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Cordel & Ideologia Política (III)
Floribela Espanca: como a cigarra cantou até estourar e morrer de amor
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Floribela Espanca: como a cigarra cantou até estourar e morrer de amor
Data de Publicação: 30 de novembro de 2005
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BIOGRAFIA
Florbela d’Alma da Conceição Espanca é o nome de batismo da escritora Florbela Espanca que nasceu em Vila Viçosa, Alentejo, Portugal, em 8 de dezembro de 1894. Escreveu os primeiros versos quando fazia o curso secundário em Evora. Os poemas dessa fase só foram publicados postumamente, com o título Juvenília, em 1931.
Já casada, em 1919, o casamento malogrado é desfeito. Nessa época, publica Livro de Mágoas e, em 1923, Livro de Sóror Saudade, ambos ignorados pela crítica da época. Casa-se novamente e, pela segunda vez, é infeliz no casamento. Resolve retirar-se do convívio social. Recolhe-se a Matozinhos, com novas esperanças de felicidade conjugal.
Filha de Antônio da Conceição Lobo e João Maria Espanca, casou-se, em 1913, com Alberto de Jesus Silva Moutinho. Com o esposo, vai fixar residência em Redondo, de onde só retorna a Evora, em 1917, para concluir o Curso Complementar de Letras. Ainda em 1917, em Lisboa, matricula-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Em 1920, abandona o Curso de Direito. Em 1921, divorcia-se. No mesmo ano, casa-se com o Alferes Antônio José Marques Guimarães, do qual se divorcia em 1925, para casar-se com o médico Mário Pereira Lage, com quem vai morar em Matosinhos. Lá exerce atividade de tradutora de escritores franceses. A depressão sobreveio em 1927, quando perde um irmão, Apeles, em desastre de aviação. A maioria dos biógrafos dão como que ela tenha-se suicidado na madrugada do dia de seu aniversário, em 1930, com uma dose excessiva de Veronol.
Suas obras completas, entre publicadas em vida e póstumas, se constituem dos seguintes livros: Livro de Mágoas. Lisboa, 1919; Livro de Sóror Saudade. Lisboa, 1923; Charneca em Flor. Lisboa, 1931; Cartas de Florbela Espanca. Coimbra, 1931; As Máscaras do Destino. Porto, 1931; Sonetos Completos. Coimbra, 1934; Diário do Último Ano. Lisboa, 1981; O Dominó Preto. Lisboa, 1982; Trocando olhares. Lisboa: 1994. Edição de Maria Lúcia Dal Farra.
2
ANÁLISE DO ESTILO DE FLORBELA ESPANCA
Antenada com as grandes modificações estéticas e poéticas da virada do século XIX, Florbela Espanca é uma escritora em transição e tem consciência das melhores conquistas dos melhores poetas em voga, na Europa.Sem vínculo ou compromisso com os estilos de época, ela passa ao largo de Orfismo ou Presencismo. É, portanto, uma escritora sem contramoldes. Ela é, antes de tudo, uma poeta da introspecção psicológica, do autobiografismo. E seu estilo reúne vários elementos do decadentismo, entre eles, a obsessão de viver até a exaustão de todos os sentidos, o naturalismo (erotismo, sensualismo), o realismo psicológico (introspecção) e a linguagem luxuriante, extravagante (alegoria).
Não resta a menor dúvida que, do ponto de vista estético, ela constrói os sonetos ao nível dos grandes clássicos do gênero, Camões, Bocage, Antero de Quental e Cesário Verde.
As diferenças entre Florbela Espanca e os demais grandes sonetistas portugueses está justamente na essência da poesia, no ato de plasmar as palavras do intangível. No que escreveu, privilegiou sempre e exclusivamente o amor e a paixão, que viveu com acertos e decepções, alegrias e amarguras, mas principalmente com intensidade e obsessão, como uma boêmia, uma cigarra, que cantou até estourar, explodir de êxtase e paixão. Assim, as bases que a distinguem de outros poetas incluem uma imagética prodigiosa, exuberante, que se expressa através de sensações, vibrações diante de cores, sons, odores (percepções), versus emoções, sentimentos.
Florbela Espanca apresenta uma temática nova. Trata-se de um lirismo amoroso autobiográfico, de auto-estima, auto-enternecimento, autocomiseração ou auto-compaixão e isto ela expressa através de uma explosão erótica medusesca, narcísica, devastadora e avassaladora, que lhe permite exercitar uma espécie de donjuanismo.
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UMA POÉTICA SEM CONTRAMOLDES
Sugerir aqui é o verbo ideal. Sugestão, o substantivo.
A poesia de Florbela Espanca nasce a partir da sugestão, ou seja, do que ela intui aflorar da alma humana, através da evocação dos sentidos ou percepções sensoriais.
