Vamos matar de uma vez por todas a questão!!
LINGUAGEM MÉDICA
INFARTO, ENFARTE
Embora de uso corrente, sobretudo fora dos meios acadêmicos, enfarte não é o mesmo que infarto.
Idel Becker e Mangabeira Albernaz, ambos médicos e filólogos, estudaram detidamente esta questão e concluiram pelo que acabamos de afirmar.[1][2]
O termo infarto já existia na língua portuguesa muito antes de enfarte, constando dos dicionários de Domingos Vieira[3] e de Correia de Lacerda [4]. Somente a partir de 1881, com a publicação do dicionário de Caldas Aulete [5] começa a aparecer a forma enfarte com o mesmo sentido de infarto.
Infarto vem do latim infarctus e não de fartar ou enfartar, como entendem alguns autores.
Pedro Pintto, que grafa enfarto em lugar de infarto, diz: "É errônea a terminação e adotada a conta de étimo fantástico. Não se liga ao verbo enfartar e sim ao latim infarctus".[6]
Dentre os léxicos brasileiros, um dos poucos que define corretamente enfarte e infarto é o de Silveira Bueno. Nele encontramos:
"ENFARTE - s.m. Engorgitamento, repleção excessiva".
"INFARTO - s.m.. Área necrosada de um tecido por falta de circulação".[7]
Também o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, editado pelo Ministério da Educação, esclarece suficientemente a questão. Lê-se no citado dicionário:
"ENFARTE, s.m. Ingurgitamento; inchação, o mesmo que enfartação e enfartamento; (Med.) divulgou-se amplamente essa designação para mencionar a necrose em conseqüência de supressão da circulação de um território vascular, que mais propriamente se deverá dizer infarto".
"INFARTO, s.m. (Med.) Área hemorrágica ou necrótica por falta de circulação. Embora o Vocabulário da Academia Brasileira de Letras consigne somente enfarte, é de se adotar para este sentido exclusivamente a forma infarto, que corresponde exatamente ao quadro histopatológico que se quer designar, ao passo que enfarte significa ingurgitamento, inchação".[8]
Quando o latim era a língua adotada em textos científicos, o termo infarctus designava uma consolidação de humores em uma parte do corpo.[9] Foi somente após os trabalhos de Virchow sobre trombose e embolia (1856) que infarto passou a ser empregado para caracterizar a lesão necrótica do tecido causada por uma obstrução vascular.
A trombose e o infarto podem ocorrer em qualquer órgão, porém, dada a importância da trombose coronariana, quando se diz simplesmente infarto subentende-se infarto do miocárdio.
Segundo Major, o primeiro autor a descrever a trombose da artéria coronária foi Hammer, em 1878. Dock, em 1896, empregou a expressão infarto agudo do coração e Osler, em 1910, referiu-se ao infarto agudo do miocárdio (acute infarct of myocardium).[10] Posteriormente, autores de língua inglesa passaram a usar myocardial infaiction.[11]
O termo enfarte é de uso bem antigo em português, porém sempre com o sentido de aumento de volume, enchimento, repleção, tumefação.
Veja-se, por exemplo, o que se encontra no Dicionário de Medicina Popular, de Chernoviz:
"Enfarte do baço - V. Hipertrofia".
"Enfarte do estômago - V. Embaraço do estômago".
"Enfarte do fígado - V. Hipertrofia".
"Enfarte do testículo - Inflamação crônica do testículo. V. orquite crônica".[12]
No passado usou-se enfarte do estômago como sinônimo de indigestão. A dificuldade no diagnóstico diferencial entre distúrbios gástricos e cardíacos, na era que antecedeu ao advento do eletrocardiografia, poderia, talvez, levar ao uso generalizado de enfarte para ambas as condições. No presente só se justifica o uso de enfarte e seus cognatos, como enfartar, enfartado, enfartamento, com o sentido de ingurgitamento, tumefação, aumento de volume, repleção. Ex.: enfartamento ganglionar; gânglios enfartados.
Os cardiologistas brasileiros têm demonstrado clara opção pela forma infarto para designar a necrose isquêmica do miocárdio, conforme se pode constatar nas publicações da especialidade.
As formas paralelas infarte e enfarte, por conseguinte, não têm razão de ser, e devem ser excluídas da linguagem médica.
Referências bibliográficas
1. BECKER, I. - Nomenclatura biomédica no idioma português do Brasil. São Paulo, Liv. Nobel, 1968, p. 212-213
2. MANGABEIRA-ALBERNAZ, P. - Enfarte ou infarto? A polêmica continua em foco. Rev. paul. Med. 80: 171-2, 1973.
3. VIEIRA, D. - Grande dicionário português ou Tesouro da língua portuguesa. Porto, Ernesto Chardron e Bartholomeu H. de Moraes, 1871-1874.
4. LACERDA, J.M.A.A.C. - Dicionário enciclopédico ou Novo dicionário da língua portuguesa. Lisboa, F. Arthur da Silva, 1874.
5. AULETE, F.J. C. - Dicionário contemporâneo da língua portuguesa. Lisboa, 1881.
6. *****, P.A. - Dicionário de termos médicos, 8. ed. Rio de Janeiro, Ed. Científica,1962.
7. BUENO, Francisco da Silveira: Grande dicionário etimológico-prosódico da língua portuguesa. São Paulo, Ed. Saraiva, 1963.
8. BUENO, F.S. - Dicionário escolar da língua portuguesa, 11.ed. Rio de Janeiro, MEC/FENAME, 1980.
9. SKINNER, H.A. - The origin of medical terms, 2.ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 1961.
10. MAJOR, R.H. - Classic descriptions of disease, 3.ed. Springffield, Charles C. Thomas, 1945., p. 424-434
11. FRIEDBERG, C.K. - Diseases of the heart. Philadelphia, W.B. Saunders Co., 1950.p. 401-500
12. CHERNOVIZ, P.L.N. - Dicionário de medicina popular, 6.ed. Paris, 1890.
Reproduzido do livro Linguagem Médica, 3a. ed., da AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda.
Autor: Joffre M. de Rezende. Maiores informações pelo tel. (62) 212-8622 ou e-mail
abeditora@abeditora.com.br
Atualizado em 10/09/2004.
e-mail: jmrezende@.cultura.com.br
http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende
2006-08-26 11:29:20
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answer #2
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answered by Cesinha ♂ 7
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