O que é nanotecnologia?
Cylon Gonçalves da Silva
Há mais de 2.500 anos, alguns filósofos gregos se perguntavam se a imensa variedade do mundo que nos cerca não pode ser reduzida a componentes mais simples. A própria palavra átomo vem daquele tempo e significa "indivisível". A última fração da matéria, segundo esses filósofos o "tijolo" fundamental de tudo o que existe, não poderia mais ser dividida em outras partes mais simples. Podemos fazer uma comparação elementar, apenas para fins didáticos. Em uma padaria, você encontra uma grande variedade de pães, bolos, biscoitos, tortas, todos produzidos a partir de um pequeno número de ingredientes: farinha, fermento, manteiga, óleo, açúcar, chocolate etc... Muitas vezes, os ingredientes de pães diferentes são os mesmos, apenas mudam suas quantidades relativas e a forma de preparação. Da mesma maneira, quando olhamos o mundo a nossa volta, vemos uma variedade incrível de seres vivos e objetos inanimados, de um grão de areia a galáxia, de um vírus a uma baleia. Quantos tipos de "ingredientes" diferentes são necessários para produzir esse mundo?
Entre os gregos e a nossa época, muito se aprendeu sobre o universo. Sabemos, hoje, que o mundo que nos é familiar é formado por átomos, não exatamente aqueles imaginados inicialmente, mas que com eles compartilham o papel de "tijolos" fundamentais. Aprendemos que, ao contrário do que diz seu nome, eles são, de fato, divisíveis (mas isto é uma história para outra ocasião). Os átomos são formados por um núcleo positivo, onde reside praticamente toda sua massa, e por elétrons, negativos, que circulam em torno do núcleo. Sabemos, também, que ocorrem naturalmente no universo apenas noventa e dois tipos de átomos diferentes. Estes tipos podem ser classificados pelo número de prótons (partículas sub-atômicas de carga elétrica positiva) contidos em seus núcleos. Sabemos ainda que esses átomos podem não ser o fim da história, pois pode haver no universo partículas ou alguma forma de energia ainda não descobertas - ou pode ser que nossas teorias sobre o universo precisem algum dia ser revisadas, se esses novos "ingredientes" não forem encontrados. Tudo isto é parte do mundo fascinante da pesquisa científica - cada pergunta respondida leva a novas perguntas. Em ciência, as respostas raramente são definitivas, mas as perguntas perduram.
A certeza científica de que tudo é feito de átomos é muito recente. Há apenas cerca de cem anos, os cientistas obtiveram evidências fortes de que a velha hipótese atômica, formulada há dois e meio milênios, corresponde à realidade da natureza. No decorrer do século XIX, os químicos foram, aos poucos se convencendo de que a melhor maneira de explicar quantitativamente reações químicas é supondo que essas se dão entre unidades bem definidas de cada composto. Alguns físicos, já quase no final do século XIX, formularam uma teoria "estatística" da matéria, na qual se busca explicar o comportamento dos corpos com os quais lidamos quotidianamente pelo comportamento dessas pequenas unidades "invisíveis" da matéria, os átomos e as moléculas (moléculas são átomos do mesmo tipo ou de tipos diferentes, fortemente ligados entre si, formando novas entidades, com propriedades físico-químicas distintas). Essas teorias foram recebidas, inicialmente, com grande ceticismo pela própria comunidade científica. Por que tanta dificuldade para aceitar uma idéia velha de milênios?
O problema é que átomos são muito pequenos, medem menos de um centésimo de bilionésimo de metro, e obedecem a leis físicas bastante diferentes daquelas com as quais estamos acostumados no nosso mundo familiar. O seu tamanho é tal que não podem ser vistos diretamente. Instrumentos especiais tiveram de ser desenvolvidos antes que fosse possível "ver" um átomo. Um dos mais práticos desses instrumentos, o microscópio de tunelamento, somente foi inventado na década de 1980. Seus inventores, Heinrich Rohrer e Gerd Binnig, dos laboratórios da IBM em Zürich, Suíça, ganharam o prêmio Nobel por seus trabalhos. O funcionamento desse microscópio depende das leis da mecânica quântica, que governam o comportamento dos átomos e moléculas. Portanto, a existência de átomos e as leis da natureza no mundo atômico tiveram de ser pacientemente descobertas a partir de experimentos especialmente concebidos. Este processo levou décadas e envolveu grandes cientistas.
