ama-se segundo o modelo do amor recebido na relação com as figuras parentais, aquela que alimenta, aquele que protege.

O amor objetal completo do tipo anaclítico, segundo Freud, é o modo de amar tipicamente masculino (embora afirme que também possa ser encontrado em algumas mulheres). Decorre dele a supervalorização sexual do objeto que nos casos de apaixonamento atinge seu mais alto grau. [Nesses casos, em que o sujeito abriu mão do seu próprio narcisismo, ocorreu um empobrecimento da libido dirigida ao ego, em favor do objeto amoroso. O objeto é idealizado pelo sujeito, é-lhe atribuída uma perfeição que só pode equivaler ao ego ideal. O amado toma o lugar do ego ideal e nessa dinâmica se restabelece uma situação narcísica essencialmente primitiva – em que o eu era modelo da perfeição – só que desta vez quem ocupa esse lugar é o outro idealizado.]

Quanto à satisfação narcísica obtida através dos objetos (ou mais precisamente sobre a escolha objetal narcísica) Freud diz que nos homossexuais, o modelo original sobre o qual apoiaram suas escolhas objetais posteriores não foram suas mães, mas seus próprios eus. Procuram a si mesmos como objeto amoroso. Este tipo de escolha objetal deve ser chamado de ‘narcísica’.

A significação da escolha objetal narcísica para a homossexualidade deve ser considerada em relação a outro aspecto. Em Leonardo da Vinci e uma lembrança da sua infância (1910), Freud escreve que uma intensa ligação libidinal com a mãe, na primeira infância, foi reprimida por não poder continuar a se manter conscientemente. Impossibilitado de abrir mão dessa intensa ligação o menino identifica-se com a mãe e toma a si mesmo como modelo para os objetos sexuais. Assim, pode abandoná-la enquanto objeto libidinal, ao mesmo tempo manter-se fiel ao seu amor. Ama da maneira que a mãe o amava e segundo o modelo narcísico: figuras substitutas e lembranças de si próprio durante a infância.

O modelo de escolha de objeto narcísica também é atribuído por Freud ao amor que chama de essencialmente feminino. O investimento que algumas mulheres fazem em si mesmas se compara em intensidade ao amor que os homens lhes dedicam. A necessidade feminina estaria mais em serem amadas e menos em amar. O fascínio que tais mulheres [especialmente se forem belas] exercem sobre os homens se deve a que o narcisismo de certas pessoas exerce grande atração naqueles que renunciaram ao seu próprio [narcisismo] e estão em busca do amor objetal. Freud fala que o encanto das crianças e dos gatos está em seu narcisismo, sua inacessibilidade. É como se os invejássemos por manterem um estado primário perdido ao qual atribuímos toda perfeição e completude, o ego ideal.

Freud afirma que mesmo para as mulheres narcisistas há um caminho que as leva ao amor objetal, que é através do amor ao filho – embora esse amor carregue uma marca narcísica no sentido em que o investimento é dirigido a alguém que foi parte do próprio corpo.

Nesse sentido, propõe o modelo do amor dos pais à criança é narcísico já que aqueles estão compelidos a projetar no filho todas as perfeições que um dia julgaram possuir ou que desejariam alcançar. A criança sempre terá uma vida melhor do que eles tiveram.

Freud descreve o modo narcisista de amar: ama-se segundo o que o sujeito é, foi, gostaria de ser, ou alguém que foi parte de si mesmo.

Segundo Freud, a satisfação narcísica obtida através da indução de catexias objetais é secundária. Há uma catexia libidinal original do ego, parte da qual é posteriormente transmitida a objetos [que persiste e está relacionada com as catexias objetais]. No entanto, há uma antítese entre libido do ego e objetal, então, quanto mais uma é empregada, mais a outra se esvazia (a pessoa apaixonada desiste do amor próprio para investir toda sua libido no outro - o inverso do que ocorre na paranóia). Da libido objetal é retirada satisfação narcísica secundária, embora nem sempre o investimento no objeto resulte num retorno em igual medida ao ego. (3)

Assim, na escolha narcísica, o objeto investido será em última instância sempre o eu. Entretanto, também é narcísico o investimento nos objetos que valorizam o eu, seja pelos atributos que possuem, seja porque recebe em troca admiração, seja porque sendo inferiores ao eu o engrandecem.