Uma cor representa e sugere uma sensação e imprime no cérebro uma emoção correspondente ou imediatamente igual e contrária, paradoxalmente. Bipolaridade e ambivalência aqui se mesclam. Através do formato e cores variadas, de contornos de corolas de flores, comparativamente, por contigüidade ou similaridade, ela se propõe fazer, inesgotavelmente, a leitura do universo do desejo, do amor e da paixão, ser intérprete da libido aflorada, de aspirações até então recalcadas, ousando ser porta-voz do clamor do erotismo. Daí por que privilegia o lado dionisíaco do ser, o prazer, em conjunção com o lado apolíneo em sua vertente narcísica e em oposição à contemplação platônica analítica pura e simples.
Criando uma poética singularmente perceptiva, Florbela nos seduz e induz a participar da intimidade com prazer. Não raro, se permite ter a cabeça de Medusa, ao olhar ao mesmo tempo para todos os lados e direções. Aí ela imita, finge, camufla, trai a realidade do prazer em sua forma mais elevada, belamente instaurada na semântica poética. As cores sugerem e aguçam, via percepções sensoriais, uma atmosfera erótica, como resultado do que a fantasia cria em imagens correspondentes ao estímulo comparativo por contigüidade ou similaridade, no espírito.
O formato e as cores das corolas sugestionam os sentidos, que tocam o tálamo e induzem o cérebro a criar imagens correspondentes, pois, a partir daí a fantasia ou alegoria é acionada. Assim, no soneto Crisântemos, ela faz a leitura dessas flores, através da diversidade de cores que estas apresentam. O amarelo simboliza isto; o roxo, aquilo; o vermelho ou rubro revela um ângulo; o branco, outro e o azul, a paz. E, se as percepções sensoriais visuais, tácteis, olfativas e gustativas arremetem a outras sensações relativas ao prazer. Esse desvio ou viés caracteriza a apreensão do mundo erótico, trabalhado obsessivamente pela poeta, a partir de uma prodigalidade sinestésica, já que, cada cor ou formato, cheiro ou som, induz o ser humano a liberar no cérebro um excitante microcosmo de fantasias eróticas, até então reprimidas: o roxo simboliza a dor, o luto, a tristeza, em relação a um amor ou a uma paixão frustrados ou fracassados; o vermelho ou rubro, a paixão em seu clímax; o amarelo, a decepção; o branco, a pureza, a perfeição e o azul, a paz.
Essa poesia eminentemente decadentista e, ao mesmo tempo, atemporal, desvincula a poeta de qualquer ismo, em termos absolutos, pois ela exerce um decadentismo no melhor e mais elevado sentido de ‘década cadente’ ou de luminosidade, que incorpora, via sincretismo, elementos românticos, realistas, naturalistas, simbolistas e modernistas.
Não há contramoldes para Florbela Espanca, no que ela ousou em termos de lírica amorosa. Na vida e na arte, foi libertária, exuberante, prodigiosa e intensa, exemplarmente decadentista, no mais elevado sentido da vida e da arte.
Florbela Espanca foi simultaneamente o escritor, o narrador e o protagonista de suas próprias obras que, da realidade, se projetou para o domínio público do campo poético ficcional, transformando-se em ícone ao expor-se e desnudar-se autobiograficamente, conforme poderemos despreender de seus sonetos.
Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amor: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois, se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E, se um dia hei-de ser pó, cinza e nada,
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
(p.121)
Fanatismo
Minh’alma de sonhar-te anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!
Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
“Tudo no mundo é frágil, tudo passa...”
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!
E, olhos postos em ti, digo de rastros:
“Ah! Podem voar mundo, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!...”
(p.62)
Eu
Eu sou a que no mundo anda perdida
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada...a dolorida...
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a quem chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!
(p.27)
Crisântemos
Sombrios mensageiros das violetas,
De longas e revoltas cabeleiras;
Brancos, sois o casto olhar das virgens
Pálidas que ao luar sonham nas eiras.
Vermelhos, gargalhadas triunfantes,
Lábios quentes de sonhos e desejos,
Carícias sensuais d’amor e gozo;
Crisântemos de sangue, vós sois beijos!
Os amarelos riem amarguras,
Os roxos dizem prantos e torturas,
Há-os também cor de fogo, sensuais...
Eu amo os crisântemos misteriosos
Por serem lindos, tristes e mimosos,
Por ser a flor de que tu gostas mais!
(p. 7)
O Nosso Mundo
Eu bebo a Vida, a Vida, a longos tragos
Como um divino vinho de Falerno!
Pousando em ti o meu olhar eterno
Como pousam as folhas sobre os lagos...
Os meus sonhos agora são mais vagos...
O teu olhar em mim, hoje, é mais terno...
E a Vida já não é o rubro inferno
Todo fantasmas tristes e pressagos!
A Vida, meu Amor, quero vivê-la!
Na mesma taça erguida em tuas mãos,
Bocas unidas, hemos de bebê-la!
Que importa o mundo e as ilusões defuntas?...
Que importa o mundo e seus orgulhos vãos?...
O mundo, Amor!... As nossas bocas juntas!...
(p.73)
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Impressão Recomendar
Suplemento Cultural e Literário JP Guesa Errante
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2006-07-20 02:40:20
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answer #4
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answered by Anonymous
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