Instrumentos como o microscópio de tunelamento e outros estendem nossa "visão" até tamanhos na faixa de bilionésimo de metro. Um bilionésimo de metro chama-se "nanômetro", da mesma forma que um milésimo de metro chama-se "milímetro". "Nano" é um prefixo que vem do grego antigo (ainda os gregos!) e significa "anão". Um bilionésimo de metro é muito pequeno. Imagine uma praia começando em Salvador, na Bahia, e indo até Natal, no Rio Grande do Norte. Pegue um grão de areia nesta praia. Pois bem, as dimensões desse grão de areia estão para o comprimento desta praia, como o nanômetro está para o metro. É algo muito difícil de imaginar. Mesmo cientistas que trabalham com átomos todos os dias, precisam de toda sua imaginação e muita prática para se familiarizar com quantidades tão pequenas.
Ainda antes dos cientistas desenvolverem instrumentos para ver e manipular átomos individuais, alguns pioneiros mais ousados se colocavam a pergunta: o que aconteceria se pudéssemos construir novos materiais, átomo a átomo, manipulando diretamente os tijolos básicos da matéria? Um desses pioneiros foi um dos maiores físicos do século XX: Richard Feynman. Feynman, desde jovem, era reconhecido como um tipo genial. Uma de suas invenções foi o primeiro uso de processadores paralelos do mundo. Em Los Alamos, na época do desenvolvimento da primeira bomba nuclear, havia a necessidade de se realizarem rapidamente cálculos muito complexos. Feynman, então, teve a idéia de dividir os cálculos em operações mais simples, que podiam ser realizadas simultaneamente, e encheu uma sala com jovens secretárias, cada qual operando uma máquina de calcular (naquela época não havia computadores, nem calculadoras eletrônicas, e as contas tinham de ser feitas à mão, ou com calculadoras mecânicas limitadas às mais simples operações aritméticas).
Hoje em dia, essa mesma idéia é usada em computadores de alto desempenho, com microprocessadores substituindo as jovens secretárias! Em 1959, em uma palestra no Instituto de Tecnologia da Califórnia, Feynman sugeriu que, em um futuro não muito distante, os engenheiros poderiam pegar átomos e colocá-los onde bem entendessem, desde que, é claro, não fossem violadas as leis da natureza. Com isso, materiais com propriedades inteiramente novas, poderiam ser criados. Esta palestra, intitulada "Há muito espaço lá embaixo" é, hoje, tomada como o ponto inicial da nanotecnologia. A idéia de Feynman é que não precisamos aceitar os materiais com que a natureza nos provê como os únicos possíveis no universo. Da mesma maneira que a humanidade aprendeu a manipular o barro para dele fazer tijolos e com esses construir casas, seria possível, segundo ele, manipular diretamente os átomos e a partir deles construir novos materiais que não ocorrem naturalmente. Um sonho? Talvez, há quarenta anos atrás. Mas, como o próprio Feynman dizia em sua conferência, nada, nesse sonho, viola as leis da natureza e, portanto, é apenas uma questão de conhecimento e tecnologia para torná-lo realidade. Hoje, qualquer toca-disco de CD's é uma prova da verdade do que Feynman dizia. Os materiais empregados na construção dos lasers desses toca-discos não ocorrem naturalmente, mas são fabricados pelo homem, camada atômica sobre camada atômica.
O objetivo da nanotecnologia, seguindo a proposta de Feynman, é o de criar novos materiais e desenvolver novos produtos e processos baseados na crescente capacidade da tecnologia moderna de ver e manipular átomos e moléculas. Os países desenvolvidos investem muito dinheiro na nanotecnologia. Mais de dois bilhões de dólares por ano, se somarmos os investimentos dos Estados Unidos, Japão e União Européia. Países como Coréia do Sul e Taiwan, que têm sido muito melhor sucedidos que o Brasil na utilização de tecnologias modernas para gerar bons empregos e riquezas para seus cidadãos, também estão investindo centenas de milhões de dólares nessa área. nanotecnologia não é uma tecnologia específica, mas todo um conjunto de técnicas, baseadas na Física, na Química, na Biologia, na ciência e Engenharia de Materiais, e na Computação, que visam estender a capacidade humana de manipular a matéria até os limites do átomo. As aplicações possíveis incluem: aumentar espetacularmente a capacidade de armazenamento e processamento de dados dos computadores; criar novos mecanismos para entrega de medicamentos, mais seguros e menos prejudiciais ao paciente dos que os disponíveis hoje; criar materiais mais leves e mais resistentes do que metais e plásticos, para prédios, automóveis, aviões; e muito mais inovações em desenvolvimento ou que ainda não foram sequer imaginadas. Economia de energia, proteção ao meio ambiente, menor uso de matérias primas escassas, são possibilidades muito concretas dos desenvolvimentos em nanotecnologia que estão ocorrendo hoje e podem ser antevistos.