Nesse sentido, há objetos das atividades narcísicas, assim como as definiu Bleichmar, que são além do próprio eu, também aqueles que investem no eu do sujeito direta ou indiretamente, por seu caráter positivo ou negativo. (1)

O narcisismo constitui-se segundo o modelo relacional de amor, tanto quando o investimento se dá do eu por si mesmo, como quando o investimento sobre o eu vem do objeto. Assim, é peculiar a uma relação amorosa narcisista o colocar-se na posição daquele que é amado, no lugar de objeto investido pelo outro. [Aqui o eu coloca-se no lugar do outro.] Segundo Nasio, para Lacan: ‘Em qualquer relação narcísica, o eu é, com efeito, o outro, e o outro é o eu.’ (11, pág. 71)

Discussão

Freud dirá que ambos os modelos de escolha de objeto narcísica e anaclítica estão abertos a todos os indivíduos. Cada um de nós tem originalmente dois objetos sexuais: o próprio eu ou a mulher que cuidou de nós. Assim, certamente o tipo narcisista de amar não se restringe apenas às mulheres, homossexuais, mães [e por que não aos pais também?] e nem eles estão exclusivamente fadados a este tipo de amor.

Além disso, não há uma diferenciação pura entre esses dois modelos, afirma Freud. Se o tipo anaclítico de investimento é baseado num modelo primário de relação com o objeto [de quem recebeu-se alimento e proteção], e o eu estava no lugar do objeto do amor parental, isso demonstra a dimensão essencialmente narcísica também nesse caso.

No entanto, não pode tratar-se aqui da pura reprodução do modelo anaclítico da relação materna com a criança, porque no tipo anaclítico a satisfação narcísica obtida é secundária, derivada de um investimento objetal. Já na relação mãe-criança essa satisfação é primária dado que o investimento no eu ou no objeto, são em tese o mesmo, porque nessa fase estariam insuficientemente diferenciados.

De qualquer maneira, o grau de narcisismo numa relação [ou satisfação narcísica secundariamente obtida] vai derivar de onde o acento recai: se o investimento incide principalmente sobre o eu ou sobre o objeto – o que pode ser variável em diferentes momentos numa mesma relação.

Talvez toda a questão da satisfação narcísica na relação narcísica e na anaclítica estaria em torno do grau de independência ou de alienação em relação ao investimento que retorna do outro em direção ao eu. Toda essa questão é determinada pelos fatores intensidade e fixidez: tanto menos alienado será aquele que estiver menos condicionado ao desejo do outro. O aprisionamento nesse olhar torna-se um problema que pode levar o eu às últimas conseqüências para tornar-se o suposto ideal aos olhos de outrem.

Seria, porém, pura ilusão, por outro lado – [o que também denota uma alta dose de narcisismo] - acreditar-se totalmente livre do alimento desse olhar, do investimento do objeto sobre o eu.

Logo, a demanda por ser amado e desejado pelo outro é uma fonte incessante na vida de cada um de nós, que diz respeito a uma relação narcísica primordial e que vai permear seja o tipo de escolha narcísica como anaclítica nas relações com os objetos.

O desejo de ser amado é insuperável, mas pode causar problemas (essencialmente neuróticos) se permanece o foco central das relações de um sujeito que, por sua vez, são diferentes dos problemas narcisistas colocados pelo ódio ao objeto, que trazem questões como, por exemplo, a da insusceptibilidade na transferência.

Por outro lado, se há uma dimensão narcisista no desejar o amor dos objetos, no sentido de colocar o eu no lugar daquele que é amado, há também reconhecimento que o outro tem algo de valioso, desejável pelo eu. Admitir que o eu não é completo é abrir mão de parte do narcisismo para aceitar a incompletude. Assim, demandar amor, investimento do outro, é investir esse outro com algo que se deseja porque não se tem, é amar

2006-09-12 08:32:54 · answer #8 · answered by Dilma G 3 · 0 0

Infelizmente não sei, mas boa sorte! ***

2006-09-12 08:12:11 · answer #9 · answered by Tatinha 5 · 0 0

Sucesso, a única razão de ser do indivíduo narcisista. Não só o sucesso, mas a aparência de sucesso, o reconhecimento dos que estão à sua volta, como tal. o narcisista depende de outros para validar sua auto-estima. Ele não consegue viver sem uma audiência que admite. Sua aparente liberdade dos laços familiares e dos constrangimentos institucionais não o impede de ficar só consigo mesmo, ou de exaltar em sua individualidade. Pelo contrário, ela contribui para sua insegurança, a qual ele somente pode superar quando vê seu eu grandioso refletido nas atenções das outras pessoas, ou ao ligar-se àqueles que irradiam celebridade, poder e carisma. Para o narcisista, o mundo é um espelho. No final, somos todos inocentes... ou culpados, não há saída.

2006-09-12 08:40:11 · answer #10 · answered by edbrazilian 2 · 0 0

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