No Brasil, a nanotecnologia ainda está começando. Mas, já há resultados importantes. Por exemplo, um grupo de pesquisadores da Embrapa, liderados pelo Dr. L. H. Mattoso, desenvolveu uma "língua eletrônica", um dispositivo que combina sensores químicos de espessura nanométrica, com um sofisticado programa de computador para detectar sabores. A língua eletrônica da Embrapa, que ganhou prêmios e está patenteada, é mais sensível do que a própria língua humana. Ela é um produto nanotecnológico, pois depende para seu funcionamento da capacidade dos cientistas de sintetizar (criar) novos materiais e de organizá-los, camada molecular por camada molecular, em um sensor que reage eletricamente a diferentes produtos químicos. Você pode imaginar alguns usos para uma língua eletrônica? Para saber mais, visite a página www.cnpdia.embrapa.br. Não é só na Embrapa, entretanto, que se faz nanotecnologia no Brasil. O mesmo acontece nas principais universidades e centros de pesquisa do país.
Aplicações em catálise - isto é, na química e na petroquímica, em entrega de medicamentos, em sensores, em materiais magnéticos, em computação quântica, são alguns exemplos da nanotecnologia sendo desenvolvida no Brasil. O que precisamos agora é aprender a transformar todo este conhecimento em riquezas para o país.
A nanotecnologia é extremamente importante para o Brasil, por que a indústria brasileira terá de competir internacionalmente com novos produtos para que a economia do país se recupere e retome o crescimento econômico. Esta competição somente será bem sucedida com produtos e processos inovadores, que se comparem aos melhores que a indústria internacional oferece. Isto significa que o conteúdo tecnológico dos produtos ofertados pela indústria brasileira terá de crescer substancialmente nos próximos anos e que a força de trabalho do país terá de receber um nível de educação em ciência e Tecnologia muito mais elevado do que o de hoje. Este é um grande desafio para todos nós.
2006-09-08 09:33:01
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answer #6
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answered by Alice S 2
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O mundo nano não é ficção
Ao entrar nesse mundo, você irá perceber que as máquinas mais evoluÃdas vão se tornar tão pequenas quanto as moléculas e a eletrônica será transportada para um dimensão mil vezes menor que a atual.
nas próximas quatro décadas a ciência deverá se aproximar cada vez mais da vida. Ao entender como as moléculas se comportam, os cientistas poderão controlar melhor esses processos e desenvolver uma série de novos sistemas. Como roupas inteligentes, por exemplo, que poderão salvar a vida de um soldado que esteja sofrendo um ataque biológico. A saúde também será beneficiada. Mas tudo isso ocorrerá no Brasil, segundo Toma, desde que a nanotecnologia entre também na lista de prioridades das instituições responsáveis pelo investimento em ciência e tecnologia.
A nanotecnologia representa a última grande evolução na área tecnológica. Quando alguém vê um computador Pentium 4, com seus 32 milhões de transistores, acha maravilhoso. Há algumas décadas, seria necessário uma cidade de 100 quilômetros quadrados para caber 32 milhões de válvulas em conjunto, que, claro, não iriam funcionar como um chip que cabe na palma da mão. No Pentium 4 são usados 9 milhões de átomos apenas para dizer sim ou não. As pessoas acham que reduzir ainda mais do que isso é um sonho, mas não é. Uma prova é o nosso cérebro, que é um computador feito de moléculas.
As informações, dentro de nós, estão gravadas em escala molecular. O cérebro, fundamentalmente, processa 10 elevado a potência 17 de informações por segundo. à um tipo de computação diferente da existente nas máquinas. Ela é até mais lenta, porque faz um cálculo por vez, mas, em compensação, é muito mais complexa, por ser feita em rede. Funciona como se fossem bilhões de computadores simultâneos. à possÃvel fazer computação com moléculas? Claro que é. As células são fabriquetas. A vida é o melhor modelo para a nanotecnologia. Por isso que aqueles que trabalham mais na área molecular, como é o meu caso, colocam a vida com modelo, como paradigma. E o progresso, nesse sentido, tem sido grande.
No campo da energia, estão sendo usados filmes formados por moléculas de clorofila para movimentar pequenas máquinas com energia solar.
Isso é nanotecnologia. Não é ficção. A fotossÃntese sempre existiu e é a energia mais importante do universo. Tudo vem do Sol, que é a fonte mais importante de energia do planeta. Outra área importante é a de materiais. Hoje em dia existem garrafas que, em vez de armazenar por dois dias um tipo de leite, o fazem por quase três meses. O que eles estão fazendo é usar revestimentos de nanopartÃculas na garrafa. A porosidade do frasco fica menor e com isso existe menos contato com o ar. A camada Ãnfima de nanopartÃcula cria um emaranhado tão complexo que uma bolinha de ar não consegue atravessar, ela acaba ficando presa. Também temos boas novidades em fármacos. Com a nanotecnologia é possÃvel acoplar medicamentos a uma nanocápsula, que pode ser dirigida por ter propriedades magnéticas. O medicamento se torna quase um veÃculo e você pode, com isso, proteger as demais regiões do corpo.
Hoje existem protetores solares feitos a partir de técnicas de nanotecnologia. Você não consegue enxergar o mundo nanométrico porque ele é menor do que o comprimento de luz visÃvel. Então, qual é a vantagem nesse caso? O protetor solar fica invisÃvel. Você passa e ninguém percebe. Além disso, esses produtos não serão mais apenas filtros. A indústria está incorporando, por exemplo, partÃculas de vitamina E nos protetores para dar novas propriedades à pele. Isso evita a formação de rugas. Esses produtos estão no mercado, mas as empresas não os divulgam para não sofrerem com as ONGs, que poderim dizer “não usem o produto, ele tem tecnologia nano”.
A humanidade nem vai perceber. Simplesmente vai acontecer. Quanto mais a tecnologia avança, menos ela se torna perceptÃvel. Quanto mais sofisticado um equipamento ou tecnologia, menos o cidadão sabe a respeito, ele precisa apenas apertar um botão. Mas para quem pretende construir o equipamento – e isso vale para os empresários também – é preciso entender e mesmo controlar esses limites do conhecimento. Estamos diante de um paradoxo: a sociedade não vai mais entender o que é ciência, o que é tecnologia, e, com isso, ficará ao sabor das ameaças. E quando ocorre alguma coisa com a tecnologia que não é favorável, aquilo vira regra. Isso é muito ruim.
Quando você lança uma idéia, sempre tem alguém que trabalha em uma linha contrária. Como o cidadão percebe cada vez menos o que é a nanotecnologia, o medo dele diante dessa incapacidade cresce. Existe uma neurose muito grande que se forma a partir dessa ignorância. à nesse caminho que a educação cientÃfica precisa evoluir bastante. E isso falta também na universidade. Os alunos saem sem uma idéia clara do que é nanotecnologia. Ao não aprender, o desinteresse pelo tema também aumenta.
Em 2002 foi lançado, nos moldes norte-americanos, uma iniciativa para a área nano, mas com recursos de apenas R$ 3 milhões. Tudo bem, foram criadas quatro redes nacionais e os cientistas nacionais se aglutinaram ao redor de um tema. Participaram mais de 300 pesquisadores com doutorado e aproximadamente 600 alunos. Esses números são irrelevantes em termos internacionais, mas significativos para o cenário brasileiro. A iniciativa foi muito bem-vinda. O problema é que o Brasil é pobre. Essas atitudes não chegaram a alavancar a nanotecnologia. O governo ainda está discutindo as estratégias para se implantar uma polÃtica nano. O Brasil não embarcou na onda da microtecnologia. PaÃses como a Coréia do Sul, por exemplo, pensaram diferente e se tornaram um dos tigres asiáticos. Eles tiveram um planejamento. No Brasil, com a nanotecnologia, a coisa está difÃcil de deslanchar. O governo parece que está acordando agora. Investir em nanotecnologia tem sentido estratégico. O bonde está andando e ainda não perdemos totalmente ele. O Brasil, desde o ano passado, não é mais citado entre os paÃses que investem em nanotecnologia pelos relatórios internacionais. Isso é terrÃvel. Se o paÃs não investe, nenhuma empresa internacional vai querer vir para cá.
Em 2050, a nanotecnologia estará muito próxima do que é a vida. O material evoluirá até o momento em que chegará ao limite biológico. Nós somos um monte de máquinas com todo um processo de transmissão de informações. Tenho certeza de que, no futuro, o conceito de material mudará muito. Computadores, por exemplo, serão um filme. As informações do mundo estarão em um cartãozinho. A Era do Ciborgue, talvez, não esteja tão longe assim. Essa direção da nano, de se aproximar da vida, é bom. Você não está indo no sentido de se produzir materiais antinaturais. Você se aproxima dos sistemas naturais. Isso é bom, muito bom. A nanociência é uma nova forma de se ver o mundo. Nano é real, não é ficção.
2006-09-08 09:27:06
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answer #8
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answered by Anonymous
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